De que maneira é possível aumentar o tempo que usuários permanecem com seus tokens? É esta pergunta que todo protocolo blockchain precisa responder para conseguir acumular valor em sua plataforma.
Como isto é possível? Por meio do alinhamento entre preço do token e o uso da rede blockchain — o que é conhecido como tokenomics.
A relação entre preço do token e seu fornecimento fixo nem sempre é uma relação direta.
Grande parte dos investidores acha que, se o fornecimento de tokens de utilidade for fixo, seu preço aumentará à medida em que a demanda pelos serviços de determinado protocolo aumenta.
Essa crença, todavia, se esquece de um, “porém”: o problema da velocidade dos ativos — ou seja, o número de vezes que um ativo muda de proprietário — que é uma entrada importante na “Equation of Exchange”.
O modelo da equação de troca de Irvin Fisher
Uma das principais percepções do economista Irvin Fisher ao criar o modelo da “Equação de Troca” no Século XX foi que uma moeda muda de mãos mais frequentemente quando as pessoas acreditam que ela perderá seu valor.
O que Fisher quis dizer com isso?
Alguns devem se lembrar como, em tempos de hiperinflação, as pessoas correm para o supermercado para evitar a perda de valor da moeda. Ou seja, quanto mais tempo as pessoas mantiverem um ativo, maior será o seu valor.
A esta altura, muitos devem estar se perguntando: qual é a relação entre o modelo de troca de Fisher com o tema deste artigo?
Como funciona a dinâmica de acúmulo de valor de um token?
Em 2016, Chris Burniske aplicou, pela primeira, vez o modelo tradicional do “Equation of Exchange” a criptoativos, em seu relatório original para a Coinbase e Ark Invest.
Burniske ajustou a equação de troca de Fisher para o Bitcoin, definindo as variáveis originais, MV = PQ, da seguinte forma:
- M = tamanho da base do ativo
- V = velocidade do ativo
- P = preço do recurso digital que está sendo provisionado
- Q = quantidade de recursos digitais que estão sendo provisionados
Ao resolver o tamanho da base do ativo (M) — que pode ser dividido pela oferta circulante para descobrir o preço do token —, Burniske concluiu que a velocidade do token (V) é inversamente proporcional ao seu valor.
“Quanto mais tempo as pessoas mantiverem o token (V), maior será seu preço (P).”
Dessa forma, um caminho natural para quem adquire um token — sem nenhuma utilidade adicional além de seu uso em algum produto ou serviço —, seria descartá-lo, o que cria uma pressão de queda no preço.
Exatamente aqui está a importância do tokenomics — também conhecido como “Economia de Tokens”.
Para resolver o problema da velocidade e aumentar o tempo que os usuários mantêm seus tokens que os protocolos blockchain passaram a experimentar modelos de “captura de valor”: para aumentar a utilidade do token, os depósitos e os incentivos para manter o token.
Logo, é na experimentação de modelos de tokenomics que se encontra a dinâmica de acúmulo de valor de um token. Dito isto, vejamos como se forma o preço e o valor de um token.
Mas já adianto que o segredo do valor dos tokens está no design.
A composição do preço e do valor de um token
No início, é a especulação que impulsiona o preço de um token de utilidade. Mas à medida que os protocolos blockchain amadurecem e o uso da rede aumenta com o passar dos anos, o valor desse token passa a ser impulsionado por sua utilidade e demanda. Daí porque dois componentes impulsionam o preço de um token:
- um componente especulativo — impulsionador do preço [criação de valor]
- um componente fundamental — impulsionador do valor [acúmulo de valor]
1 – Componente especulativo
O componente especulativo de um token é aquele sujeito às forças do mercado e impulsionado, principalmente, pelo sentimento e pela percepção. Daí, independentemente da utilidade atual do protocolo cripto e de seus tokens, se a demanda no mercado secundário superar a oferta, o preço de mercado de um token aumentará.
Aqui as escolhas de design do token não desempenham um papel direto, mas podem ter um impacto significativo no preço do token.
Nesse passo, a chave para gerenciar o componente especulativo do preço do token está na garantia de alta liquidez, usando market makers (criadores de mercado) em CEX e pools de profunda liquidez em DEX.
2 – Componente fundamental
No tocante ao componente fundamental de um token, ele é impulsionado pela demanda por serviços de determinado protocolo e pelos seus mecanismos de captura de valor.
Nessa linha, o valor pode ser acumulado por meio de vários mecanismos de captura, que resumidamente funcionam da seguinte forma:
2.1) Mecanismos de governança
Um mecanismo de governança onchain dá aos detentores de tokens o poder de moldar o protocolo.
Já um mecanismo de delegação de votos permite que os detentores de tokens deleguem seus direitos de voto a outro participante.
Por fim, um mecanismo de governança contínua incentiva os detentores de tokens a manterem seus tokens de governança em jogo para maximizar o poder de voto.
2.2) Mecanismos de staking: PoS, SFA e Reputação
Proof-of-Stake (PoS) é um mecanismo de consenso que exige que os validadores apostem tokens ou façam staking para terem a oportunidade de criar um novo bloco e serem recompensados.
Modelo Stake-for-Access (SFA) é um mecanismo de staking que incentiva os detentores de tokens a apostarem ou fazerem staking para que possam atuar como provedores de serviços da rede.
Mecanismo de Reputação é um mecanismo de staking que incentiva detentores de tokens a apostarem tokens ou fazerem staking para fornecer uma fonte de verdade ao protocolo.
2.3) Mecanismos de compartilhamento de lucros: BME, Distribuição direta de receita e Modelo de Tesouraria / Doação
O Modelo Burn-and-Mint Equilibrium (BME) é um mecanismo de compartilhamento de lucros que exige que os usuários ‘queimem’ o token nativo para acessar os serviços do protocolo.
Modelo de distribuição direta de receita é um mecanismo de compartilhamento de lucros em que o protocolo distribui uma parte da receita gerada para os detentores de tokens “staked”.
Modelo de tesouraria/doação é um mecanismo de compartilhamento de lucros no qual uma parte da receita gerada é alocada para a tesouraria de um protocolo, onde pode ser distribuída para várias finalidades.
Tais mecanismos de captura ajudam um token a acumular valor. Eles reduzem a velocidade (aumentando o tempo gasto para manter um token) por meio do bloqueio de tokens e do incentivo aos usuários para que permaneçam com o token em troca de recompensas ou direitos de voto de protocolo.
Além disso, a queima e o sink de tokens reduzem a oferta total, levando a um número menor de tokens que buscam o mesmo valor.
Contudo, vale destacar que o valor do token também é afetado por outras considerações de design, como, por exemplo, se o fornecimento de tokens do protocolo é fixo, inflacionário ou deflacionário.
De qualquer forma, para que o token de um protocolo blockchain capture valor, o design do tokenomics é a chave e, por isso, é necessário que ele seja bem projetado.