O dilema da nova IA: ansiedade do tempo livre e da mudança
Negócios e economia

O dilema da nova IA: ansiedade do tempo livre e da mudança

Bill McDemott cravou: toda empresa no mundo e cada trabalho em qualquer indústria será completamente remodelado em 24 meses. Estamos falando de um tsunami de mudanças que somente os mais ligados vão saber se adaptar. É preciso ter plano para agir. E agora.

O que você encontrará neste artigo:

O novo limiar da Inteligência Artificial
Qual mundo do trabalho estamos criando?
O dilema dessa IA

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O prenúncio de uma transformação desse tamanho pode parecer exagero. Mas eu concordo com Bill McDemott, ex-CEO da SAP e atual CEO da ServiceNow. A Inteligência Artificial vai reimaginar cada empresa no mundo em apenas dois anos. As novas soluções da IA generativa – do Copilot ao GPT4o – destruirão a hierarquia organizacional tradicional que gerencia times em torno de produtos específicos. A IA de agora elimina trabalhos repetitivos, empodera as pessoas e mudará a natureza do que (e de como) fazemos. Você já pensou o que faria com um grande tempo livre na sua rotina?

O novo limiar da Inteligência Artificial

Dois lançamentos recentes personificam a mudança do jogo e a necessidade de agir “aqui, agora e já”. O Chat GPT-4o foi apresentado em maio como o primeiro modelo da OpenAI criado para combinar textos, imagens e áudios em tempo real por conta própria. Com todas as entradas e saídas processadas pela mesma rede neural, a ferramenta ganha muito mais velocidade e poder. “Estamos olhando para o futuro da interação entre nós e as máquinas”, disse o CTO da Open IA, Mira Murati, durante o demo. “Achamos que o GPT-4 está realmente mudando esse paradigma para o futuro da colaboração”.

Correndo em paralelo, temos a nova onda de Copilot+PC, da Microsoft. Trata-se, sem dúvida, da inovação mais disruptiva desde o lançamento do Windows. O Copilot+ reimagina o PC por completo e integra-o a uma unidade de processamento neural (NPU): o microprocessador que roda tarefas pesadas de uma só vez. Tudo conectado em grandes modelos de linguagem (LLMs) e executados na nuvem (Azure). O resultado? Computadores 20 vezes mais poderosos, 100 vezes mais eficientes e com capacidade de reproduzir 22 horas de vídeo sem recarregar.

O produto é fruto de um plano ambicioso da empresa para tomar à frente nas inovações da IA generativa e que incluiu investimento na OpenAI, milhões em chips de IA e expansão de data center, afirmou Dan de Francesco, jornalista do Business Insider, em sua newsletter Insider Today. Se por um lado ainda não está claro como a empresa irá realizar a manutenção de todas essas ferramentas integradas é promissor o impacto do novo produto na vida das pessoas.

Ao integrar tarefas, programas, aplicativos, o Copilot eliminará quase a totalidade do trabalho repetitivo. E parte disso está ocorrendo. No nível mais básico: já é possível pedir ao Copilot para resumir uma página da web ou um PDF inteiro, gerar textos e imagens para diferentes projetos, enviar e-mails e fazer pesquisas. No nível administrativo: a ferramenta já está reprogramando por inteiro sistemas críticos de empresas. A cervejaria Carlsberg, por exemplo, economiza centenas de horas por mês de engenheiros que lidavam com tarefas tediosas e repetitivas, reportou a Bloomberg. Mais de 50,000 negócios, de startups a grandes corporações, estão atualmente testando o Copilot em suas operações.

Qual mundo do trabalho estamos criando?

Imagina só daqui a alguns meses, nos próximos dois anos, quando todos esses e outros sistemas estiverem aperfeiçoados, mais bem treinados e ganharem uma estrutura de dados muito bem-feita. Imagine quantos empregos mudam de escopo? Quantas profissões repetitivas simplesmente precisam mudar? A Accenture tentou fazer esse cálculo e estima que até 40% das horas de trabalho serão automatizadas pela IA generativa. Essa economia será observada em várias áreas: do consultor ao criativo; do programador ao analista de segurança. Carreiras executivas não escapam e muitos gestores poderão ter equipes menores, afirmou Kevin Tate, CMO da Clearbit, à Forbes.

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Na estrutura organizacional, a IA generativa também criará estruturas organizacionais mais planas: com menos camadas de hierarquia – e equipes mais multifuncionais – onde indivíduos gerenciam juntos e implementam aplicações de IA sem realizar entregas por silos, aponta Tony Ufhoff, do Acceleration Economy’s Leadership Channel. Outros cargos também surgirão, ele aponta, tais como: chefe de ética de IA, instrutor de IA, manutenção de IA e especialista em integração de tecnologias. Esse movimento de mudanças já é visto na Ásia, com empresas contratando jovens focados em acelerar a assimilação dos recursos trazidos pela IA generativa, aponta a Deloitte. Essa geração, aliás, tem nome: Geração IA.

Por outro lado, essa automatização também já está criando novas ondas de ‘lay-offs’ e testemunhamos agora trabalhadores qualificados e de altíssimo nível técnico sendo demitidos. O Google mandou dezenas de pessoas da divisão de anúncios embora, inclusive no Brasil, e a Microsoft fez cortes em seu negócio de nuvem (Azure). A forma como as competências novas exigidas e empregos irão se adaptar continuamente permanece ainda uma incógnita – e precisa ser discutida pelas empresas, afirmou Alisson Horn, diretora-geral da Accenture.

O dilema dessa IA, a ansiedade do tempo livre e a resistência a mudanças

Essa discussão perpassa dois níveis de mudança. O primeiro deles é cultural: a maior dificuldade de empresas e pessoas para mudar o básico. A prova disso é que vivemos com instituições do século XIX, a mente do século XX e a tecnologia do século XXI. Há sempre uma resistência gigante em mudar o processo básico de como as coisas são feitas: na rotina do indivíduo ou no fluxo organizacional. Mas essa resistência vai ser ineficaz agora: a IA generativa já está mudando o básico. Se você, líder, não mudar organizacionalmente o seu processo, você vai ficar para trás.

Um dos maiores desafios que CEOs apontaram hoje não é nem a escolha de qual tecnologia investir. É justamente como deixar seus funcionários confortáveis com os novos processos de trabalho, ferramentas e tecnologias, aponta um relatório da IBM que ouviu 3 mil CEOs. Você, CEO, tem um plano para as suas equipes? Uma visão que englobe novos escopos, reformulações, integrações e novas funções?

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Mas essa reengenharia não é só uma missão empresarial. Você, indivíduo e profissional, já pensou o que vai fazer quando boa parte das tarefas repetitivas que executa deixarem de tomar o seu tempo? Muita gente, e eu me incluo, irá responder que gostaria de aprender conhecimentos novos – principalmente aqueles que temos tanta vontade, mas deixamos de lado por falta de tempo ou de aplicabilidade no nosso dia a dia profissional. Mas você consegue ter esse projeto de estudo no tempo livre em mente? Sabe, de fato, o que gostaria de aprender? Pois é: nós precisamos pensar. O fato é que nos acostumamos a não ter esse plano.

O lado positivo dessa história toda é que, se empresas fizerem a parte dela, se os mecanismos do trabalho e da introdução de novas tecnologias forem estruturados, nós podemos planejar e executar o sonho do tempo livre. Sem tanta angústia, depressão ou ansiedade.

Ser esse superprofissional que pode estudar o que quiser, mas que também se prepare para entregar o que o novo mundo precisa. Que tal aprender o mínimo de novos comandos para performar melhor com o Copilot, ChatGPT4o ou novas ferramentas de IA? Que tal fortalecer o lado emocional, pensamento crítico e estratégico? Que tal adotar, por exemplo, o marketing generativo em seu fluxo de trabalho? Outra estratégia, como aponta Henning Peinzuka, professor de empreendedorismo do INSEAD, é usar a IA para mapear escolhas que estão “fora do domínio” – ou seja, oriundas de diferentes épocas, lugares e setores – ampliando muito a capacidade de “pensar fora da caixa”. Tome a dianteira. Como disse o CEO da Coca-Cola: não correr o risco é um ponto de vista desesperador para começar.


Por:Guga Stocco
Guga é Co-founder da Futurum Capital e Colunista
MIT Technology Review Brasil.

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