Como o Drex mudará a vida dos brasileiros?
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Como o Drex mudará a vida dos brasileiros?

Prevista para entrar em operação ainda em 2024, a CBDC brasileira terá impacto no cotidiano, mas não substituirá o Pix.

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No ano passado, a Polícia Civil e o Ministério Público do Rio de Janeiro investigaram um golpe envolvendo a venda de imóveis que fez mais de 300 vítimas ao longo de três anos e que resultou em 20 pessoas investigadas por estelionato. Os criminosos anunciavam imóveis alugados online com preços e condições de compra mais acessíveis e, quando recebiam o sinal do pagamento, rompiam contato com a vítima. De acordo com a polícia, os estelionatários afirmavam ser funcionários de empresas imobiliárias e usavam escritórios falsos para tornar o golpe mais verossímil.

Histórias como essas são recorrentes, especialmente no ambiente digital. De acordo com dados do último Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado em julho de 2023 pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o estelionato aumentou quase 38% no Brasil entre 2021 e 2022 (o crescimento é 326,3% desde 2018), e o estelionato eletrônico aumentou 65,2%. No Disque 100, as denúncias contra os golpes financeiros aumentaram 73% no ano passado. E, em muitos desses casos, um padrão se repete: o criminoso simula que realizará a venda de um bem e, quando recebe o pagamento, desaparece.

Coibir esse tipo de crime será justamente um dos principais benefícios que o Drex, a moeda digital de banco central (CBDC) do Brasil, trará para o cidadão. Isso será possível graças a algumas características intrínsecas à tecnologia: programabilidade, rastreabilidade, transparência, segurança, auditabilidade. “Isso resulta no que chamamos de DVP (Delivery Versus Payment), ou entrega contra pagamento”, explica Fabricio Tota, diretor de novos negócios do Mercado Bitcoin, uma das empresas participantes do projeto piloto do Drex no Banco Central (BC).

“Na mesma transação, o dinheiro passa de uma pessoa para outra e a propriedade de um bem ou ativo vai de B para A. Isso muda muita coisa e esse tipo de produto ou serviço estará disponível para o público comum. Por exemplo, na compra de um automóvel, não será necessário ir ao cartório. Quando o dinheiro for transferido, a propriedade do automóvel muda automaticamente, tornando a transação muito mais ágil e segura.”

O que possibilitará esse tipo de transação são os contratos inteligentes criados na rede do Drex, que operará por meio da tecnologia DLT (Distributed Ledger Technology ou Tecnologia de Registros Distribuídos, popularmente conhecida como blockchain). Mais especificamente, a DLT do Drex será a Hyperledger Besu, uma rede criada pela Linux Foundation compatível com os contratos inteligentes da rede Ethereum, a mais popular atualmente.

“A Hyperledger Besu possui regras customizáveis quanto ao permissionamento dos usuários, permitindo a criação de uma rede 100% permissionada, restrição para criações de ativos, mecanismos de consenso centralizados, facilitando as atividades de compliance e permitindo aplicações compatíveis com o mercado financeiro tradicional”, explica Naasson Ferreira, diretor de produtos do Mercado Bitcoin. É por causa dessas características que a rede tem sido escolhida não somente pelo nosso BC, mas também por outros bancos centrais, como infraestrutura para seus projetos de CBDC.

Por que precisamos do Drex?

De fato, já existem mecanismos no mercado que visam garantir a segurança de ambos os lados em uma transação na compra e venda de bens, como os as próprias instituições financeiras, os cartórios ou ainda plataformas que mediam essas transações. Mas esse é um processo custoso e, na maioria das vezes, burocrático. Por isso, no que diz respeito a transações, a principal disrupção da CBDC está na otimização do processo.

Como o próprio Banco Central tem exemplificado, imagine que uma pessoa queira reformar a sua casa e decida pegar um empréstimo no banco. Uma forma de fazer esse financiamento ficar mais barato seria oferecer uma garantia, como parte das aplicações que o cliente tem no Tesouro Direto. Mas o custo dessa operação é muito alto, porque envolve a mão de obra para conferir toda a documentação e, havendo algum problema posterior no pagamento, mais custos para mover uma ação na justiça para receber a garantia. Para o cidadão, o processo também acaba sendo burocrático e caro, já que será necessário ir ao cartório autenticar documentos e ir até o banco, no caso de agências físicas.

A complexidade desse tipo de operação se deve ao fato de que os sistemas do banco e do cartório não são integrados e não se comunicam. Não falam a mesma língua. O que o Drex propõe, dentre outros benefícios, é justamente simplificar e baratear esse tipo de processo, porque toda a transação poderá se dar dentro da sua plataforma, ou de plataformas compatíveis, de forma segura e, sobretudo, ágil. Esse será um dos principais impactos para o cidadão comum. Mas esse é apenas um exemplo do que a tecnologia pode nos oferecer.

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“Essa nova infraestrutura permitirá o aumento da eficiência na oferta de produtos, com redução de custos, viabilizando redução da escala necessária para as operações e, portanto, maior democratização de produtos e serviços financeiros; além da possibilidade de criação de novos produtos envolvendo ativos digitais e uma maior difusão da tokenização”, destaca Naasson Ferreira. O Mercado Bitcoin, por exemplo, desenvolveu uma stablecoin lastreada em real — a MBRL —, antevendo a possibilidade de fazer com que esse ativo seja, no futuro, lastreado no Drex.

A expectativa é que a tecnologia ainda facilite a oferta de produtos financeiros a uma base de clientes mais ampla, incluindo segmentos anteriormente não atendidos ou subatendidos, e acelere o processo de inclusão financeira.

“No dia a dia, o cidadão comum, na verdade, talvez nem perceba a existência do Drex propriamente”, diz Fabricio Tota. Acontece que a verdadeira transformação que a CBDC proporcionará está nesses processos facilitados e mais seguros em transações. Como meio de pagamento, a moeda digital não deverá ser aplicada, pelo menos não amplamente, uma vez que o Pix já resolve o problema do custo e da burocracia nesse caso.

“O modelo [brasileiro] foi pensado para ser de uso específico e restrito a bancos, instituições de pagamento e infraestruturas de mercado. A ideia é que as liquidações utilizando Drex ocorram somente entre esses usuários institucionais. Mas não se trata de um privilégio, essas plataformas serão as responsáveis por criar produtos e serviços que chegarão ao público em geral”, explica Tota. Ou seja, na compra e venda de bens, por exemplo, o cliente terá a garantia do DVP, mas de uma forma muito mais rápida e com menos custos.

Diferentemente do Pix, que foi idealizado e desenvolvido tendo o cidadão comum como público-alvo, o Drex é, acima de tudo, uma infraestrutura. Tota compara a plataforma com o Sistema de Pagamento Brasileiro (SPB), no qual outras inovações, como a TED, impactaram as liquidações interbancárias; mas o usuário comum não percebeu diretamente essas infraestruturas. “Ele vê apenas os produtos e serviços derivados delas. Com o Drex, será similar. É uma infraestrutura que não será visível para o usuário comum, embora seja responsável por viabilizar certos produtos e serviços no futuro.”

Isso também se aplicará a investidores. O primeiro impacto esperado é a redução de custos. Com a nova camada de tecnologia proporcionada pelo Drex, explica Tota, vários intermediários que hoje são necessários para realizar transações podem se tornar menos úteis. “Menos intermediários significa transações potencialmente mais baratas para quem compra e mais rentáveis para quem vende.” Para o investidor, salienta, “é mais rentabilidade para os investimentos”.

Além disso, há o impacto na praticidade e agilidade, assim como em outras transações já exemplificadas ao longo do artigo. “Atualmente, algumas transações exigem deslocamento físico a uma agência bancária ou cartório. Com a tecnologia do Drex, será possível realizar essas transações de maneira tão segura quanto hoje, ou até mais, e de forma mais rápida e fácil.”

Moeda ou plataforma?

No Brasil, o Drex não chega com o objetivo de ser um meio de pagamento para o cidadão comum. “Cada país aborda as CBDCs de acordo com os problemas que eles acreditam poder resolver com essa tecnologia. Muitos buscam resolver problemas de pagamentos, mas no Brasil já temos o Pix”, explica Fabricio Tota. O meio de pagamentos instantâneos já torna as transações financeiras mais simples do cotidiano mais baratas e rápidas, por isso, não faria sentido que o Drex o substituísse.

É verdade que o Drex é a versão digital da moeda brasileira, o real. Trata-se de uma Moeda Digital de Banco Central ou Central Bank Digital Currency (CBDC), o que significa que é uma representação digital — ou seja, emitida e transacionada em tecnologia de ledger distribuído (DLT) — regulada pelo Banco Central do Brasil. Também é verdade que, como moeda, o Drex poderá ser utilizado para uma variedade de transações financeiras.

No entanto, ele é também a plataforma que permitirá a realização de transações envolvendo não apenas a moeda digital propriamente, mas ainda outros ativos digitais. Funciona como um ambiente integrado onde transações envolvendo dinheiro e transferência de ativos poderão ser realizadas de maneira eficiente, segura e transparente. Isso permitirá, por exemplo, maior abertura da economia brasileira para o processo de tokenização — mercado que deverá ser 80 vezes maior que o atual até 2030, segundo dados do Citibank, atingindo US$5 trilhões.

Mas é importante compreender que a CBDC não é uma criptomoeda, tampouco uma stablecoin. Enquanto stablecoins são geralmente emitidas por entidades privadas e podem variar em termos de regulação e transparência, o Drex é emitido pelo Banco Central do Brasil, oferecendo segurança e confiança institucional. Além disso, as stablecoins mantêm seu valor estável por meio de reservas de ativos ou mecanismos de controle de oferta. O Drex, por outro lado, é a própria moeda nacional, o real que já conhecemos, porém em formato digital.

“Enquanto moeda digital, ele possibilitará a liquidação de aplicações e produtos envolvendo ativos digitais na plataforma Drex, nesse uso se assemelhando a uma stablecoin. Entretanto, diferente das stablecoins, que requerem gestão dos ativos que a compõem para assegurar a paridade com a moeda fiduciária, o Drex é a própria moeda emitida pelo Banco Central, em sua versão digital”, explica Naasson Ferreira.

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