O que já era moderno e inovador, ganhou outros contornos ainda mais atípicos com a pandemia. Isso porque a sociedade teve que continuar a se comunicar sem a presença física do interlocutor, à distância. Essa passou a ser uma condição obrigatória.
Uma nova realidade que mudou a mente das pessoas e até mesmo a forma de lidar com a vida em geral. As relações humanas mais íntimas e as afinidades familiares se intensificaram, mas também alguns conflitos se tornaram inevitáveis.
No mundo corporativo, o que estava sendo absorvido de maneira gradativa precisou ser implantado e aceito às pressas, principalmente na área de tecnologia, que teve sua demanda triplicada rapidamente. O ponto positivo é a geração de vagas no mercado de Tecnologia da Informação. No primeiro trimestre de 2021 foram gerados 52,7 mil novos postos de trabalho em Tecnologia da Informação e Comunicação, enquanto no mesmo período de 2020 esse número alcançou 17 mil, segundo relatório da Brasscom. O setor empregou três vezes mais nesse início de 2021.
Isso vai ao encontro do que ocorreu na Chiligum Creatives, startup de produção publicitária e a empresa que lidero. Triplicamos o número de colaboradores, passando de 10 profissionais para uma equipe de 30 pessoas, num período de apenas três meses. O começo foi difícil, na verdade, quase um caos.
Depois de ter contratado e montado com sucesso todas as principais equipes dentro da Chiligum, consegui delegar a maioria das tarefas, que antes tomavam 80% do meu tempo. E foi aí que percebi que eu nunca tinha feito “coisas de CEO” antes, ainda que o meu perfil no Linkedin tivesse esse job title. De um trimestre para o outro, eu não era mais a “faz-tudo” da empresa, a executiva de vendas, product owner, gerente de marketing e tudo mais. É um crescimento pessoal amparado pelo uso contínuo e diário da tecnologia.
Porém, essa expansão de forma rápida e bem no meio da pandemia, nos forçou, como empresa, a entrar no olho do furacão e encará-lo. A partir disso, criamos alguns métodos de contratação e de gestão de equipes remotas que acredito serem possíveis de replicar às demais empresas de tecnologias. A escalabilidade é uma das principais características das startups que aplicam tecnologia em seus processos e isso permite agilidade e assertividade bastante interessantes. Em ambos os casos o planejamento é o grande segredo para o sucesso das mudanças.
Como encontrar profissionais de excelência em contratações remotas?
O planejamento para escolha dos profissionais exige um programa de contratação que especifique as características essenciais desse colaborador, uma vez que sendo as atividades relacionadas com a TI eminentemente técnicas, há necessidade de que a seleção seja detalhista e teste na prática o grau técnico do candidato.
Sobretudo para atrair os melhores, porque é preciso realmente que a sua startup tenha essa imagem positiva no mercado para que isso se consolide. No caso do mercado de TI, as boas empresas atraem os melhores talentos.
As vantagens dessa nova realidade é que o trabalho remoto rompeu as barreiras físicas e territoriais, permitindo que as empresas possam encontrar profissionais em qualquer lugar do mundo, aumentando assim o leque de opções de candidatos. Numa startup de entrega bem conhecida, o CEO afirmou recentemente que 65% dos colaboradores ficam fora de São Paulo, cidade sede da empresa, incluindo funcionários no México e na Colômbia, não se limitando a barreiras territoriais físicas.
É um casamento perfeito, porque na mesma direção que aumentam as opções para as empresas, proporcionalmente aumenta a procura por vagas que sejam remotas. Uma pesquisa do Linkedin constatou que as buscas por vagas que oferecem trabalho remoto aumentaram 60%. É uma grande mudança de mentalidade — e um grande impacto viabilizado também pela tecnologia.
Portanto, nesse leque de novas possibilidades – tanto para empresas, quanto para os profissionais – é necessário que se tenha um processo de seleção que esteja dentro das competências técnicas que a vaga e a empresa precisam.
Para Prithwiraj Choudhury, professor da Harvard Business School, a empresa que construir a sua organização nesse sistema terá uma grande vantagem na atração de talentos. É o match desejado.
Como gerir tanta gente à distância?
Quando o time de profissionais aumenta repentinamente, se não houver um modelo eficiente e um planejamento adequado, a entrega não terá a excelência exigida. É preciso definir o papel de cada departamento, dos gestores e dos colaboradores. O mais importante é que as informações, a forma de atuação, a decisão e a execução estejam integradas e corretas para que o produto seja gerado no prazo e atenda plenamente às exigências do mercado.
Quando esse crescimento rápido aconteceu na Chiligum, descobrimos que esse era exatamente o “problema”. Entre aspas, porque por óbvio que crescer não é um problema. Ainda não conseguíamos trafegar informação efetivamente dentro da companhia, o que dificultava e atrasava a tomada de decisões e de certa forma, atrapalha o fluxo de processos.
O engenheiro Andrew Grove, um dos fundadores da Intel resumiu muito bem em “High Output Management” as três principais responsabilidades do gestor: colher e passar informações, tomar decisões e influenciar nas ações. Tendo isso em mente, desenvolvemos o que chamo de Ritos de Gestão. Em resumo, uma série de estratégias que são divididas em: objetivo, estratégia e tática, que foram desenhadas para facilitar o fluxo de informações entre as equipes.
O Rito de Gestão é um manual para que toda a equipe esteja alinhada no mesmo objetivo. Ele norteia nossa visão de onde queremos chegar e o nosso dia a dia e começa com a definição entre as lideranças do plano de negócios e o planejamento estratégico, feito anualmente e trimestralmente, respectivamente. Depois, são aplicadas rodadas de encontros semanais com os colaboradores divididos em comitês. O que acredito ser o foco aqui.
Os encontros com os comitês acontecem semanalmente e possuem entre 30 e 60 minutos de duração. Na Chiligum são 6: Produto, Tecnologia, Gente e Gestão, Financeiro, Customer Success e Growth, que preenchem quase que inteiramente um dia de agenda. Nesse tempo, são definidos os KPIs, a atualização das OKRs e o planejamento das atividades da semana.
Pode parecer muito, mas essa é a hora do gestor acompanhar de perto tudo o que está acontecendo, tomar decisões e entender onde alocar energia nos demais dias para destravar barreiras e ajudar o time a atingir seus objetivos.
Em suma, a gestão no trabalho remoto não é difícil, apenas nos pegou desprevenidos. O desafio para os gestores atuais e do futuro é como trafegar as informações vitais para as companhias entre as equipes, mantendo-as assim no propósito. E com o uso da tecnologia, sempre e de forma cada vez mais estratégica e assertiva.
Este artigo foi produzido por Deborah Folloni, CEO & Founder da Chiligum Creatives, Forbes Under 30 e colunista da MIT Technology Review Brasil.