A revolução do trabalho pela automação “low-code” chegou com força e os CEOs avessos ao home office vão desperdiçar essa oportunidade
Humanos e tecnologia

A revolução do trabalho pela automação “low-code” chegou com força e os CEOs avessos ao home office vão desperdiçar essa oportunidade

Durante os recentes anos de Transformação Digital, muitos departamentos criaram iniciativas em silos que pouco se conectam com o restante da empresa, gerando esforços dobrados para seus funcionários unirem dados e projetos. A automação com “pouco código” chegou para finalmente revolucionar empresas e pessoas

Gillian Tett sugeriu, em artigo publicado no Financial Times, que o apreço dos CEOs pelos escritórios nasce da ideia de que estes são “ambientes onde ritmos profundamente arraigados eram transmitidos de uma geração para outra”.  

Em outras palavras, os encontros nos espaços físicos das empresas ajudavam a cumprir o papel de ensinar os novatos a fazer tudo como sempre foi feito. 

A Transformação Digital fez muito pouco para mudar esse cenário. 

Isso porque a tal transformação, em sua grande maioria, foi uma digitalização. 

A partir das extremidades – unidades de negócio ou departamentos -–, gestores perceberam que a eficiência e a escala viriam do mundo digital. Eles rapidamente abraçaram computação em nuvem, plataformas, sites, e-commerce, CRM etc. 

Foram do básico ao avançado. Desde a troca dos classificados em jornal por buscas em sites, passando por fichas e formulários, chegando até mesmo às iniciativas de “on-line to off-line”, em que compras feitas em sites e aplicativos são entregues fisicamente nas casas das pessoas.  

A eficiência digital se espalha também por relatórios, que antes demoravam dias para serem elaborados e agora podem ser atualizados em minutos, ajudando os gestores a tomar decisões rapidamente. 

Exemplos de B2B2C, como aqueles em que grandes empresas precisam engajar suas forças de vendas, representantes ou distribuidores, também são campeões da digitalização. 

Na maioria destes casos, o que se viu foi uma versão em formato digital de algo que já acontecia no mundo físico, onde tudo pode ser “melhor, mais rápido e mais barato”. 

Até mesmo os chatbots nascem deste princípio: digitalizar as conversas agora na forma de menus “digite 1 para reclamações e 2 para elogios”.   

Tudo isso deveria se chamar Digitalização, e não Transformação Digital. 

Outras empresas foram além e descobriram a escala no conceito de plataformas e Custo Marginal Zero. Eternizado no livro de Jeremy Rifkin, um novo sistema econômico se baseia na redução do custo marginal de produzir e distribuir unidades adicionais de bens e serviços (descontados os custos fixos) a praticamente zero, tornando-os essencialmente gratuitos. 

Deste conceito brilham os famosos marketplaces – ou plataformas de dois lados –, em que os donos dos sistemas não são donos do estoque ou dos canais de distribuição: Uber e Webmotors não possuem carros, Hoteis.com não é dono das propriedades e Facebook não é dono do inventário de anúncios, entre outros.  

Graças à natureza digital deste tipo de negócio, muitos pegaram carona na Transformação Digital da própria sociedade, em que as pessoas com seus celulares e aplicativos trocando dados e conteúdo conseguem colaborar de forma nunca vista. Waze é um deles. 

Dentre tantos negócios que o mundo digital proporcionou, os Retail Media Networks estão em alta. São espaços para venda de banners em sites e aplicativos de grande visitação. Uma famosa rede de farmácias, por exemplo, hoje fatura milhões com seus “ADs”, vendendo espaço de banners para seus fornecedores, desde laboratórios farmacêuticos até grandes empresas de bens de consumo. 

Comum entre todos estes exemplos de evolução digital está o “hard code”. 

Para sua existência, foram necessários departamentos de tecnologia repletos de programadores, cientistas de dados, engenheiros de sistemas e tantos outros, reunidos em unidades técnicas. Foram eles que colocaram tudo isso em prática. 

Resultado: o time de tecnologia é um gargalo. 

Em um mundo onde essas pessoas são cada vez mais necessárias e escassas no mercado, fica difícil continuar, expandir e extrapolar uma Transformação Digital. 

Por isso, se faz tão necessária a automação das pessoas e das empresas.  

Isso não significa tirar as pessoas do caminho, deixando as máquinas fazerem tudo por si só. 

Significa fazer tudo do zero: de mudar processos até produtos, plataformas e capacitação, partindo da premissa de que toda pessoa pode programar, desde que em ferramentas em que pouca programação é necessária. 

Para provar a necessidade máxima dessa automação, basta pesquisar a satisfação dos funcionários com a digitalização das empresas. É triste, porém muito comum, reclamação de pessoas dizendo que nunca fizeram tanta planilha para juntar as coisas ou que nunca perderam tanto tempo com tarefas sem sentido. 

Basta lembrar do estudo do Gartner, no qual os profissionais de marketing relatavam utilizar apenas 58% do potencial das suas ferramentas de Martech. 

Ou, ainda, o famoso estudo da IBM, em que cientistas de dados relatam que 80% do tempo é gasto coletando, organizando e tratando dados. Apenas 20% do tempo era para fazer análises e usar sua inteligência.  

Automação não é deixar a máquina fazer tudo sozinha. Trata-se de refazer tudo o que for preciso: de departamentos, passando por processos e ferramentas, sempre tendo como pilar o baixo esforço de programação da área da TI, a partir do empoderamento das pessoas em capacidades técnicas em todas as áreas da empresa. 

Em um grande varejista, duas histórias ilustram bem essa situação: 

1.Pausa no sistema

Visando reduzir o tempo de entrega dos produtos, foi criada a seguinte aplicação: assim que um pedido é feito e o e-commerce calcula alguns dias para o transporte, o sistema do centro de distribuição faz uma pausa de quatro horas antes continuar tal processo. 

Neste ínterim, um e-mail com os dados da compra é enviado para a loja mais próxima do consumidor. Se existir estoque e disposição do vendedor, este leva o produto até o destino e dá um clique no e-mail “entregue”. 

A satisfação dos clientes com a surpresa é enorme. A fidelização é gigante. 

Apesar de ser um processo novo, nenhuma linha de código foi criada, apenas configurações nas ferramentas atuais com regras de “se isso, faz aquilo”.

2.Vendedor expert

Durante um período de portas fechadas na pandemia, uma aplicação de venda por WhatsApp foi criada para distribuir os pedidos dos consumidores para vendedores próximos a suas casas. O low-code apareceu posteriormente quando foi testada a ideia de conectar os interessados com vendedores experts nos produtos solicitados, independentemente da localização. 

Como saber se um vendedor é expert? A partir de jogos, criados em aplicações simples sem uma linha de código, os conhecimentos são testados, e o resultado é enviado para o sistema de mensagens, que passa a direcionar as mensagens de clientes interessados para experts em produtos. 

A tecnologia foi apenas um componente. As mudanças foram no processo e na ausência do tradicional esforço de programação. Pessoas de vendas, treinadas em princípios básicos de programação, puderam criar a ideia e executá-la até o fim. 

Este é um exemplo de Citizen Automation ou automação das pessoas. Nela, cada cidadão com pouco aprendizado de tecnologia e programação, utilizando ferramentas de low-code, é capaz de automatizar suas próprias tarefas do dia a dia ou até mesmo criar novas. 

As pessoas querem isso! Iniciativas como esta ajudam na retenção de talentos nas empresas. O melhor uso da inteligência e da criatividade dos funcionários é libertador. 

A união de pessoas, plataformas, processos e tecnologia, visando economizar tempo delas mesmas, resulta em altíssima satisfação, reduzindo etapas de processos desnecessários e gerando grandes resultados. 

Automação não é sobre conectar o CRM com o e-commerce. É sobre empresas incentivando pessoas a criar seus próprios braços biônicos. Isso só é possível com uma estratégia de desconstrução dos processos antigos. 

Para isso, quanto maior a diversidade de pessoas e opiniões, melhor. Quanto menos enraizados em processos antigos os funcionários são, melhor. Quanto mais questionamentos, melhor. 

O escritório que ensinava as pessoas a se comportar e seguir o que sempre foi feito é a antítese desse pensamento. É por isso que os CEOs avessos ao home office vão sofrer e perder a chance de escrever seus nomes na história da automação e da liberdade. 

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Este post foi produzido por Fernando Teixeira, Senior Vice President of Data da Media.Monks e colunista do MIT Technology Review do Brasil.

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