O novo e sombrio relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC), da ONU, ressalta o preço que o mundo está pagando pelos longos atrasos no combate ao aquecimento global, apesar de décadas de alertas.
No ano passado, o CO2 emitido pelo consumo de energia em todo o mundo superou 36 bilhões de toneladas, estabelecendo um novo recorde à medida que a economia global se recuperava das profundezas da pandemia.
Conforme as emissões continuam a aumentar, os níveis de gases de efeito estufa que o mundo ainda pode emitir antes de atingir limites perigosos de aquecimento se tornaram alarmantemente reduzidos, alerta o relatório divulgado no fim de março. Isso significa que o corte de emissões por si só quase certamente não será suficiente, conclui. O mundo também precisará criar a infraestrutura, os sistemas e as políticas necessárias para sugar bilhões de toneladas de dióxido de carbono do ar anualmente.
“A remoção de dióxido de carbono é essencial para atingir a neutralidade nas emissões líquidas [de gases de efeito estufa]”, Diána Ürge-Vorsatz, vice-presidente do grupo de trabalho que produziu o relatório de quase 3.000 páginas, durante uma teleconferência em março.
O IPCC elaborou uma série de extensos relatórios dirigidos a figuras com capacidade de decisão política. Nesses relatórios, são discutidos o estado do trabalho científico e os riscos crescentes do aquecimento global. A última parte, que corresponde à terceira da sexta grande avaliação do IPCC, analisa o atual conjunto de opções para desacelerar as emissões e limitar o impacto das mudanças climáticas.
O relatório dedica um capítulo à remoção de carbono, destacando o tamanho do papel que ela pode desempenhar e o quão desafiador pode ser atingir os níveis exigidos nas próximas décadas.
Apresentamos quatro das descobertas cruciais sobre a remoção de carbono:
1. A remoção de carbono é basicamente não opcional
O relatório da ONU sugere que agora é quase impossível evitar o aquecimento global de 1,5˚C sem esforços substanciais para remover o CO2. Dentro dessa linha de raciocínio, evitar os temidos 2°C também seria muito difícil.
Segundo o relatório, para evitar o primeiro cenário com níveis mínimos de remoção de dióxido de carbono, seria necessário reduzir a cada ano, em média, cerca de 31 bilhões de toneladas de emissões globais de gases de efeito estufa até 2030. Isso significa quase cortar as emissões pela metade em oito anos.
Cortar emissões tão rapidamente exigiria transições vertiginosas para novas tecnologias, bem como reduções acentuadas na demanda de energia. Isso exigiria mudanças sem precedentes no comportamento humano e melhorias de eficiência, todas as quais seriam “bastante desafiadoras de realizar no mundo real”, diz Zeke Hausfather, colaborador de um grupo de trabalho anterior para o último relatório climático da ONU e líder de pesquisa climática na Stripe.
Alterar a meta para 2°C proporcionaria uma década adicional para reduzir pela metade a poluição climática para 29 bilhões de toneladas de emissões até 2040.
A velocidade e a escala dos cortes necessários em ambos os casos simplesmente não são realistas, diz Julio Friedmann, cientista-chefe da Carbon Direct, uma empresa de pesquisa e investimento focada na remoção de carbono. As nações precisarão realizar ações “enormes” de remoção de carbono, diz ele.
O principal problema é que o mundo já emitiu demais. Não fizemos nem perto do suficiente para realizar uma transição para alternativas mais limpas de administrar nossas economias. E ainda não temos formas disponíveis e acessíveis de consertar certas indústrias e produtos, como aviação, transporte marítimo, fertilizantes, cimento e aço.
A promessa da remoção de carbono é que ela pode dar às nações mais tempo para mudar para práticas sustentáveis e equilibrar as emissões contínuas de fontes que não sabemos como substituir.
Mas …
2. Temos que fazer muito mais
Impedir que o planeta aqueça 2°C, ou reverter as mudanças climáticas, pode exigir a redução de bilhões de toneladas de dióxido de carbono todos os anos.
Os modelos de remoção de CO 2 basearam-se em três métodos principais de remoção de carbono: plantio de árvores, restauração de florestas e adoção de práticas semelhantes de manejo da terra no que diz respeito ao desenvolvimento e implantação de máquinas de sucção de carbono e dependência de plantas para produzir energia enquanto capturam as emissões, o que é conhecido como BECCS. De acordo com o relatório, manter as temperaturas abaixo de 2°C adicionais poderia “provavelmente” exigir a remoção de até 11 bilhões de toneladas de CO2 por ano até 2050 e 20 bilhões até 2100.
3. Precisamos de uma ampla gama de opções de remoção de carbono
O relatório enfatiza que diferentes estratégias para a remoção de carbono têm benefícios e desafios muito distintos.
Aquelas baseadas na natureza, como plantar árvores e restaurar florestas, por exemplo, são as mais amplamente implantadas nos dias de hoje. Mas o carbono pode voltar direto para a atmosfera quando as plantas morrem ou queimam em incêndios. Portanto, essas soluções provavelmente têm vida mais curta do que outros métodos, como o armazenamento geológico, que retém o carbono no subsolo.
A captura direta de ar pode remover e armazenar carbono permanentemente, mas as máquinas que realizam esse processo são atualmente limitadas em capacidade e caras. Além disso, a tecnologia consome grandes quantidades de energia e água, observa o relatório.
Os modelos de remoção de CO 2 do relatório do IPCC baseiam-se fortemente no BECCS, que é um híbrido de estratégias baseadas na natureza e tecnológicas, com alguns dos benefícios de cada uma. O BECCS, no entanto, requer grandes quantidades de terra que podem competir com as necessidades de produção de alimentos, entre outros desafios.
O relatório observa uma ampla variedade de outras maneiras de capturar dióxido de carbono, incluindo abordagens baseadas na capacidade oceânica, como o uso de minerais para aumentar a alcalinidade da água do mar. Mas a maioria são métodos não comprovados.
4. A expansão exigirá financiamento e decisões políticas
Os autores do painel climático enfatizam que alcançar altos níveis de remoção de carbono exigirá pesquisa e desenvolvimento significativos para determinar os métodos mais eficazes, minimizar os impactos ambientais e desenvolver rapidamente grandes projetos no mundo real.
“Precisamos de todos a postos para explorar um conjunto diversificado de opções para decretar a descarbonização profunda e remover o dióxido de carbono”, escreveu Frances Wang, gerente de programa da ClimateWorks Foundation, que financia os esforços de pesquisa de remoção de carbono, em resposta a uma reportagem da MIT Technology Review americana.
O maior obstáculo para construir uma grande indústria de remoção de carbono provavelmente será o custo. Quem vai pagar as centenas de bilhões a trilhões de dólares que serão gastos para remover tanto dióxido de carbono ano após ano?
O relatório diz que acelerar a pesquisa e o desenvolvimento sobre a remoção de carbono, e fazer com que as empresas realmente o façam, exigirá um “compromisso político” dos governos. Isso significa promulgar políticas para exigir ou incentivar a remoção de carbono, bem como métodos para garantir que as práticas estejam alcançando os benefícios climáticos reivindicados.
Se a história servir de guia, as sombrias descobertas de um novo relatório do IPCC não mudarão nada radicalmente. O mundo está produzindo cerca de 6 bilhões de toneladas a mais de emissões anuais do que quando a última grande avaliação foi publicada, em 2014. Mas cada vez mais trabalho está acontecendo na remoção de carbono à medida que a importância de seu papel no combate às mudanças climáticas se torna cada vez mais clara.
Correção: Esta história foi atualizada para corrigir os níveis estimados de remoção de carbono que podem ser necessários para manter as temperaturas abaixo de 2°C.