Há algum tempo o mercado discute sobre o efetivo valor do Bitcoin, principalmente quando vivemos períodos de forte valorização, como o atual momento. A criptomoeda valorizou 113% no acumulado dos últimos 12 meses.
Muitos analistas financeiros discutem sobre sua natureza, ausência de lastro, falta de um órgão centralizador e, em muitos casos, ausência de regulação, mas poucos tentam apresentar o motivo da atual cotação do Bitcoin, na casa dos R$ 312 mil. O preço é determinado pela demanda, mas será que a alta procura reflete apenas a expectativa de futura alta no preço, como muitos especialistas da economia clássica afirmam, ou será que existe algo além? O que fez esse ativo ter deixado de ser visto como um movimento social para se tornar um ativo com valor de mercado de US$ 1,19 trilhão, objeto de interesse dos maiores investidores globais como BlackRock e Fidelity?
Imagine se, quando do surgimento da internet, fosse permitido comprar frações dessa tecnologia? Quantas pessoas gostariam de ser donos de um pedacinho do famoso protocolo “http” que faz a internet como conhecemos hoje funcionar? Quanto isso valeria?
O caminho natural da maioria das pessoas ao encontrar uma mudança de grande magnitude é negá-la sem ao menos se aprofundar no assunto. Não é diferente com o Bitcoin, assim como não o foi com a internet ou telefone celular. Pensar na criptomoeda e analisá-la com a mentalidade de ativos financeiros tradicionais certamente o levará a questionar seu valor; porém, estamos diante de uma revolução tecnológica e, como toda grande mudança, exige que ampliemos a nossa visão para podermos enxergar o “novo”.
Assim, o que propomos é uma análise com a mentalidade ajustada à novidade, para nos permitir entender o real valor do Bitcoin e, consequentemente, desta nova economia tokenizada derivada dele.
Parte do valor do Bitcoin para a sociedade está na tecnologia por trás dele
O sistema blokchain é a inovação tecnológica que possibilitou o Bitcoin e o processo de tokenização de ativos. A tecnologia provou ser útil não apenas como um sistema de pagamentos, como imaginado na sua criação, mas também em uma gama de usos que vão desde o melhor controle dos gastos públicos e captação de recursos com emissão de tokens à melhoria nos registros de transferências imobiliárias etc.
O próprio Banco Central do Brasil já trabalha na digitalização do Real (chamado Drex) usando o sistema blockchain. Isso traria dentre outros benefícios, uma facilidade para a tokenização e negociação de ativos usando Drex como moeda nativa.
Por tratar-se de um sistema aberto, o Bitcoin e a maioria das outras blockchains públicas funcionam como uma plataforma, permitindo uma fácil integração com quaisquer outros projetos e soluções para os mais diversos setores da nossa sociedade.
Qualquer pessoa com conhecimento em programação pode interagir e desenvolver produtos e soluções utilizando-se de sua tecnologia, praticamente sem custo, permitindo o surgimento de inovações em escala exponencial. Além disso, o fato de ser open source elimina muitos dos riscos e incertezas normalmente associados às soluções centralizadas e de código fechado, pois qualquer pessoa pode revisar o código fonte para sugerir melhorias ou identificar potenciais problemas de segurança.
O Bitcoin, por ser o primeiro e mais difundido ativo digital, é usado hoje como “moeda de reserva” nessa indústria: praticamente todas as pessoas envolvidas com ativos digitais possuem Bitcoin, todos os serviços que aceitam ativos digitais aceitam Bitcoin e o preço de outros ativos digitais é comumente contabilizado em Bitcoin.
Os avanços trazidos pela criptomoeda refletirão na sociedade como um todo, posto que a tecnologia permite inúmeras novas funcionalidades, dentre elas a eliminação de intermediários em qualquer tipo de transação, inclusive no setor financeiro. Por essa razão, as principais instituições financeiras do Brasil e do mundo possuem equipe dedicada ao desenvolvimento de soluções e produtos pautados no blockchain.
Blockchain democratiza o acesso ao mercado financeiro e proporciona mais transparência
Atualmente, para efetuarmos transações financeiras, recorremos aos entes do sistema financeiro: utilizamos dinheiro em papel emitido por um governo ou dinheiro digital controlado por bancos que atuam como intermediários.
Os órgãos financeiros e os governos, em razão da regulamentação e controle do setor, gozam da confiança da sociedade para intermediar seus pagamentos e transferências de recursos. São os responsáveis por validar e conferir todas as operações financeiras realizadas de forma eletrônica, evitando o risco do “gasto duplo”, certificando-se de que os recursos sejam, de fato, transferidos de uma pessoa à outra, bem como respondem por qualquer inconsistência ou problema ocorrido na transação, muitas vezes cobrando elevadas taxas por esses serviços.
Os governos, muitas vezes, abusam desse poder, vide o congelamento das poupanças em 1990, os repetidos casos de corrupção e a contínua desvalorização da moeda causando inflação.
Com a utilização do sistema financeiro nos moldes atuais, abrimos mão de nossa absoluta liberdade e delegamos a confiança a corporações. No passado não existia alternativa, pois era necessário um agente centralizador, sempre criando o risco de abuso do poder. Mas, assim como a internet democratizou o acesso à informação, o blockchain democratiza o acesso ao mercado financeiro.
O Bitcoin, por meio do blockchain, resolveu a questão do “gasto duplo” sem a necessidade de um intermediário (papel das instituições financeiras nas transações “tradicionais”) e retirou o fator confiança dos bancos — ou melhor, conferiu a cada detentor de Bitcoin o poder de efetuar transferências livremente, independentemente do valor e sem limites, a custos irrisórios. Essa tecnologia resgatou a liberdade, antes restrita às operações físicas, ao mundo digital. Nos tornamos, novamente, os únicos responsáveis pelas nossas atitudes e os únicos responsáveis pelo controle das nossas riquezas, sem a necessidade de um órgão centralizador.
Inovadores ao redor do mundo, do Vale do Silício à Cingapura, de São Paulo à Estocolmo, estão criando empresas, projetos e novas soluções para velhos problemas usando o blockchain, Bitcoin e demais ativos digitais. Recentemente os grandes grupos financeiros passaram a enxergar o blockchain como um sistema capaz de gerar eficiência, com redução de gastos e possibilidade de criação de novos produtos e soluções financeiras de rápida e fácil distribuição, inclusive quanto à possibilidade de desenvolvimento de mercado secundário.
Essa indústria evoluiu significativamente, com o surgimento de novas soluções e iniciativas conectando a indústria financeira tradicional ao mundo dos ativos digitais, gerando uma simbiose de forma que, em pouco tempo, deixaremos de tratar do mercado financeiro tradicional e do mercado dos ativos digitais, quando o blockchain se tornará o novo padrão da indústria financeira, com o senso de colaboração em alta, decorrente de sua natureza distribuída.
Portanto, o grande valor do Bitcoin é ter criado uma rede de pessoas motivadas que acreditam num futuro melhor, no qual as regras são as mesmas para todos, as informações são transparentes, o poder é descentralizado e boas ideias são facilmente executadas, financiadas e recompensadas, além de ter dado início a uma nova indústria que inclui milhares de blockchains, tokens, aplicações decentralizadas e um ecossistema vibrante.
Alex Michaelis Buelau – Co-founder e CPTO na Parfin
Rodrigo Caldas de Carvalho Borges – Advogado, sócio no CBA | Carvalho Borges Araujo Advogados