Desde 1971, os principais líderes políticos, empresariais e culturais de diversos segmentos da sociedade, representando seus países, se encontram no Fórum Econômico Mundial para discutir problemas e tendências que o mundo enfrenta ou enfrentará e como podemos nos preparar diante destes desafios. De todas as temáticas debatidas (ambiente, economia, guerras, questões políticas, sociais, etc.), vamos analisar neste artigo o impacto das tendências da Transformação Digital na educação, no futuro do trabalho, nos novos modelos de gestão, mais especificamente, na gestão das pessoas.
É inquestionável a necessidade de qualificar as pessoas para assegurar o futuro do negócio onde atuam e para reduzir as desigualdades sociais, impedindo o aumento da lacuna de habilidades requeridas e disponíveis, por meio do desenvolvimento de competências de tecnologia, meio ambiente, social, governança, interpessoais, como liderança, resiliência e perspicácia global para navegar no mundo em constantes e intensas mudanças.
A diferença entre a vida de um trabalhador com e sem habilidades altamente valorizadas ficou clara numa pesquisa com mais de 52 mil trabalhadores em todo o mundo: os profissionais que acreditam ter habilidades escassas são significativamente mais felizes e capacitados. Ao mesmo tempo, eles são muito mais propensos do que outros a pedir um aumento ou promoção em períodos curtos e a procurar um novo empregador se não estiverem satisfeitos onde estão. Reconhecem seu poder no mercado de trabalho e buscam utilizá-lo.
Embora a pesquisa tenha descoberto que o salário era o fator mais importante na escolha de um emprego, encontrar um trabalho gratificante estava apenas dois pontos atrás (69%) e a capacidade de ‘ser você mesmo’ (segurança psicológica) estava apenas três pontos atrás. O desejo de ser autêntico no trabalho uniu os qualificados e os menos qualificados, os trabalhadores híbridos e os presenciais, os velhos e os jovens, dado que desmistifica a ideia de que só os jovens valorizam isto.
Os trabalhadores precisam de habilidades sob demanda, incluindo habilidades necessárias para usar a tecnologia — e não ser substituído por ela. Eles querem que seu trabalho tenha significado, como também sentirem-se engajados na equipe. As empresas que atenderem bem a estas expectativas ganharão a confiança de sua força de trabalho, um passo crucial para a entrega de resultados sustentados para os negócios e para a sociedade, com isto a jornada do empregado não é mais responsabilidade exclusiva dos recursos humanos, é tarefa de todo gestor em relação à sua equipe.
Com o fenômeno da Grande Renúncia iniciado no EUA e a Transformação Digital em andamento em todo o mundo, há ainda mais urgência para os líderes repensarem as práticas de contratação e desenvolvimento de equipes, como sugere o estudo Grande Evasão ou Grande Atração: a escolha é sua” da McKinsey & Co. Utilização de inventário de habilidades; descrições de trabalho mais expandidas para atrair uma variedade maior de pessoas capazes de fazer o trabalho; reavaliar se as exigências para o cargo serão realmente utilizadas; aplicar novas ferramentas nos processos de seleção e contratação, como foco em solução de problemas, como por exemplo, o design thinking; estimular processo de mentoria interna para apoiar novos colaboradores; realizar qualificação e o treinamento para a Transformação Digital para todos (não apenas quem tem baixo desempenho); promover uma cultura de aprendizado e desenvolvimento contínuo de habilidades – como discutir isso em reuniões individuais e em avaliações de desempenho.
A mudança tecnológica, a pandemia de Covid-19 e a transição verde representam grandes riscos para os meios de subsistência das pessoas. De fato, o relatório Future of Jobs 2020 indica que, até 2025, o tempo gasto em tarefas atuais no trabalho por humanos e máquinas será igual. O investimento urgente em capital humano é, portanto, necessário para criar um mundo mais justo, garantindo que as pessoas tenham a chance de realizar seu potencial e prosperar. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico estima que 1,1 bilhão de empregos podem ser radicalmente transformados pela tecnologia na próxima década. O Fórum Econômico Mundial prevê um saldo globalmente positivo entre o crescimento e o declínio do emprego. No entanto, se os programas de aprendizado continuarem desatualizados irão exacerbar ainda mais a incompatibilidade de habilidades no futuro.
O Fórum está trabalhando com várias partes interessadas para fornecer a 1 bilhão de pessoas habilidades e oportunidades econômicas até 2030 como parte de uma revolução de requalificação. Mais de 350 milhões de pessoas em todo o mundo estão sendo alcançadas pela Plataforma Reskilling Revolution do Fórum desde que foi lançada em janeiro de 2020. O ambicioso programa está capacitando a força de trabalho global em tecnologias e Inteligência Artificial (IA), habilidades necessárias para preparar carreiras para o futuro. A crescente rede global de economias dedicadas a preencher as lacunas de habilidades e educação se conecta por meio da plataforma Reskilling Revolution para aumentar os esforços uns dos outros e compartilhar abordagens exclusivas e personalizáveis.
A IA e o aprendizado de máquina estão revolucionando a maneira como milhões de pessoas trabalham. As pessoas com as habilidades mais solicitadas têm ganhos mais altos e mais oportunidades. À medida que a Transformação Digital se espalha pela economia, um número crescente de setores da indústria está lutando para atrair trabalhadores com habilidades em IA/ML, computação em nuvem, mídia social e gerenciamento de produtos. Os pesquisadores analisaram centenas de milhões de ofertas de emprego recentes nos EUA para identificar as quatro habilidades mais procuradas em nossos locais de trabalho em constante mudança, descobriram que um em cada oito anúncios de emprego listava uma dessas habilidades acima.
Os empregos do futuro e a disrupção generalizada no local de trabalho estiveram no topo da agenda da Reunião Anual do Fórum Econômico Mundial em Davos, em janeiro de 2023, cujo tema do evento foi “Cooperação em um mundo fragmentado”. Isto reforça a importância da cooperação (ou outra palavra com igual sentido) estar no rol de competências de empresas mais inovadoras, ou descrita nos valores corporativos. No entanto, como não adianta discurso sem ação, é crucial que os modelos de gestão estimulem a cooperação, por meio de boas práticas em toda a jornada do colaborador, como por exemplo, nas políticas de remuneração valorizando resultados coletivos em detrimento dos individuais.
A Plataforma de Economia Digital e Criação de Novo Valor ajuda empresas a alavancarem a tecnologia para serem ágeis diante da disrupção e para criarem modelos de negócios habilitados digitalmente para o mundo pós-Covid-19, orientados a propósitos sustentáveis e inclusivos. Esta plataforma aproveita sua extensa comunidade de mais de 500 líderes seniores e profundidade de experiência em transformação digital para equipar as empresas para responder aos desafios de hoje e liderar a economia de amanhã.
A crise gerada pela Covid-19 acelerou a urgência por agilidade, adaptabilidade e transformação. As estruturas da indústria e os modelos de negócios tradicionais foram interrompidos — e a digitalização da economia está sendo acelerada rapidamente. Estima-se que 70% do novo valor criado na economia na próxima década serão baseados em modelos de negócios de plataformas habilitadas digitalmente. No entanto, 47% da população mundial permanecem desconectados da Internet.
Os mercados de trabalho já estão sob muita pressão. Assistimos a milhões de trabalhadores deixarem seus empregos em meio a um período de instabilidade e disrupção sem precedentes em busca de funções que ofereçam melhor subsistência, condições de trabalho e equilíbrio entre vida pessoal e profissional.
Pesquisa do The Adecco Group, Skills for the Green Economy explica como as organizações dos setores público e privado precisam começar a priorizar as pessoas, investir em sua empregabilidade contínua e alavancar habilidades para impulsionar a transição para uma economia mais sustentável. Qualquer estratégia de transição bem-sucedida precisará considerar que:
- Mais de 1,47 bilhão de empregos em todo o mundo dependem de um clima estável, e essa inovação progressiva significa que muitos empregos ainda precisam ser inventados. O espaço — e a necessidade – para o desenvolvimento de habilidades verdes não pode ser subestimado.
- Com a redução gradual do uso dos combustíveis fósseis, alguns setores (e regiões) serão mais afetados do que outros, principalmente as indústrias de energia e automotiva.
- Consumidores e trabalhadores estão cada vez mais responsabilizando as empresas e mudando suas escolhas; as empresas precisarão oferecer soluções social e ambientalmente sustentáveis para se tornarem preparadas para o futuro.
Trabalhadores ao redor do mundo e todos os setores são (ou serão) afetados pelo crescimento da economia baseada em trabalhos informais e pela transição para uma economia mais verde, bem como pelas tendências relacionadas à tecnologia de automação, IA e digitalização. Não é nada fácil lidar com essas megatendências, mas, quando tratados adequadamente, podem levar a inúmeras oportunidades para governos, empresas e trabalhadores individuais. De um modo mais geral, as políticas verdes inteligentes podem levar a: uma força de trabalho mais qualificada e preparada para o futuro; mercados de trabalho funcionais com sistemas educacionais sofisticados; sistemas de proteção social inclusivos; nem todos os empregos reaparecerão automaticamente nas mesmas indústrias em que foram perdidos. Por isso é crucial manter a mobilidade e a flexibilidade do mercado de trabalho.
Mundialmente, 70% dos trabalhadores ainda veem os empregadores como os principais responsáveis pela garantia de um futuro de trabalho melhor, por isso, cabe às empresas intensificar e provar aos trabalhadores que a sua empresa é o melhor local possível para se preparar para o futuro do trabalho. Se o seu talento mais forte não consegue ter acesso às oportunidades de qualificação e requalificação de habilidades dentro da sua empresa, eles irão encontrar outro lugar onde tenham esse acesso, independentemente de isso significar uma mudança de carreira ou um trabalho na empresa concorrente.
As megatendências citadas acima irão impactar, principalmente, a empregabilidade e as perspectivas a longo prazo dos trabalhadores, que terão que cuidar para não deixar que suas habilidades fiquem obsoletas. Neste sentido, os indivíduos devem ser encorajados a assumir o protagonismo de suas carreiras, sendo proativos na busca contínua de oportunidades de qualificação e requalificação. É preciso entender que suas habilidades têm uma data de validade e que a aprendizagem ao longo da vida, o famoso LIFELONG LEARNING, é um pré-requisito para melhorar sua trabalhabilidade futura, já que não necessariamente haverá empregos formais (empregabilidade) e sim oportunidades de trabalho.
Outras pesquisas focadas especificamente na gestão de pessoas, ratificam a maioria dos pontos tratados pelo WEF e fazem uma análise mais delimitada das prioridades para 2023: Modelo de trabalho hibrido; Inteligência Artificial na otimização de processo de trabalho do RH; sistemas de RH nas nuvens; novas tecnologias e formatos de recrutamento; e desenvolvimento de soft skills.
Para finalizar, o relatório Accenture Life Trends 2023 identificou cinco macrotendências globais do comportamento humano que vão interferir nos negócios. Mark Curtis, coordenador do estudo da Accenture, frisou que “as dinâmicas de poder geradas pelas novas tecnologias trarão oportunidades para que as empresas desenvolvam maneiras novas e modernas de construir relacionamentos com os clientes”:
- Sobreviver: num cenário de incertezas, adaptação parece ser a palavra de ordem.
- Acreditar: necessidade de pertença, de lealdade, de fidelização.
- As it was: necessidade de rever modelos de trabalho para não perder a cultura, a inclusão, a capacidade de inovar.
- Criatividade: usar as novas ferramentas de Inteligência Artificial (IA) para impulsionar a criatividade.
- Assinado, fechado, entregue: na posse de digital wallets, os consumidores poderão decidir quantos dados irão compartilhar.
Mudar relacionamento com clientes é uma competência humana, demonstrada por comportamentos. E este é ponto central — é preciso mudar comportamentos, o que garantiu o sucesso de carreiras e organizações até aqui, com certeza não garantirá o sucesso daqui para frente. Para mudar o AGIR é necessário mudar o PENSAR. Somente revisitando os próprios modelos mentais (funcionais e disfuncionais) será possível estabelecer as prioridades de ação para que este ano em curso traga resultados que agreguem valor não apenas as soluções dos problemas atuais, mas a construção de um futuro desejado para si, para as organizações e para a sociedade.
Este post foi produzido por Denize Dutra, Doutora em Administração. Consultora, Coach, Professora Convidada da FGV e colunista do MIT Technology Review do Brasil.