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Depois de muitas décadas de tentativas, os cientistas alcançaram um marco na pesquisa de fusão nuclear, finalmente executando uma reação que gerou mais energia do que foi usada para iniciá-la.
A secretária de Energia dos EUA, Jennifer Granholm, anunciou em dezembro que os pesquisadores da Instalação Nacional de Ignição (NIF, pela sigla em inglês) do Laboratório Nacional Lawrence Livermore (EUA) alcançaram o que é conhecido como ganho líquido de energia (NEG, pela sigla em inglês), uma conquista histórica para a pesquisa de fusão nuclear.
O avanço demonstra a viabilidade fundamental da geração de energia a partir da fusão, um objetivo que os pesquisadores perseguem desde a década de 1950. Mas o experimento científico exigiu o uso dos lasers mais poderosos do mundo e este não é um caminho prático imediato. Muitos avanços científicos e de engenharia serão necessários para transformar a fusão de um experimento de laboratório em uma tecnologia comercial que possa fornecer energia confiável e livre de carbono para toda uma rede elétrica.
Nas reações de fusão, seja em um reator ou no núcleo de uma estrela, os átomos se chocam uns contra os outros até se fundirem, liberando energia. O objetivo é obter mais energia da reação do que o que é colocado para energizá-la e manter o combustível no lugar, e fazer isso de maneira controlada. Até agora, isso nunca havia sido demonstrado.
Mas a reação de fusão no NIF conseguiu, gerando 3,15 megajoules de energia, mais do que os 2,05 megajoules fornecidos pelos lasers usados no reator. Em 2021, a mesma instalação produziu cerca de 70% do fornecimento de energia graças à reação pelos lasers, que requerem mais energia para funcionar do que fornecem ao reator, mas até mesmo ver o NEG no sistema é um marco significativo.
“Isso é muito motivador para a comunidade”, diz Anne White, diretora de ciência e engenharia nuclear do MIT (EUA). Mas, acrescenta ela, isso não significa que amanhã já veremos energia de fusão nuclear nas redes: “Isso não é realista”.
O laboratório usa o maior e mais poderoso laser do mundo em uma técnica de fusão chamada confinamento inercial, que usa lasers que disparam por alguns bilionésimos de segundo para gerar raios-x que se comprimem e aquecem uma minúscula cápsula de combustível do tamanho de um grão de pimenta. Posteriormente, o combustível mesclado com tipos pesados de hidrogênio chamados deutério e trítio, fica quente e denso o suficiente para formar um plasma, e os núcleos de hidrogênio começam a se chocar, fundindo-se e liberando energia.
Embora o confinamento inercial seja a primeira abordagem de fusão a produzir NEG, não é o caminho mais provável para possíveis tentativas de comercializar esse tipo de energia no futuro. Muitos cientistas de fusão nuclear acham que o confinamento magnético, que faz uso de um reator em forma de rosquinha chamado tokamak, é uma opção mais viável. Em vez de lasers, tokamaks e outros reatores que usam confinamento magnético dependem de ímãs para manter o combustível no lugar e alcançar as condições intensas necessárias para que a fusão ocorra usando corrente elétrica e ondas de rádio.
Como suas abordagens técnicas são tão diferentes, o NEG do experimento de confinamento inercial não é reproduzido em outras abordagens de energia de fusão, como tokamaks. Embora ambas visem criar plasma quente o suficiente para alimentar a fusão, a física e a engenharia necessárias para chegar lá diferem entre os vários conceitos, diz White.
Algumas startups bem financiadas, como a Commonwealth Fusion, estão buscando sistemas de confinamento magnético, enquanto a Helion Energy e outras estão trabalhando em sistemas híbridos de confinamento magneto-inercial e algumas, como a TAE Technologies, estão visando outras abordagens. E, aponta White, todos afirmam que eventualmente acabarão obtendo ganho líquido, já que este é o primeiro passo em direção a um sistema de energia viável usando fusão.
Ainda assim, ter obtido ganho líquido é uma conquista significativa para um campo que vem buscando resultados há décadas.
“Este é um momento importante”, diz Michl Binderbauer, CEO da TAE Technologies. Embora a engenharia por trás das diferentes abordagens de fusão seja diferente, Binderbauer considera isso como uma prova de que o poder de fusão, em seu nível mais básico, pode funcionar.
O próximo passo, diz White, é produzir muito mais energia do que é fornecida, em vez de apenas um pouco mais. Isso é especialmente importante em abordagens de confinamento inercial porque os lasers não são muito eficientes, então eles tiram mais energia da grade elétrica do que fornecem ao reator de fusão. Assim, embora houvesse NEG dentro do reator, na realidade, produzir esses 3,15 megajoules consumiu cerca de 300 megajoules da rede.
Desde que os lasers para o NIF foram projetados, uma tecnologia laser mais eficiente foi desenvolvida e os pesquisadores também enxergam um caminho para gerar centenas de megajoules de energia em reações em vez de apenas alguns, disse o diretor de Lawrence Livermore, Kim Budil, em uma coletiva de imprensa após a notícia.
Não será uma tarefa simples construir reatores que possam produzir de forma confiável e repetida uma quantidade significativa de energia. Além disso, ainda precisaremos ver muitos grandes anúncios até a tão esperada declaração dos usos comerciais da energia de fusão.
Mas obter ganho líquido em um laboratório nacional é um marco para a área de fusão, mesmo que em um reator pouco prático. Como Budil disse durante a coletiva de imprensa, “esta é uma prova de que isso é possível”.
Este artigo foi atualizado em 14 de dezembro com detalhes técnicos adicionais.