O que tem valor para você? Se você gosta muito de um músico, por exemplo, o quanto você pagaria pela guitarra que ele usou em sua primeira apresentação? Um item único como esse não tem só grande valor afetivo, mas também monetário. Só que quando falamos em ativos digitais, esse valor de propriedade pode se perder, uma vez que, com a Internet, é possível ter acesso a tudo. E é exatamente aí que entram as NFTs, onde obras digitais, memes e, até mesmo um tweet, ganham um certificado que tornam esses ativos autênticos algo único e que, com o registro, podem ser comercializados a preços astronômicos.
O Non-Fungible Token (NFT) é, na verdade, um certificado digital desenvolvido via blockchain e que define a originalidade e rastreabilidade dos bens digitais. Um token não fungível é uma espécie diferente de token criptográfico que representa algo único. Ao contrário das criptomoedas e de diversos outros tokens, os NFTs não são mutuamente intercambiáveis, como dinheiro, por exemplo, em que duas notas de cinco reais têm o mesmo valor que uma de 10 e podem ser facilmente trocadas.
Esses tokens já existem há algum tempo, mas a discussão sobre o tema foi impulsionada porque, em março deste ano, a casa Christie’s leiloou a obra “Everydays: The first 5000 days”, do artista digital Beeple, por 69,3 milhões de dólares. Outro exemplo é o do Jack Dorsey, cofundador e CEO do Twitter, que vendeu o NFT do primeiro tweet da plataforma (que foi feito por ele mesmo) por US$2,9 milhões – algo próximo dos R$11 milhões. E o termo, que até então parecia distante do que vivemos, hoje já é mais que uma realidade. As pessoas passaram a enxergar os tokens não-fungíveis não só como algo colecionável, mas também como um investimento. Mas, eles vão muito além disso e há diversas maneiras de explorar essa possibilidade.
O real valor de uma NFT — e aqui eu não estou falando de dinheiro especificamente — está ligado à percepção pessoal e à crença de que aquele ativo é valioso para um grupo de pessoas. Além disso, temos outros fatores bastante característicos desses ativos e que atraem a atenção das pessoas, como escassez, propriedade, possibilidade de ser colecionável, arte digital, liquidez, relação com plataformas de negociação, autenticidade, desejo, identidade, base em blockchain e ser visto como reserva de valor de investimento. Faço aqui uma ressalva inclusive para os tópicos “liquidez de revenda”, “desejo” e “escassez”, uma vez que esses que são fundamentais para serem explorados pelas marcas em busca de atração de público e de relacionamento com seus consumidores.
Por não ser um item palpável, pode ficar complicado entender o porquê de tanta importância, mas para ficar mais claro vou usar um exemplo bem recente. Sabe a verificação do Instagram? Apesar de não ter um custo envolvido, aquele selo azul é uma forma de saber que a conta com a qual você está interagindo é a presença autêntica de uma figura pública, celebridade, marca ou entidade notável. Sendo assim, tem grande valor para quem conquista esse selinho e para as pessoas que buscam um influencer relevante para seguir.
Os NFTs e a experiência do consumidor
Se antes as campanhas das marcas eram pensadas para serem disseminadas de forma massificada, visando atingir o maior número de pessoas para, dessas milhares, ter a atenção de 100, hoje, por outro lado, as empresas já entenderam o valor de ações mais assertivas com comunicação personalizada para aquela comunidade, especialmente. De acordo com uma pesquisa da Zendesk, plataforma de atendimento ao cliente, 75% dos consumidores no mundo afirmaram que gastariam mais com uma companhia caso tivessem um bom atendimento. Já para 76% dos brasileiros, uma má experiência estimula a procura de uma outra oferta para a mesma necessidade.
Ou seja, as pessoas se engajam com marcas que, de fato, entendem as suas necessidades e entregam uma experiência única. E quando traçamos um paralelo com os NFTs, notamos que é exatamente esse o efeito que eles proporcionam. Esses tokens unem alguns elementos capazes de despertar a identificação no público-alvo e trazer o senso de pertencimento, que é o exato ponto onde muitas marcas precisam chegar para conquistar seus clientes.
Por ser uma tecnologia relativamente nova, nesse momento, ainda não há uma grande movimentação de marcas em direção ao uso do NFT. Hoje, a sua utilização é mais nichada, e isso talvez seja porque são poucos os que entendem o mundo de possibilidades que podem ser exploradas com esses tokens. Quando de fato as empresas perceberem o imenso mar de oportunidades que os NFTs oferecem, o mercado vai ter um boom e a tendência é que seja massivo, mas o público ainda precisa se familiarizar mais com essa ideia.
O impacto no mercado
Já estamos notando um movimento de algumas marcas a caminho do NFT. Como nos esportes, por exemplo. Esse mercado sempre foi movido pela venda de colecionáveis como figurinhas, tênis de edições limitadas e hoje também com os NFTs. Recentemente a NBA, junto com a empresa Dapper Labs, criou o NBA Top Shot, um negócio de vendas de cards virtuais de cenas de lances das partidas, os “momentos”. De acordo com o site NBA Top Shot, já foram vendidos mais de 7,6 milhões de lances e as negociações passaram de US$ 869 mil em dezembro de 2020, para US$ 224 milhões em fevereiro de 2021. Foram mais de 80 mil negociações!
Em uma busca constante por inovação, lançamos o nosso NFT por aqui, com tecnologia 100% brasileira. Para fecharmos um evento focado na cultura da companhia, que fizemos para os mais de 200 empreendedores que integravam nosso time na época — hoje somos mais de 300 —, criamos um token especial com nossos valores reproduzidos em uma peça digital animada e sonorizada e presenteamos cada um dos participantes. Nós decidimos também que os NFTs vão nos ajudar a simbolizar cada nova conquista, marco histórico e sonhos realizados.
Essa ação nos deu ainda mais certeza de que o NFT não é mais sobre o futuro e sim, sobre o presente. A tecnologia tem desafiado empresas e pessoas a se reinventarem e estamos vendo o mundo se transformar diante dos nossos olhos todos os dias. E se hoje, o NFT ainda não caiu no gosto da sociedade, acredito que será por pouco tempo. Apesar de parecer um assunto muito complicado, esses tokens proporcionam uma sensação muito conhecida que é a de pertencimento a algo, um grupo, uma ideia, enfim, aquilo que faz a gente se sentir parte de uma comunidade.
O que está cada vez mais claro pra mim é que todo esse movimento e tecnologia presente nas NFTs é algo absurdamente transformador. Capaz de mudar toda a nossa realidade diante dos olhos. O que acredito é que esses tokens vão muito além do que hoje enxergamos como óbvio, como obras de arte digitais, itens colecionáveis de jogos, etc. As marcas precisam entender o seu valor como uma ferramenta que cria proximidade com seu público de interesse. Está mais do que na hora de ver o NFT como poder de conexão. Por isso, é melhor não ficar para trás.
Este artigo foi produzido por Rapha Avellar, empreendedor em série, fundador da Adventures e colunista da MIT Technology Review Brasil.