Atualmente, o cenário econômico global é marcado por juros altos, resultado de esforços dos bancos centrais para conter a inflação. Esse aumento nas taxas de juros visa desacelerar a economia e controlar a alta dos preços, que foi impulsionada por fatores como a recuperação pós-pandemia, interrupções nas cadeias de suprimentos e conflitos geopolíticos. No entanto, há uma grande incerteza sobre quando e se essas taxas começarão a cair, já que a economia global ainda enfrenta desafios significativos e a inflação permanece uma preocupação persistente.
Tal contexto vem fazendo muitas empresas segurarem os seus investimentos em apostas mais incertas quanto ao resultado, evitando a alta exposição ao risco. O “capital parado” está rendendo bem; para quê alta exposição ao risco nesse momento? Esse tem sido o pensamento de um número crescente de executivos na tomada de decisão em relação ao seu portfólio de projetos envolvendo tecnologia nas empresas.
Aversão ao risco, pouco apetite a testes nos negócios e busca por manter as finanças saudáveis com recursos próprios têm levado as organizações ao chamado movimento de “volta ao básico”. Oriundo do termo em inglês “back to basics”, tem sido uma expressão muito utilizada nos rituais de governança atualmente, quando a intenção é buscar fazer melhor o básico antes de ousar por iniciativas mais arriscadas.
“De volta ao básico” não deveria significar “não inovar”
Uma certa ansiedade corporativa tem tomado a cabeça de uma crescente quantidade de líderes de tecnologia e inovação neste sentido: “justo agora que tanta novidade tecnológica tem surgido, estamos com dificuldade em aprovar nossas inovações no portfólio?”. Essa tem sido uma indagação que tenho escutado com certa frequência de muito líderes.
Minha reflexão tem sido a de que não se trata de não inovar, mas sim de como inovar. Nessas horas, vem-me à lembrança os estudos no MIT Sloan quando tive o prazer de conhecer e ser aluno do professor David Robertson, autor do livro THE POWER OF LITTLE IDEAS (Robertson, David. The Power of Little Ideas: A Low-Risk, High-Reward Approach to Innovation. Harvard Business Review Press).
Inovar nos negócios pode ser visto como casar uma nova solução a um problema de mercado, gerando valor. Muitos, erradamente, só consideram ou dão mais valor à inovação disruptiva, abordagem que propõe uma solução completamente nova sendo aplicada em um mercado existente, entretanto, existem outras formas a escolher onde a empresa quer inovar.
No quadrante abaixo, Robertson mostra a Matriz Ansoff da Inovação, que pode ser um instrumento muito útil para avaliação de um portfólio de projetos ligados à inovação. No eixo horizontal, temos o grau de novidade na ótica da solução, e, no vertical, qual o tipo de problema ou mercado queremos atingir com a mesma. Quanto mais para o centro decidirmos atacar, menor o risco associado ao investimento; ao passo que, quanto mais para o alto e para a direita, mais arriscado será o movimento.
Em tempos como os atuais, que requerem grande austeridade com os recursos investidos, onde podemos inovar com menor risco? A abordagem chamada de The Third Way of Innovation (ou Terceira Via da Inovação) remete a identificar qual o nosso produto atual principal e inovar ao seu redor, por meio do uso de soluções que já são acessíveis no momento em mercados atuais ou que ainda não chagamos com o nosso produto. Muitas vezes, partir para um novo produto pode ser um movimento com um alto risco de execução ou um investimento incompatível com a realidade da empresa.
Na abordagem “de volta ao básico”, que está sendo foco de muitas empresas atualmente, esse conceito pode representar ótimas oportunidades para, por exemplo: criar uma experiência fantástica para seu cliente enquanto usa o seu produto atual; reposicionar, no mercado, a sua marca, atraindo novos públicos que hoje não são alcançados; ajustar o modelo de negócio atual… Tudo isso inovando ao redor do produto, sem sair do produto atual, que já levou a empresa ao sucesso, e com níveis de risco bem menor.
Aumentar o conhecimento sobre tudo que se refere ao seu produto no mercado vai ajudar, com certeza, a coletar ideias inovadoras a ser implementadas nessa terceira via de inovação, por diferentes óticas:
O cliente: Como ele usa o seu produto? Algo pode complementar essa experiência? Tecnologias atuais, por exemplo, que conectem outros usuários e tragam o sentido de comunidade, podem agregar nesse sentido? Jornadas de relacionamento mais lisas com sua empresa podem ser muito melhoradas com o uso de IA generativa, seja para atendimento ou até mesmo para gerar conteúdo único e relevante, que traga a sensação de hiper personalização desse relacionamento.
O produto: Por onde ele passa? Qual é a cadeia logística envolvida? Como tecnologias como blockchain, por exemplo, podem desintermediar esse ciclo e encantar seu público?
O dinheiro: Como seu cliente identifica a sua necessidade de falta de algo, que o faz ir em busca de produtos como o seu para comprar? Como o cliente ideal compara o seu produto com os dos seus concorrentes antes da compra? Como a experiência de compra dele pode ser mais omnichannel, transitando por canais físicos e digitais de uma forma completamente fluída? Imagine como IA e novas tecnologias de integração podem ajudar neste sentido.
Todos os exemplos acima são meramente ilustrativos e sugestivos do uso da abordagem da terceira via de inovação; no entanto, certamente existe um número extenso de oportunidades no seu negócio em que a inovação pode ser aplicada com menos risco e com mais fácil implementação.
Vejo um número razoável de líderes olhando, nos dias atuais, para uma determinada tecnologia emergente e indo atrás de casos de uso, quase como uma solução em busca de um problema, quando, na verdade, deveríamos buscar sempre ter, em nossas organizações, pessoas atualizadas nessas tecnologias, mas que partam do problema de negócio para a solução (e não o contrário); e aí, sim, olhar para o sempre crescente baú de tecnologias disponíveis (algumas emergentes, outras, não) e analisar qual resolve melhor aquela dor do cliente e do negócio.