Implante usa machine learning para que amputados tenham controle sobre mãos protéticas
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Implante usa machine learning para que amputados tenham controle sobre mãos protéticas

Os pesquisadores conseguiram amplificar os sinais nervosos a ponto de serem traduzidos em movimentos.

Há pelo menos uma década, os pesquisadores têm trabalhado para tornar as próteses controladas pela mente uma realidade. Uma mão artificial que pudesse ser controlada com a mente poderia, teoricamente, restaurar a capacidade dos amputados de realizar todos os tipos de tarefas diárias e melhorar drasticamente seu padrão de vida.

No entanto, até agora, os cientistas enfrentaram uma grande barreira: não foram capazes de acessar sinais nervosos fortes ou estáveis o suficiente para enviar ao membro biônico. Embora seja possível obter esse tipo de sinal usando uma interface cérebro-máquina, ela precisa ser implantada através de um procedimento invasivo e caro. Além disso, os sinais nervosos transportados pelos nervos periféricos que se espalham a partir do cérebro e da medula espinhal são pequenos demais.

Um novo implante contorna esse problema usando o machine learning para amplificar esses sinais. Um estudo, publicado na Science Translational Medicine em março de 2020, afirma que, por quase um ano, esse método funcionou para quatro amputados. Eles ganharam um controle preciso de suas mãos protéticas, permitindo que pegassem blocos em miniatura, agarrassem itens como latas de refrigerante e jogassem “Pedra, papel e tesoura”.

É a primeira vez que os pesquisadores registram sinais em milivolt de um nervo, uma medida muito mais forte do que qualquer estudo anterior.

A força desse sinal permitiu aos pesquisadores treinar algoritmos para traduzi-los em movimentos. “O implante funcionou imediatamente desde a primeira vez que o acionamos”, diz Paul Cederna, professor de biomecânica da Universidade de Michigan (EUA), que co-liderou o estudo. “Não havia lacuna entre o pensamento e o movimento”.

O procedimento para o implante requer que um dos nervos periféricos do amputado seja cortado e costurado ao músculo. Ao longo de três meses, o local cicatriza, desenvolvendo nervos e vasos sanguíneos. Então, eletrodos são implantados nesses locais, permitindo que um sinal nervoso seja registrado e repassado para uma mão protética em tempo real. Os sinais são transformados em movimentos usando algoritmos de machine learning (os mesmos tipos que são usados para interfaces cérebro-máquina).

Amputados usando mãos protéticas conseguiram controlar cada dedo individualmente e girar seus polegares, não importando o quão recentemente houvessem perdido seus membros. Seus sinais nervosos foram gravados por alguns minutos para calibrar os algoritmos aos seus sinais individuais, mas depois disso cada implante funcionou imediatamente, sem a necessidade de recalibrar durante os 300 dias de teste, de acordo com a colíder do estudo Cynthia Chestek, professora adjunta de engenharia biomédica na Universidade de Michigan.

É apenas um estudo de prova de conceito, portanto, requer mais testes para validar os resultados. Na época, os pesquisadores estavam recrutando amputados para um ensaio clínico financiado pela DARPA e pelo National Institutes of Health dos Estados Unidos.

Desafios de mundo real

Em comentário feito à MIT Technology Review Brasil, o pesquisador na área de conectividade cerebral do Centro de Pesquisa em Imagem e Big Data do Hospital Israelita Albert Einstein Birajara Soares Machado avaliou que é preciso haver ponderações sobre a necessidade de parametrização do modelo de machine learning para cada paciente e que talvez não haja, ainda, um entendimento correto ou um aprendizado da inteligência artificial efetivo sobre os padrões eletrofísiológicos que definem os movimentos.

“Um grande desafio para a área de inteligência artificial ser empregada em problemas de ‘mundo real’ é a concepção de modelos de machine learning que funcionam para diferentes conjuntos de um mesmo tipo de dado. Neste contexto, um único modelo parametrizado para diferentes pacientes. Esta condição pode minimizar o risco de vieses e melhorar a acurácia da modelagem quando ela for empregada fora do ambiente de laboratório e numa grande quantidade de pacientes”, afirmou.

Ao mesmo tempo, o pesquisador enxerga com otimismo os avanços em pesquisas, que podem trazer vantagens para diferentes tipos de tratamento. “É importante ressaltar que o impacto que essa tecnologia tem para área de reabilitação é enorme e abre a possibilidade de estudos que buscam uma maior compreensão de como sinais com origem no cérebro se relacionam com aqueles medidos no nervo, aumentando o escopo de aplicação e o entendimento para outros problemas de saúde, como AVC e distonia, por exemplo”, complementou.

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