Do vale da desilusão ao platô de produtividade: o avanço da GenAI no Brasil
Inteligência artificial

Do vale da desilusão ao platô de produtividade: o avanço da GenAI no Brasil

Jornada nas empresas impõe desafios com ROI, cultura e governança

A Inteligência Artificial generativa vem se consolidando como um motor de transformação organizacional, capaz de impulsionar produtividade, inovação e novos modelos de trabalho. Estimativas recentes do Fórum Econômico Mundial apontam que a GenAI pode adicionar até US$ 4,4 trilhões à economia global até o fim de 2025, oferecendo ganhos de eficiência, otimização de cadeias de suprimentos e oportunidades de negócios. No entanto, o avanço da tecnologia também apresenta desafios estruturais relevantes, desde regulamentações incertas até riscos de privacidade e disputas sobre propriedade intelectual.

Há quase um ano, o artigo “Navegando pelo vale da desilusão da GenAI” discutia como empresas brasileiras enfrentavam dificuldades na implementação de projetos de GenAI, muitas vezes devido a planejamentos superficiais sobre custos, retorno sobre investimento e adaptação de equipes. Hoje, ao observar os dados recentes do relatório “Mapa da GenAI no Brasil”, produzido pelo TEC.Institute, bem como os debates no evento Gartner CIO & IT Executive, realizado em São Paulo, percebe-se que o cenário evoluiu: há um movimento consistente de empresas em direção a um platô de produtividade, no qual a tecnologia deixa de ser apenas experimental e começa a gerar valor real, ainda que de forma gradual.

A adoção da GenAI no Brasil segue um caminho de maturidade, que pode ser mapeado em cinco etapas: Observador, Explorador, Construtor, Orquestrador e Visionário. Segundo levantamento do TEC.Institute, mais de 70% das empresas ainda se encontram nas duas primeiras fases, utilizando a IA de forma pontual ou em múltiplos pilotos, com uma integração limitada e uma liderança compartilhada. É a partir da fase de Construtor que se inicia a geração de valor efetivo, apoiada por planejamento estruturado, capacitação das equipes, ética aplicada e integração aos processos centrais do negócio. Apenas uma parcela mínima de empresas alcança o nível Visionário, no qual a IA se torna central para a operação, com processos automatizados de ponta a ponta e equipes maduras no uso da tecnologia.

Entre benefícios intangíveis e retorno tangível

Para além de questões relacionadas à jornada de desenvolvimento da IA Generativa nas empresas do país, o report do TEC.Institute, em consonância com o “State of AI in Business 2025”, divulgado pelo MIT NANDA, reforça que apenas cerca de 5% das organizações obtêm retorno financeiro concreto com GenAI, um dado corroborado também por pesquisas recentes do Gartner, o que tem gerado preocupação por parte dessas companhias. A maioria dessas iniciativas gera benefícios intangíveis ou de longo prazo, como economia de tempo e melhoria na qualidade de processos. No entanto, para converter essa produtividade em valor financeiro é necessário mais do que investir em tecnologia: é preciso construir uma estratégia clara, governança sólida e capacitação contínua.

Nesse contexto, o Gartner destaca três tipos de retorno que podem ocorrer: o Return on Employee, ligado à melhoria do trabalho diário e à eficiência operacional; o Return on Investment, que se traduz em benefícios financeiros diretos, como redução de custos; e o Return on Future, associado à criação de novos produtos, serviços e modelos de negócio. Dessa forma, enquanto a maior parte das empresas ainda concentra esforços no primeiro tipo, apenas uma minoria consegue avançar para o retorno financeiro tangível ou a transformação estratégica que caracteriza o Return on Future.

A combinação entre tecnologia, estratégia e processos

A governança e a liderança têm papel central nessa jornada. Profissionais como o CDAO (Chief Data and Analytics Officer, em inglês, responsável, justamente, por governança, qualidade e estratégia de dados em uma organização) emergem como facilitadores estratégicos, garantindo que os dados estejam estruturados e permeiem decisões, processos e produtos. Paralelamente, o CTO e o CIO mantêm protagonismo na infraestrutura tecnológica, assegurando arquitetura, segurança e integração de sistemas. A convergência entre líderes de tecnologia e de negócios é essencial para que a GenAI produza valor mensurável, evitando iniciativas isoladas ou mal coordenadas.

Além disso, a capacitação e a cultura técnica das equipes são determinantes para o sucesso da adoção. O fenômeno do Shadow AI, destacado pelo MIT NANDA, ilustra os riscos do uso descoordenado da tecnologia por colaboradores sem supervisão formal, o que pode gerar falhas na percepção de domínio da IA Generativa e comprometer a governança. Investir em treinamento estruturado, mudanças culturais e disseminação de boas práticas é tão crucial quanto a própria tecnologia.

A pesquisa do TEC.Institute revela ainda um contraste entre empresas estruturadas e não estruturadas. As primeiras possuem plano formal, responsáveis dedicados, integração com sistemas internos, capacitação avançada e políticas éticas consolidadas. Aquelas que formam o segundo grupo, apesar de reconhecerem a importância da Inteligência Artificial generativa, ainda operam de forma fragmentada, com baixa integração, pouca liderança técnica e diretrizes éticas informais. Essa diferenciação evidencia que o sucesso na jornada de GenAI depende da capacidade de combinar tecnologia, estratégia, cultura e processos, em vez de depender apenas do entusiasmo inicial ou da adoção pontual.

Caminho para o futuro

A GenAI, portanto, deixa o “vale da desilusão” de 2024 e caminha para o que Gartner chama de “rampa da iluminação”, rumo a um platô de produtividade. Esse movimento exige das organizações decisões estratégicas, em especial para as empresas brasileiras (que se encontram em uma fase inicial da jornada de implementação da tecnologia), investimentos em capacitação, governança robusta e integração das ferramentas de forma coerente.

Apesar desse cenário, há sinais de maturidade crescente: empresas que avançam em direção aos níveis “Construtor” e “Orquestrador” começam a traduzir a promessa da IA em resultados concretos, gerando valor e construindo vantagem competitiva sustentável.

No Brasil, o futuro da GenAI será definido a partir de como as organizações, as lideranças e o mercado nacional transformarão intenção em ação, passando da experimentação para uma integração estratégica, ética e contínua. O desafio é grande, mas também é uma oportunidade inédita de colocar o país em uma posição de protagonismo, aproveitando a tecnologia não apenas para consumo, mas como alavanca de inovação e diferenciação no mercado global.

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