Decidindo o destino dos embriões “sobressalentes”
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Decidindo o destino dos embriões “sobressalentes”

Escolher entre armazenar, doar ou descartar embriões excedentes de fertilização in vitro nem sempre é uma decisão fácil.

O que você encontrará neste artigo:

Leis e regulamentações ao redor do mundo
Opções: descartar, doar ou armazenar
O que é a transferência compassiva?

Nos últimos meses, estive trabalhando em um artigo sobre embriões de fertilização in vitro (FIV). O objetivo desse processo é gerar bebês por meio de um trabalho laboratorial: estimular a liberação de vários óvulos, fertilizá-los com espermatozoides em laboratório, transferir um dos embriões resultantes para o útero de uma pessoa e torcer por uma gravidez saudável. Às vezes, não funciona. Mas muitas vezes, sim. Para este artigo, explorei o que acontece com os embriões saudáveis que sobram.

Conversei com Lisa Holligan, que passou pelo processo de FIV no Reino Unido há cerca de cinco anos. Holligan doou seus embriões “geneticamente anormais” para pesquisas científicas. No entanto, ainda possui um embrião saudável congelado em armazenamento – e não sabe o que fazer com ele.

Ela não é a única que enfrenta essa incerteza. Os embriões “sobressalentes” são mantidos congelados em tanques de armazenamento, onde ficam em pequenos tubos, invisíveis a olho nu, com seu desenvolvimento pausado em um estado de animação suspensa. O que acontece a seguir depende da escolha pessoal. Mas essa escolha pode ser limitada por uma teia complexa de leis, fatores éticos e sociais.

Atualmente, clínicas de FIV responsáveis sempre conversam com os pacientes sobre a possibilidade de terem embriões excedentes antes do início do tratamento. Os futuros pais assinam um documento indicando o que gostariam que acontecesse com esses embriões. Normalmente, isso significa decidir antecipadamente se os embriões que não forem utilizados serão destruídos ou doados, seja para outra pessoa tentando engravidar ou para pesquisas.

No entanto, tomar essas decisões antes mesmo de iniciar o tratamento pode ser extremamente difícil. Pessoas que buscam a fertilização in vitro geralmente passaram muito tempo tentando engravidar. Elas esperam ter embriões saudáveis e, muitas vezes, nem consideram a possibilidade de haver embriões excedentes, ou como poderiam se sentir em relação a eles.

Para muitas pessoas, embriões não são apenas aglomerados de células. Afinal, eles carregam o potencial para a vida. Alguns os veem como filhos, à espera de nascer. Algumas pessoas até nomeiam seus embriões ou os chamam de “bebês de congelador”. Outros os encaram como o produto da longa, exaustiva e cara jornada da FIV.

Holligan conta que, inicialmente, considerou doar seu embrião para outra pessoa, mas seu marido discordou. Ele via o embrião como um filho e não se sentia confortável em entregá-lo para outra família. “Comecei a pensar sobre a possibilidade de um filho me procurar no futuro dizendo que teve uma vida terrível e perguntando: ‘Por que você não me teve?’”, disse ela.

Holligan mora no Reino Unido, onde é possível armazenar embriões por até 55 anos. Destruí-los ou doá-los também são opções. Isso não ocorre em todos os países. Na Itália, por exemplo, embriões não podem ser destruídos nem doados. Qualquer embrião congelado permanecerá assim para sempre, a menos que a legislação mude.

Nos Estados Unidos, as regulamentações variam conforme o estado. Esse mosaico de leis significa que um estado pode conceder status legal aos embriões, garantindo-lhes os mesmos direitos que uma criança, enquanto outro pode não ter nenhuma legislação específica sobre o tema.

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Ninguém sabe ao certo quantos embriões estão congelados em tanques de armazenamento, mas estima-se que esse número esteja entre 1 milhão e 10 milhões apenas nos Estados Unidos. Alguns desses embriões estão armazenados há anos ou até décadas. Em alguns casos, os futuros pais optaram deliberadamente por essa situação, escolhendo pagar centenas de dólares por ano em taxas.

Em outros casos, as clínicas perderam contato com seus clientes. Muitos desses ex-pacientes pararam de pagar pelo armazenamento de seus embriões. No entanto, sem formulários de consentimento atualizados, as clínicas podem hesitar em destruí-los. E se a pessoa voltar e quiser usar esses embriões afinal?

“A maioria das clínicas, se tiver qualquer hesitação, dúvida ou questionamento, tenderá a manter esses embriões e não os descartar”, afirma Sigal Klipstein, endocrinologista reprodutiva do InVia Fertility Center, em Chicago, e presidente do comitê de ética da Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva. “Porque é como se fosse um caminho sem volta.”

Klipstein acredita que uma das razões pelas quais alguns embriões acabam “abandonados” no armazenamento é que as pessoas que os criaram não conseguem tomar a decisão de destruí-los. “É emocionalmente muito difícil para alguém que desejou tanto formar uma família”, diz ela.

Klipstein conta que conversa regularmente com seus pacientes sobre o que fazer com embriões excedentes. Mesmo aqueles que tomam uma decisão com confiança podem mudar de ideia, segundo ela. “Todos nós já tivemos pacientes que descartaram embriões e, depois de seis meses ou um ano, voltaram dizendo: ‘Ah, eu queria ter esses embriões de volta’”, conta. “[Esses embriões podem ter sido] a melhor chance que tinham de engravidar.”

Aqueles que decidem descartar seus embriões têm algumas opções. Frequentemente, os embriões são simplesmente expostos ao ar e depois descartados. No entanto, algumas clínicas oferecem a possibilidade de transferi-los em um momento ou local onde a gravidez seja extremamente improvável. Esse procedimento, conhecido como “transferência compassiva”, pode ser visto como uma forma mais “natural” de descartar o embrião.

Mas essa alternativa não é para todos. Holligan passou por vários abortos espontâneos e se pergunta se uma transferência compassiva poderia trazer sentimentos semelhantes. Ela teme que isso acabe apenas submetendo seu corpo e sua mente a um estresse desnecessário.

No fim das contas, para Holligan e muitos outros em uma situação semelhante, a escolha continua sendo difícil. “Esses são embriões muito desejados”, diz Klipstein. “O objetivo de passar pela FIV foi criar embriões para ter bebês. E [quando essas pessoas] têm esses embriões e já completaram seus planos familiares, elas se veem em uma situação que nunca imaginaram.”

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