O avanço da tecnologia e o aumento das interações digitais têm feito com que cada vez mais organizações percebam o valor dos dados. Apesar disso, segundo um estudo do Gartner, são poucas as corporações que conseguem extrair de forma bem-sucedida recomendações acionáveis baseadas em análise de dados, seja por baixa confiabilidade nos próprios dados, seja por dificuldades em compreender uma recomendação clara de ação.
Ainda que essas sejam as informações evidenciadas na pesquisa, muitas organizações acreditam que são orientadas por dados — mas, na prática, não são.
Essa visão é similar à de Pat Bajari, responsável por Inteligência Artificial na Amazon, que, durante evento recente, apontou que “cerca de 90% das empresas do mundo se consideram data driven, mas apenas 7% delas realmente são”.
A importância de transformar dados em informações para melhorar a tomada de decisões
Para compreender melhor os clientes e garantir que estejam no centro da visão estratégica da companhia, é fundamental obter dados, para, então, transformá-los em informações e, assim, tomar ações.
Em primeiro lugar, colocar o cliente no centro não significa tratar cada cliente como único, mas, sim, entender a qual subgrupo aquele cliente único faz parte, segmentando esta base de clientes por características semelhantes entre si, que os façam ter as mesmas dores, dúvidas e desejos.
A pessoa que está na ponta no atendimento deve tratar cada um como único, mas em termos analíticos para a tomada de decisão é impraticável olhar um a um separadamente, tornando turva a tomada de decisão.
1ª característica: tamanho da empresa
Por exemplo, para o programa de formação “Gestão 4.0 – Imersão e Mentoria”, do qual sou mentor, temos por turma um grupo heterogêneo de 50 empresários e donos de empresas. Comumente, a composição é de aproximadamente 30% das empresas com menos de 100 colaboradores, 30% das empresas entre 100 e 250 colaboradores, 25% das empresas entre 250 e 1.000 funcionários e 15% das empresas com mais de mil pessoas. Ao preparar o conteúdo e a experiência dessas formações, precisamos levar em conta estes diferentes subgrupos, para adaptar os exemplos que serão dados à turma, a profundidade nos assuntos e a forma de transmiti-los. Assim, garantimos que todos os subgrupos tenham um ótimo entendimento e consigam levá-los para a sua realidade.
Um importante insight que podemos tirar daqui é: fazer a média e pensar a partir dela pode ser um grande erro.
Se olhássemos pela média, neste exemplo teríamos cerca de 250 colaboradores por empresa. Se utilizássemos isto como base para prepararmos nosso conteúdo e experiência, estaríamos excluindo parte importante dos nossos clientes e nossa entrega seria muito prejudicada. Logo, não trate a base inteira como se fosse uma só.
2ª característica: composição societária
Ainda dentro destes mesmos clientes, temos empresas com sócios únicos, empresas com mais de um sócio e empresas familiares. As dores, dúvidas e desejos de cada subgrupo em termos de governança, melhores práticas de gestão, estrutura organizacional, tomada de decisão são completamente diferentes.
Por conta disso, nos preparamos previamente olhando um a um dos participantes, mas já contemplamos que em termos de assuntos, questões que venham a interessar às diferentes composições societárias.
Outros aspectos que podem ser levados em consideração
Várias outras características, como setor de atuação, indústria, tipo de produto ou serviço, tamanho de faturamento, poderiam ser utilizados para definir cada um destes subgrupos.
Isso vale para empresas que trabalham diretamente com venda para empresas (b2b) ou para o consumidor final (b2c).
Características como idade, gênero, classe social, poder de compra, padrão de compra, entre várias outras, podem ser utilizadas para encaixar cada cliente em um subgrupo que faça sentido e que tenha as mesmas dúvidas, dores e desejos.
Extraia, analise, clusterize e aja
“Sem dados, você é apenas uma pessoa com opinião”, disse Edwards Deming, cientista de dados.
Para tomar uma ação clara de melhoria na entrega, é preciso juntar os dados de cada um dos clientes, de forma que sejam informações acionáveis para o negócio.
O maior desafio quando se trata de inteligência de negócios das empresas mora aqui. Pensar em qual ação se quer tomar, quais informações são necessárias e encontrar e estruturar os dados para gerar estas informações.
Analisar a base de clientes da mesma forma irá criar distorções. A média 0 engana, caso olhemos a base sem dividi-la, portanto, é crucial granularizar os dados de forma a gerar informações específicas destes subgrupos, para poder adaptar a solução e maximizar a entrega de valor para o cliente.
Este é o fundamento em comum que vejo em todas as empresas que se mantém na liderança de forma perene: a utilização de dados e informações estruturadas na base da sua tomada de decisão. Sejam empresas que fundei, como Kanui, Rappi Brasil, G4 Educação e Norte Ventures, ou empresas nas quais invisto e estou no conselho.
Quanto maior a operação, como foi na Kanui, Dafiti e Rappi Brasil, maior a complexidade na consolidação dos dados para que se tornem informações. Nestes casos, o volume e a necessidade de granularizar é maior, exigindo maior integração tecnológica para que parte do processo seja automatizado e permita agilidade nas decisões, além de reduzir a margem de erros de atividades manuais.
Como operacionalizar decisões baseadas em dados
Existem vários níveis de maturidade de como lidar com dados. Na maior parte dos negócios brasileiros ainda há melhorias a serem feitas no nível de base, de controle e de qualidade, antes de análises preditivas e questões mais avançadas, como AI e machine learning.
Por conta disso, caso o negócio tenha um gap nesse aspecto, a primeira coisa a fazer é ter a mentalidade de “primeiro comece, depois fique bom”, pois é fundamental compreender que não dá para saltar do básico ao avançado de uma vez só. É importante, sim, ser impaciente quanto à ação, porém, é preciso ser paciente quanto ao resultado.
Se o líder pretende amadurecer o uso de dados e analytics da organização, naturalmente irá se deparar com várias soluções tecnológicas. Um ponto de atenção importante: é comum os gestores supervalorizarem o poder das ferramentas e façam contratações fora de hora e com má implantação.
Tecnologia realmente é um diferencial, mas contratar uma ferramenta estando ainda longe de atingir a maturidade correta para utilizá-la irá gerar desperdício de recursos e frustração.
Quando falamos de dados e praticamente tudo que envolve tecnologia, a lógica de prioridade é:
Gente -> Processos -> Tecnologia
Só será possível operar corretamente caso exista a pessoa certa na cadeira certa (adquirida de fora ou capacitada internamente), definindo os processos nos quais a operação deve funcionar e, por fim, utilizando a tecnologia como meio para facilitar e otimizar os outputs esperados.
Depois de contratar um profissional ou uma equipe dedicada para manter o processo de dados — criando, mantendo a infraestrutura e promovendo o seu uso — será fundamental ter um apoio top down para que a área se conecte às demais.
Em adição, é importante avaliar as diversas lideranças da organização conforme os novos processos e iniciativas são inseridos, analisando se há resistência quanto às mudanças. Como ser data-driven é mais do que uma área, mas sim uma cultura, trata-se de uma mentalidade que permeia as demais e o apoio das lideranças é fundamental.
Neste sentido, segundo um levantamento da Mckinsey, o apoio das lideranças é um dos aspectos que mais define o sucesso ou fracasso de iniciativas de uso de dados nos empreendimentos. Inclusive, o apoio do CEO foi elencado pelos entrevistados na pesquisa como fator decisivo na vantagem quando os assuntos são dados e analytics.
Este cenário se reflete no gráfico abaixo, mostrando que grande parte das estratégias bem-sucedidas de analytics receberam amparo dos CEOs.
Logo, por mais desconfortável que possa ser apoiar e acompanhar iniciativas técnicas, dependendo do background do líder, é fundamental que ele(a) o faça.
É importante que traduza e reforce continuamente as entregas de valor e outputs que cada projeto e processo possui, dando reforço top-down para promover as mudanças necessárias e incluindo o líder de dados em reuniões estratégicas.
Assim, o líder responsável por dados estará mais próximo dos demais gestores, compreendendo os desafios operacionais e estratégicos das áreas, para contribuir com resultados cada vez mais relevantes.
Este artigo foi produzido por Bruno Nardon, cofundador e mentor do G4 Educação, cofundador da Norte Ventures, Rappi Brasil, Dafiti, Kanui e colunista da MIT Technology Review Brasil.