Quando a jornalista e crítica cultural Amanda Hess engravidou de seu primeiro filho, em 2020, a internet foi uma das primeiras a saber. “Mais marcas sabiam da minha gravidez do que pessoas”, escreve, referindo-se a enxurrada de anúncios direcionados que começaram a aparecer para ela. “Todos me chamavam de ‘mamãe’.”
A internet prometia um acesso ilimitado a informações sobre como se tornar o pai ou a mãe perfeitos. No entanto, aos sete meses de gestação, Hess fez um ultrassom e tudo mudou. A imagem do exame parecia atípica. Enquanto aguardava na sala de exames para que o médico analisasse os resultados, sentiu o impulso de pegar o celular. Embora soubesse que “era absurdo”, ela escreve, “no meu pânico, parecia inquestionável: se eu buscasse de forma inteligente e rápida o suficiente, a internet nos salvaria. Eu havia construído minha vida por meio de suas telas, mapeado o mundo através de seus circuitos. Agora, criaria uma segunda vida ali também.” Seu médico informou a suspeita da condição que seu bebê poderia ter e a aconselhou: “Não pesquise no Google.”
Como era de se esperar, isso não a impediu. Na verdade, ela relata que, quanto mais informações os médicos forneciam — após semanas de exames cada vez mais complexos, seu filho foi diagnosticado com a síndrome de Beckwith-Wiedemann —, mais dependente do digital ela se tornava: “Percebi que recorria à internet, em vez de aos meus amigos ou médicos, para lidar com meus sentimentos e emoções sobre o que estava acontecendo comigo e para tentar exercer algum controle externo sobre meu corpo.”
Mas como manter o controle sobre nossos corpos quando corporações e o próprio sistema de saúde têm acesso às nossas informações mais pessoais? O que acontece quando as pessoas deixam de buscar apoio em sua comunidade ou até em suas famílias para se voltarem à internet, onde há um fluxo incessante de informações? Como lidar com as contradições da era digital — a tensão entre o que é inerentemente artificial e os métodos “naturais” que tantos insistem em promover?
Em seu novo livro, Second Life: Having a Child in the Digital Age (Segunda Vida: Ter um Filho na Era Digital, Doubleday, 2025), Hess explora essas questões enquanto relata suas próprias experiências com aplicativos, produtos, algoritmos, fóruns online, anunciantes e muito mais — cada um prometendo um caminho mais fácil, saudável e eficiente para a parentalidade. Depois de dar à luz seu primeiro filho, hoje saudável, em 2020, e outro em 2022, Hess está na posição ideal para questionar: será que essas promessas realmente se cumprem?
No livro, você escreve: “Imaginei a tinta rosa do meu teste [de gravidez] se espalhando pelo Instagram, Facebook, Amazon. Ao meu redor, uma infraestrutura tecno-corporativa estava se consolidando. Eu podia sentir os algoritmos de publicidade se recalibrando e os boletins informativos de marcas sendo preparados em suas filas. Eu sabia que deveria enxergar os anúncios direcionados como algo maligno, mas nunca os havia experimentado dessa forma.” Você pode explicar um pouco mais sobre isso?
Antes da gravidez, eu nunca senti que a tecnologia de anúncios fosse particularmente inteligente ou precisa. Então, quando os anúncios no meu Instagram imediatamente identificaram minha gravidez, foi um choque, e percebi que não entendia completamente como a tecnologia publicitária funcionava nem o alcance massivo que ela tinha. Foi especialmente inquietante porque, no início, minha gravidez era um segredo que eu mantinha de todos, exceto do meu parceiro — então, “a internet” era a única que falava sobre isso comigo. A publicidade tornou-se tão personalizada que começou a parecer íntima, mesmo sendo o oposto disso — representava a completa anulação da minha privacidade pelas corporações. Os anúncios de gravidez chegaram até mim antes mesmo de um médico concordar em me atender.
Embora seu livro tenha sido escrito antes da IA generativa se tornar tão onipresente, imagino que você tenha pensado em como isso muda as coisas. Você escreve: “Assim que engravidei, digitei ‘o que fazer quando se está grávida’ no meu telefone, e agora os anunciantes estavam fornecendo suas próprias respostas.” O que a ascensão da IA e as mudanças drásticas nas buscas significam para alguém que engravida hoje e recorre à internet em busca de respostas?
Acabei de pesquisar “o que fazer quando se está grávida” no Google para ver o que o widget de IA generativa da plataforma me diz agora, e ele basicamente fornece recomendações óbvias: Marque uma consulta com um médico. Pare de fumar cigarros. Em seguida, aparecem conteúdos patrocinados da Babylist, uma empresa de registros de bebês que está profundamente inserida no sistema de publicidade digital, e da Perelel, uma startup que vende suplementos pré-natais caros.
Portanto, independentemente de o mecanismo de busca usar IA ou não, as informações que ele fornece a quem acabou de descobrir a gravidez não são particularmente úteis ou significativas.
Olho: A internet “me fez sentir que eu tinha algum tipo de relacionamento com o meu telefone, quando, na verdade, tudo o que ele fazia era montar um cenário de informações que pudessem ser monetizadas.”
Para mim, o aspecto estranhamente sedutor era que eu fazia uma pergunta à internet e ela me dava uma resposta, como se tivéssemos uma relação recíproca. Então, mesmo antes da IA estar integrada a esses sistemas, eles já desempenhavam esse papel para mim—como uma espécie de parceiro de conversa sintético. Isso me fazia sentir que eu tinha algum tipo de relação com o meu telefone, quando, na verdade, tudo o que ele fazia era montar um cenário de informações que poderiam ser monetizadas.
Enquanto escrevia o livro, fiz algumas perguntas relacionadas à gravidez para o ChatGPT para tentar entender os valores e pressupostos embutidos em sua base de conhecimento. Pedi uma imagem de um feto, e ele me forneceu um desenho caricatural, um querubim de olhos grandes e brilhantes. Mas quando pedi uma imagem realista de um corpo pós-parto, ele recusou-se a gerar! Isso era, na verdade, uma extensão de algo que menciono no livro: a imagem do feto é fetichizada em muitos desses produtos tecnológicos, enquanto o corpo grávido ou pós-parto é amplamente apagado.
Você traz uma citação ótima—mas bem triste—de uma mulher no TikTok que disse: “Sempre ouço que é preciso uma vila para criar uma criança. Ela simplesmente aparece, ou há um número para ligar?”
Eu me identifiquei muito com esse sentimento, ao mesmo tempo em que fico desconfiada dessa ideia de que podemos simplesmente ligar para um número e invocar essa “vila”.
O que me interessa é que tantas tecnologias voltadas para pais se vendem dessa forma. O pediatra Harvey Karp diz que o Snoo, esse berço robótico que ele criou, é a nova vila. O site de parentalidade Big Little Feelings descreve seus ouvintes de podcast como uma vila. A marca de roupas para gestantes Bumpsuit produz um podcast que, na verdade, se chama The Village. Ao usar essa frase, essas empresas evocam uma visão idealizada de um passado que pode nunca ter existido, apenas para vender soluções de consumo. Uma sociedade que oferece apoio comunitário para crianças e pais é apresentada como uma ideia antiga e irrecuperável, em vez de algo que poderíamos construir no futuro, se realmente quiséssemos. E isso exigiria bem mais do que simplesmente comprar algo online.
E o benefício de muitos desses produtos robóticos ou “inteligentes” parece um tanto nebuloso. Você compartilha, por exemplo, que o monitor de bebê Nanit lhe disse que seu filho estava “dormindo de forma mais eficiente do que 96% dos bebês, um sólido A.”
Sou cética quanto à ideia de que um produto de consumo realmente resolverá um problema sério enfrentado por famílias ou crianças. E, se ele de fato resolver esse problema, o fará apenas para aqueles que podem pagar, o que é, de certa forma, condenável. Esses produtos podem até fazer alguma diferença positiva na duração do sono do bebê ou na facilidade de colocar uma fralda, por exemplo, mas são apenas soluções paliativas para um problema maior. Muitas vezes, quando testava alguns desses produtos, percebia que os dados fornecidos eram completamente inúteis. Minha amiga, que usa o Nanit, me mandou uma mensagem outro dia porque descobriu um novo recurso na câmera: ele mostrava um mapa de calor indicando onde o bebê havia dormido no berço na noite anterior. Essa informação não tem utilidade real, mas, ao ver o mapa de calor, os pais tentam interpretá-lo e extrair pistas irrelevantes sobre a personalidade do bebê. É como um quiz do BuzzFeed para bebês, onde você pode dizer: “Ah, ele é um rei do lado direito” ou “Ele é um bebê do meio”, ou algo assim.
Olho: “[As empresas estão] vendendo uma cura para a ansiedade dos pais, mas o produto em si está preso ao corpo de um recém-nascido.”
Esses produtos incentivam os pais a enxergar seus filhos como uma extensão da tecnologia; Karp até fala sobre a existência de um botão de ligar e desligar no bebê para acalmá-lo. A ideia é que, se você executar a sequência “certa” de movimentos para ativar o botão correto, poderá fazer com que o bebê desenvolva alguma característica desejável. Para mim, isso é apenas uma extensão do conceito de que o seu filho pode estar sob controle total.
… o que, na verdade, é a fantasia de muitos pais.
Esses dispositivos muitas vezes são comercializados quase como dispositivos médicos. Existe uma fusão entre as categorias de consumo e saúde na tecnologia voltada para bebês, onde os produtos são vendidos como úteis para qualquer bebê, seja ele diagnosticado com uma condição médica grave ou completamente saudável. Essas empresas querem que você coloque um oxímetro de pulso em um bebê saudável, apenas por precaução. Elas vendem uma “cura” para a ansiedade dos pais, mas o produto está preso ao corpo de um recém-nascido.
Depois de passar tanto tempo em hospitais com meu filho conectado a monitores, eu estava ansiosa para deixar essa experiência para trás. Então, me intriga essa reação oposta, na qual existe um desejo de prolongar essa experiência, de assumir controle pessoal sobre algo que tem um aspecto médico.
Mesmo que eu buscasse qualquer tratamento médico para manter meus filhos saudáveis, experiências médicas na infância podem causar muita confusão e trauma para as crianças e suas famílias, mesmo quando os resultados são positivos. Quando essa experiência médica é transformada em algo sofisticado, que combina com a paleta de cores do quarto do bebê e está completamente sob o seu controle, pode parecer que você está assumindo autoridade sobre um espaço que antes era assustador.
Outra coisa que você aborda no livro é como as imagens moldam versões idealizadas da gravidez e da maternidade.
Fiquei interessada em uma fotografia famosa tirada na década de 1960 pelo fotógrafo sueco Lennart Nilsson, que foi publicada na capa da revista Life. A imagem mostrava um feto de 20 semanas e era anunciada como o primeiro vislumbre do mundo sobre a vida dentro do útero. Comprei um exemplar da revista no eBay e, ao abri-la, encontrei uma pequena nota do editor explicando que o feto da capa, na verdade, havia sido removido do corpo da mãe por meio de uma cirurgia. Não era uma foto da vida—era uma foto de um aborto.
Fiquei interessada na maneira como Nilsson encenou esse corpo fetal para parecer celestial, como se estivesse flutuando no espaço, e reconheci muitos elementos do seu trabalho sendo incorporados nos produtos tecnológicos que eu usava, como o feto gerado por CGI no meu aplicativo de gravidez, Flo.
Você também escreve sobre as imagens fornecidas em clínicas de ultrassom não médicas.
Durante minha gravidez, tentei pesquisar no Google o endereço de um centro de imagem médica e me deparei com uma clínica comercial de ultrassom. Existem centenas delas espalhadas pelo país, com nomes fofos como Cherished Memories e You Kiss We Tell.
No livro, exploro como tecnologias como o ultrassom são usadas essencialmente como dispositivos narrativos, moldando a forma como as pessoas percebem seus corpos e suas gestações. O ultrassom é peculiar porque, ao mesmo tempo que é uma tecnologia médica utilizada para diagnosticar condições graves e assustadoras, os futuros pais são incentivados a vê-lo como um tipo de entretenimento enquanto acontece. Essas clínicas comerciais de ultrassom me intrigam porque prometem banir completamente qualquer associação médica com a tecnologia e transformá-la em uma experiência puramente comercial.
Você escreve sobre o parto “natural”, que, à primeira vista, pareceria oposto à era digital. Como você observa, esse movimento sempre foi sobre narrativa, e a história que ele conta é, na verdade, sobre a dor.
Quando estava grávida, fiquei muito fascinada com as pessoas que discutem o freebirth online — uma prática na extremidade mais radical dos rituais de parto “natural”, em que mulheres dão à luz em casa, sem assistência, sem obstetra, parteira ou doula presente. Algumas também recusam ultrassonografias, vacinas ou qualquer tipo de cuidado pré-natal. O que me interessava era como essa recusa da tecnologia médica estava sendo promovida tecnologicamente, por meio de podcasts, vídeos no YouTube e grupos no Facebook.
Percebi que muitas influenciadoras do freebirth que acompanhei pareciam obcecadas em exercer controle absoluto sobre suas gestações e seus filhos, não deixando nada sob a autoridade de especialistas médicos ou reguladores do governo. Elas também estavam interessadas em controlar a narrativa de seus partos — garantindo que o momento em que seus filhos viessem ao mundo fosse encenado com imagens impactantes que as colocassem como protagonistas do evento. Vídeos das versões mais extremas — como a mulher que deu à luz sozinha no oceano — podiam viralizar e lançar a carreira da freebirther como um guru digital do bem-estar.
A expressão “parto natural” foi cunhada por um médico britânico, Grantly Dick-Read, na década de 1920. Há uma seção muito engraçada em seu livro para futuras mães, na qual ele reclama que as mulheres continuam dizendo umas às outras que o parto dói. Dick-Read afirmava que a própria ideia de que o parto é doloroso era o que causava a dor, porque as mulheres estavam muito tensas durante o processo. O médico, como muitos de seus contemporâneos, tinha uma teoria racista de que as mulheres que ele chamava de “primitivas” não sentiam dor no parto porque não haviam sido expostas à educação da classe média branca e às tecnologias médicas. Quando li seu trabalho, fiquei fascinada pelo fato de que ele já descrevia o parto como uma espécie de performance, mesmo naquela época. Ele afirmava que partos sem interferência eram totalmente indolores e orientava mulheres durante o trabalho de parto para tentar alcançar esse resultado. O parto sem dor era apresentado como uma recompensa para aquelas que atingissem um estado máximo de feminilidade “natural”.
A propósito, ele era um grande entusiasta da eugenia! Vejo muito da sua influência na forma como o parto “natural” é promovido atualmente na internet — seus defensores ainda investem em uma espécie de negação ou supressão da experiência real das mulheres na busca por um ideal inatingível. Recentemente, vi um post no Instagram de uma mulher que afirmava ter tido um parto sobrenaturalmente indolor, mas que parecia extremamente abatida e sofrendo nas fotos, o que era completamente absurdo.
Eu queria te perguntar sobre Clue e Flo, dois aplicativos de monitoramento do ciclo menstrual com histórias de origem bem diferentes.
Baixei o Flo como meu aplicativo de monitoramento do ciclo menstrual há muitos anos por um motivo simples: foi o primeiro app que apareceu quando pesquisei na loja de aplicativos. Mais tarde, ao investigar suas origens, descobri que o Flo foi criado por dois irmãos, homens cisgênero que não menstruam, e que rapidamente superou e gerou mais receita do que um aplicativo de monitoramento menstrual já existente, o Clue, que havia sido criado por uma mulher, Ida Tin, alguns anos antes.
Os elementos que tornam um aplicativo lucrativo e bem-sucedido não são necessariamente os mesmos que os usuários realmente querem ou precisam. Minha experiência com o Flo, especialmente depois de engravidar, foi que ele parecia projetado para me fazer abrir o app com a maior frequência possível, mesmo quando não tinha nenhuma informação nova para me fornecer sobre minha gravidez. O Flo se apresenta como uma espécie de enfermeira artificial, embora não possa realmente te examinar ou examinar seu bebê. No entanto, esse tipo de substituto digital se tornou cada vez mais poderoso à medida que as desigualdades no atendimento à maternidade aumentam e um cuidado adequado se torna menos acessível.
Olho: “Médicos e enfermeiros testam mulheres grávidas para drogas sem seu consentimento explícito ou denunciam às autoridades gestantes que suspeitam estar lidando mal com suas gestações.”
Um dos recursos do Flo com o qual passei bastante tempo foi a área de “Chats Secretos”, onde usuários anônimos se reuniam para conversar sobre gravidez. Era, na verdade, muito divertido e me fazia voltar ao Flo repetidamente, especialmente quando eu ainda não discutia minha gravidez com pessoas na vida real. Mas também foi ali que aprendi que conexões digitais não são nem de perto tão úteis quanto conexões físicas; você não pode simplesmente aparecer na casa de uma amiga anônima do chat secreto e ajudá-la a acalmar seu bebê.
Perguntei a Ida Tin se ela já havia considerado adicionar um recurso social ou de bate-papo ao Clue, e ela me disse que decidiu não fazê-lo porque é impossível conter a desinformação que inevitavelmente surgiria em um espaço como esse.
Você escreve que o Flo “fazia parecer que eu estava fazendo uma escolha empoderada ao me vigiar.”
Após a revogação de Roe v. Wade, muitas mulheres optaram publicamente por evitar esse tipo de vigilância ao excluir seus aplicativos de monitoramento menstrual. Mas você menciona que não são apenas os aplicativos que compartilham informações. Quando conversei com advogados que defendem mulheres acusadas de crimes relacionados à gravidez, descobri que ainda não haviam encontrado um caso em que o governo tivesse se baseado diretamente em dados desses aplicativos. Em alguns casos, recorreram a pesquisas feitas pelos usuários no Google e mensagens no Facebook, mas, de longe, a principal fonte de vigilância usada pelos governos é o próprio sistema médico.
Médicos e enfermeiros testam mulheres grávidas para detectar drogas sem o consentimento explícito delas ou denunciam às autoridades gestantes que suspeitam estar lidando mal com suas gestações. Me interessa o fato de que a cobertura da mídia tem focado tanto no perigo potencial dos aplicativos de ciclo menstrual e muito menos na ameaça real e já estabelecida. Acho que isso acontece porque a narrativa oferece uma solução enganadoramente simples: basta excluir seu aplicativo de ciclo menstrual para se proteger. Desmantelar os sistemas de vigilância que realmente estão em vigor é muito mais difícil. Você não pode simplesmente “excluir” seu médico.
Para saber mais sobre este assunto, ouça nosso podcast: https://mittechreview.com.br/maternidade-era-digital/