Q+A Roberto Vieira da Rocha – A inovação que nos move
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Q+A Roberto Vieira da Rocha – A inovação que nos move

À frente da Teva no Brasil, o executivo fala sobre a jornada de quem convive com a doença de Huntington e sobre os avanços científicos que ajudam a devolver movimento, autonomia e propósito aos pacientes.

Todos os dias, cerca de 200 milhões de pessoas no mundo utilizam algum medicamento desenvolvido pela Teva Pharmaceuticals — um número que dimensiona a responsabilidade assumida por Roberto Vieira da Rocha, Country General Manager da companhia no Brasil.

O projeto Moving Matters, uma parceria entre a Teva e a MIT Technology Review Brasil, foi criado com o objetivo de conscientizar a sociedade sobre a doença de Huntington. A farmacêutica se propôs a ir além dos aspectos clínicos, lançando uma reflexão central: por que os movimentos importam? A resposta envolve perspectivas multifatoriais, que vão da discriminação genética ao impacto socioeconômico da doença na vida de pacientes e cuidadores.

Em entrevista exclusiva à MIT Technology Review Brasil, Roberto Vieira da Rocha fala sobre o desenvolvimento de inovação farmacêutica com propósito e analisa os desafios e avanços na jornada das pessoas que convivem com a doença de Huntington – uma condição neurodegenerativa hereditária, caracterizada por distúrbios do movimento, sintomas neuropsiquiátricos e comprometimento cognitivo progressivo.

Leia a entrevista na íntegra:

MIT Technology Review Brasil: O que a Teva representa no Brasil e no mundo?

Roberto Vieira da Rocha: A Teva é uma companhia multinacional farmacêutica com sede em Israel. Nós atuamos em mais de 60 países no mundo e somos líderes na parte de inovação em áreas como o Sistema Nervoso Central, mas também temos medicamentos genéricos e biossimilares em todos os países onde atuamos. Temos muito orgulho de uma linha de produtos que é imensa: mais de 30 mil itens que a companhia comercializa no mundo todo. São cerca de 200 milhões de pessoas que, todos os dias, fazem uso de medicamentos da Teva. Temos orgulho do propósito de conseguir apoiar a saúde em todos esses lugares em que estamos. No Brasil, a empresa é um pouco mais jovem. Começou as operações em 2006 e temos um número de medicamentos que também abrange a parte de oncologia, hematologia e produtos do Sistema Nervoso Central. A parte de inovação é onde temos o maior número de medicamentos disponíveis à população brasileira.

MIT TR BR: Olhando especificamente para a Doença de Huntington, uma doença rara com uma jornada bastante complexa, o que significa trazer os distúrbios do movimento como uma causa capaz de mobilizar a sociedade e não apenas o desenvolvimento clínico-farmacêutico?

Roberto: Significa muito para que a sociedade entenda o valor da inovação, de medicamentos ou da forma como a empresa está trazendo esse benefício para a população e para os pacientes. Falar sobre um medicamento que melhora muito a qualidade de vida de um paciente que tem um distúrbio de movimento vinculado à Doença de Huntington — que é um efeito chamado coreia, o mais comum nesse tipo de paciente — significa que estamos trazendo à tona a importância de compreender que essa doença, com esse tipo de efeito, leva a pessoa a ter uma vida muito pior. Falar sobre isso e trazer uma inovação que vai melhorar muito a qualidade de vida das pessoas e de seus familiares é muito importante. Projetos como o Moving Matters, que estamos fazendo em parceria com a MIT Technology Review Brasil, trazem à tona discussões relevantes. Por que a pessoa tem essa doença? Por que as doenças genéticas se manifestam de determinada maneira? Que tipo de diagnóstico precoce é necessário para entender melhor a doença? O que o paciente pode fazer para melhorar sua qualidade de vida? Esse tipo de doença é difícil porque envolve a família inteira. Ela é degenerativa e, conforme o tempo passa, a família precisa ter muito mais atenção. Muitas vezes, vemos situações em que o cuidador também precisa parar de trabalhar para cuidar do paciente, então o impacto social é muito grande e falar sobre tudo isso é essencial.

MIT TR BR: Considerando a sua experiência na indústria farmacêutica, essa compreensão de todo esse cenário, ou seja, conduzir uma ação pautada por um propósito, faz diferença?

Roberto: Acho que faz uma grande diferença. Uma doença como essa, que é caracterizada hoje no Brasil como uma doença rara, precisa aparecer por meio de movimento social e do entendimento do que ela representa. O Brasil hoje já tem muita luz sobre as doenças raras, mas elas são muitas. Trabalhando a questão do conhecimento e da disseminação de informação sobre uma doença como essa, conseguimos fazer com que os atores do setor de saúde entendam melhor e, principalmente, compreendam o sofrimento desses pacientes e de suas famílias. Ao mesmo tempo, é possível avançar nas políticas públicas e nos modelos de centros de referência, por exemplo, e de diagnóstico, para mudar um pouco a jornada dessas famílias. Existem tantas prioridades nos sistemas de saúde e nas políticas públicas, e é sempre muito importante dar voz aos pacientes e às associações de pacientes.

MIT TR BR: Onde se conectam todos esses atores? Estamos falando da voz dos pacientes, das entidades que os representam, da indústria de inovação e dos tomadores de decisão. Onde todos se conectam e como o senhor analisa essa conexão hoje?

Roberto: Nos fóruns de discussão que precisamos criar. Em muitos momentos, temos o próprio governo federal ou as agências trazendo esse tema em modelos de consulta pública ou na preparação de Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas, por exemplo, mas eles seguem sequências que são definidas pelas prioridades do governo. Criar fóruns de discussão, seja em eventos, em audiências no Congresso Nacional ou em audiências gerenciadas pelas agências, permite trabalhar e discutir com mais profundidade os problemas sociais que esse tipo de doença traz. A Associação Brasil Huntington (ABH) fez um mapeamento das famílias que vivem com a doença no Brasil e mostrou que menos de 30% delas têm acesso, por exemplo, à aposentadoria por invalidez. Isso mostra que até mesmo o conhecimento sobre os direitos ainda não é disseminado. Estimular debates abertos em todas as esferas, tanto nos níveis estaduais quanto em Brasília, é primordial.

MIT TR BR: O que o senhor acredita que é hoje o principal obstáculo para ampliar o diagnóstico da Doença de Huntington?

Roberto: Temos vários. No Brasil, há alguns centros de excelência em São Paulo, Minas Gerais, no Sul e alguns no Nordeste. Mas não há uma padronização do cuidado com atenção multidisciplinar para esse paciente. A jornada do paciente com esse tipo de doença é muito longa. Trata-se de uma doença que afeta três níveis principais do indivíduo: os movimentos, que envolvem a coreia que eu comentava, a parte psicossocial e a parte cognitiva. Esse paciente vai migrando de especialidade em especialidade e, até chegar a um centro de referência para a doença — que apenas grandes centros do Brasil possuem para finalizar o diagnóstico —, leva tempo. Precisamos disseminar cada vez mais o conhecimento sobre a doença de Huntington nas diversas regiões do Brasil, seja na área de neurologia ou por meio de médicos especializados em distúrbios do movimento. É necessário um número maior de profissionais que compreendam a doença, para que possamos ampliar o diagnóstico. O mapeamento que citei da ABH mostra que há cerca de mil famílias que apresentam pelo menos um paciente com essa doença, distribuídas em 600 municípios do Brasil. Vemos, portanto, que a doença está muito presente no interior do país, mas, de forma paradoxal, os centros de referência estão localizados nos grandes centros e nas cidades maiores. Esse é o desafio: fazer com que a informação e a assistência cheguem também ao interior.

MIT TR BR: O que seria uma jornada ideal para o paciente com Doença de Huntington e como caminhamos nessa direção?

Roberto: Temos que trabalhar com a conscientização de que a Doença de Huntington é uma doença rara e deve ser colocada como prioridade. Sabemos que há muitas doenças raras, mas essa, pelo número de pessoas que afeta no Brasil e pela ruptura econômica que causa, já que as pessoas param de trabalhar e isso gera um impacto financeiro significativo para as famílias, merece atenção especial. Deveríamos avançar cada vez mais na compreensão e no diagnóstico fora dos grandes centros, nas esferas municipal e estadual, e, a partir daí, trabalhar em protocolos clínicos e em acesso. Não existem medicamentos específicos para o tratamento da doença, mas há terapias que podem melhorar muito a qualidade de vida dos pacientes. O governo deveria criar um modelo multidisciplinar para tratar melhor esses pacientes.

MIT TR BR: Diante desse cenário que o senhor descreve e da atuação da Teva, qual seria o legado para os próximos anos que vocês gostariam de deixar para essa doença?

Roberto: O propósito final de uma companhia farmacêutica é trazer a inovação que transforma totalmente a vida dos pacientes e de seus familiares, mas, principalmente, fazer com que esses medicamentos cheguem até eles. O legado que queremos deixar é o de ter ajudado a tornar essa doença cada vez mais conhecida pela sociedade brasileira e de garantir que os pacientes que precisam de tratamentos capazes de melhorar sua qualidade de vida tenham acesso a eles. Queremos trabalhar com o Ministério da Saúde e com as agências para que isso seja perene. A inovação em Sistema Nervoso Central é uma das áreas mais importantes da Teva, e queremos continuar trazendo medicamentos que possam ajudar na Doença de Huntington e em outras doenças dessa área.

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