Passado, presente e futuro da saúde digital no Brasil
Inovação

Passado, presente e futuro da saúde digital no Brasil

A pandemia de COVID-19 balançou o mercado e fez repensarmos tecnologias e modelos de saúde existentes. Mas afinal, o que está mudando e o que esperar do futuro?

A pandemia de Covid-19 nos mostrou quão vulneráveis são nossos sistemas de saúde, mas também abriu nossas mentes para pensarmos em saúde como algo universal e que necessita um debate mais amplo no uso de tecnologia em diferentes esferas, da prevenção, acompanhamento remoto, até os cuidados hospitalares, por exemplo.

Não somos pacientes somente quando estamos doentes; somos a qualquer hora, em qualquer lugar, por isso é importante pensarmos no cuidado das pessoas de uma maneira mais holística, e é aqui que a tecnologia pode contribuir muito se pensarmos em inovações para saúde e não apenas para doenças, que conectem os diferentes pontos de atenção à saúde, evitando sobrecarregar as últimas etapas do funil, as chamadas atenção secundária e terciária, compostas por serviços de urgência, emergência, ou de alta complexidade e custo.

O passado (e um pouquinho do presente)

Enquanto víamos outros setores se modernizando rapidamente, pautados em trazer melhores experiências para os usuários finais — exemplo simples é o do Nubank combatendo os entraves e burocracias dos bancos tradicionais —, a verdade é que a saúde não se movimentava.

Por muito tempo se falou em modernização e digitalização da saúde, mas a teoria era muito diferente da prática, pois mesmo com as grandes empresas do setor criando suas áreas de inovação, seguíamos tendo experiências muito parecidas com a dos nossos avós: agendamentos por telefone, dificuldade em encontrar informações dos profissionais, muito papel em todos os processos, longas filas antes de um atendimento, etc.

Sempre me perguntei quando isso iria mudar, quando pensaríamos em medicina baseada em valor (focada na qualidade do atendimento e não na quantidade de serviços prestados) e aplicação de tecnologia para apoiar pacientes e profissionais de saúde, mas ano após ano eu errava em minhas apostas.

A mudança veio do inesperado

É fato que a crise gerada pela pandemia, ao sobrecarregar nossas redes de hospitais e criar a necessidade de criar conexões entre profissionais de saúde e pacientes com menos contato físico, fez os diferentes players do mercado saírem da inércia e adotarem mudanças que esperávamos há anos, em especial a famosa digitalização da saúde. Telemedicina, plataformas de prescrição digital e outras soluções saíram de longas discussões sobre seus usos e benefícios para a execução em semanas, e em pouco tempo, o mundo, não só o Brasil, viu um crescimento exponencial do uso dessas tecnologias.

Um bom exemplo foi a da Memed, plataforma de prescrições digitais que viu na pandemia um aumento no uso da sua plataforma não somente por médicos, mas também por farmácias.

Na Doctoralia, maior plataforma de agendamento de consultas do mundo, vimos também um crescimento exponencial no uso da telemedicina, bem como um forte crescimento nos downloads do nosso App para pacientes (Android e iOS), por causa da necessidade de pesquisar profissionais online, tirar dúvidas, etc.

Mas será que o Brasil está preparado para a digitalização da saúde?

Bem, nos meus anos atuando em diversos produtos de saúde, sempre ouço essa pergunta junto com alguns outros questionamentos que, provavelmente, você já fez ou ouviu também:

“Mas no Brasil é diferente…”
“Paciente brasileiro não tem acesso à internet…”
“Isso é uma coisa que funciona na Europa, não aqui…”
“Mas só jovens utilizam, adultos e idosos não vão usar.”

Uso de internet e smartphones

Em uma pesquisa rápida na internet é fácil ver como a população brasileira é uma das mais conectadas do mundo e, segundo o último relatório do PNAD-IBGE de 2018, quase 80% dos domicílios têm acesso à internet. Para se ter uma ideia, essa mesma pesquisa apontou que em 2018, quase 90% das pessoas entrevistadas já fizeram chamadas de voz via internet, isso abre um leque de oportunidades para a área de saúde, o exemplo mais simples é da telemedicina, que falaremos mais adiante. Além disso, a implantação do 5G em um futuro próximo trará altíssima velocidade de conexão, superando em muitas vezes a conexão 4G e trazendo uma infinidade de possibilidades para novas tecnologias que estão por vir.

Perfil dos pacientes digitais

É fake o pensamento que o uso do celular para cuidar da saúde se restringe aos mais jovens. Em uma pesquisa realizada pela Doctoralia com 75.480 entrevistados em 5 países e disponibilizada em exclusividade para os leitores do MIT Technology Review, mais de 49% dos usuários brasileiros que utilizam plataformas digitais para cuidar da saúde têm mais de 35 anos, percentuais muito parecidos com a média global do estudo, que envolveu também entrevistados do México, Espanha, Polônia e Itália.

Outro ponto interessante é que 75% dos participantes da pesquisa são mulheres, que buscam cuidar não apenas de si mesmas, mas também cuidar da saúde da família.

Pensar em tecnologias e serviços para saúde passa por entender profundamente os diferentes perfis de mulheres e como ajudá-las nessa área.

Sobre os que pesquisam online, se engana quem pensa que esse perfil somente procura um profissional de saúde online em um momento de emergência, 47,6% dos entrevistados brasileiros afirmam que a prevenção é o ponto de partida todos os anos para buscar informações online.

Telemedicina é a porta de entrada

A telemedicina já é uma realidade, mas você parou para pensar quanto tempo levou para discutirmos a inserção dessa tecnologia no dia a dia dos profissionais de saúde e pacientes? Foram anos de discussões com poucos avanços sobre a aprovação ou não do seu uso, até que a pandemia pressionou governos a autorizarem às pressas e o resultado é que essa tecnologia se espalhou rapidamente.

Na Doctoralia, vimos um crescimento exponencial no número de agendamentos de consultas de telemedicina no momento da liberação, foram mais de 165 mil consultas e mais de 10 mil médicos nos primeiros três meses. Os pacientes optavam pela telemedicina pela segurança e comodidade, mas o ponto interessante é que mesmo com a liberdade de buscar por profissionais em diferentes cidades, os pacientes seguem buscando profissionais próximos de suas casas, assim em uma eventual necessidade de consultas presenciais, podem seguir com os mesmos profissionais.

Importante ressaltar que saúde e segurança das informações caminham lado a lado, logo não se recomenda o uso de qualquer ferramenta, buscar tecnologias que seguem protocolos de segurança em saúde bem como sejam adaptados para o uso dos profissionais agilizam o trabalho e tornam mais seguro e fácil o uso por pacientes e profissionais.

A verdade é que a telemedicina foi só a ponta do iceberg, um primeiro passo importante, mas que não resolve sozinho outros pontos que precisam ser repensados na saúde. O lado bom é que, antes telemedicina era considerada inovação, hoje é uma commoditie que praticamente todo player de saúde oferece aos seus pacientes, e se não oferece, essa empresa já está largando atrás.

E se engana quem pensa que é uma tecnologia passageira, um bom exemplo é o que passamos aqui na Doctoralia na primeira onda de restrições por conta da pandemia, vimos uma queda de quase 50% nas consultas presenciais, enquanto a telemedicina cresceu, porém quando a primeira onda passou e as consultas presenciais voltaram ao normal, as de telemedicina não sumiram, pelo contrário, ganharam um espaço que até então não existia. Assim como em outros mercados, as pessoas conhecem um novo uso para seus smartphones e tomam gosto por isso, encaram como o novo normal. Veja como exemplo Apps como iFood e Uber, agora que usou, você consegue imaginar sua vida sem eles?

O futuro está mais próximo do que imaginamos…

…e traz consigo muitas oportunidades. Repito a frase do início: é preciso pensar em saúde de maneira mais holística, saúde não envolve só a consulta e o hospital, pois um bom sistema de saúde está conectado à vida das pessoas e atua principalmente na prevenção e acompanhamento delas. E se engana que por termos grandes players nesse mercado, não haja margem para novos entrantes, pois ainda existem muitas oportunidades para serem lapidadas.

Um bom exemplo é um maior envolvimento do RH na saúde do colaborador. Empresas como Gympass entenderam a importância do wellness para prevenção e passaram a atuar fortemente com a área de recursos humanos, oferecendo planos corporativos e que trazem valor para as empresas, que veem uma redução na sinistralidade e reajuste dos planos de saúde, e para o usuário final, que é estimulado a adotar hábitos de vida mais saudáveis, impactando na qualidade de vida e performance no trabalho.

Diferentemente do passado, cada vez menos encontramos desafios tecnológicos que limitam o desenvolvimento de algum produto ou serviço, logo o segredo está em entendermos os principais pontos de dor e fricção do setor de saúde e agirmos nessa dor para avançarmos nas mudanças que o mercado precisa, atuar em simplificar a jornada do paciente ao invés de complicar trará um mercado muito mais sustentável economicamente, com pacientes saudáveis ao invés de doentes.

Mesmo olhando para realidades diferentes, é sempre importante o benchmark com outros setores, que dão indícios de que não há como fugir da digitalização: apps de comida, bancos digitais, apps de imobiliárias são alguns desses exemplos. Tecnologia aplicada em fazer a vida do usuário final mais simples e cómoda, isso traz valor para diversos atores e faz com que rapidamente esqueçamos como era a nossa vida antes desses aplicativos.

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