Os conteúdos mais populares no Facebook deveriam estar no lixo
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Os conteúdos mais populares no Facebook deveriam estar no lixo

O próprio relatório da Meta sobre o que recebe mais cliques confirma o que muitos de nós já sabemos: memes de má qualidade vencem.

A postagem mais visualizada no Facebook no último trimestre foi uma piada sobre a posição 69, com um trecho de um episódio do programa de TV americano Family Feud. A postagem, originalmente um Instagram Reel, teve mais de 52 milhões de visualizações no Facebook, de acordo com o relatório trimestral da Meta sobre o conteúdo mais visto na plataforma nos EUA. Foi apenas uma das muitas republicações de memes duvidosos a aparecer na lista de principais conteúdos na plataforma da Meta. 

Este relatório trimestral, lançado há um ano, foi criado em parte para que a Meta pudesse contar a história que queria contar sobre o Facebook: que seus usuários não são bombardeados constantemente com conteúdo extremista político, como pesquisadores e jornalistas que utilizam o CrowdTangle, uma ferramenta de propriedade da Meta, argumentam. 

Mas, ao tentar fazer isso, acabou demonstrando outra coisa: os conteúdos mais populares no Facebook geralmente são memes reciclados genéricos e horríveis. 

Não é necessariamente surpreendente que a repostagem de memes já populares obtenha visualizações no Facebook, mas “é imperativo monitorar para onde a atenção conquistada por esse conteúdo é direcionada” para capturar tentativas de canalizar essa atenção para fraudes, extremismo e desinformação, diz Karan Lala, membro e editor-chefe do Integrity Institute, uma organização fundada por ex-funcionários da equipe de integridade do Facebook para pesquisar e aconselhar o público sobre o funcionamento interno das plataformas de rede social. Lala publicou recentemente uma pesquisa sobre a economia do spam no Facebook. 

As 20 principais postagens por visualizações no Facebook no relatório mais recente são memes majoritariamente republicados que foram originalmente criados para outras plataformas. Muitas das páginas responsáveis por eles pertencem a contas de conteúdo viral do Instagram com nomes como Ideas365 ou Factsdailyy. Há dois reposts de memes pró-Johnny Depp na lista, com quase 100 milhões de visualizações entre eles. Duas das 20 postagens mais visualizadas não estão listadas no relatório porque a Meta as removeu por violar suas políticas de propriedade intelectual ou comportamento inautêntico. 

A questão principal aqui não é necessariamente de segurança: o conteúdo mais popular no Facebook parece mais uma isca boomer do que algo projetado para atrair o engajamento do público mais jovem que Meta está cortejando. Mas, como observa Lala, contas de memes relativamente benignas e contas potencialmente prejudiciais que estão postando memes para chamar a atenção para algum lugar específico são difíceis de distinguir em um primeiro momento. 

Ideas365 e Factsdailyy parecem semelhantes a princípio: ambas são contas de memes do Instagram obtendo enormes quantidades de visualizações no Facebook. Cada uma delas publica cerca de meia dúzia de vídeos curtos por dia. Seu conteúdo é genérico. Mas olhando mais de perto, Lala notou algumas diferenças importantes: a biografia do Factsdailyy contém informações de contato, e cada postagem credita a fonte do meme que está repostando. À primeira vista, essa conta provavelmente é apenas uma conta normal de memes. 

Em contrapartida, Ideas365, a página que postou o vídeo Family Feud que está no topo da lista de conteúdos mais visualizados do Facebook neste trimestre, direciona o tráfego para um site que vende cursos para ganhar dinheiro vendendo coisas na Amazon. Embora a conta credite a fonte de alguns memes, ela está usando a atenção que esses memes geram para anunciar serviços questionáveis. Seus Stories em destaque anunciam um programa de “orientação” que promete ensinar aos alunos como criar contas automatizadas do Instagram para obter lucro. “O usuário por trás da conta menciona possuir mais de 250 páginas temáticas no Instagram e ganhar ‘centenas de milhares de dólares por mês’ com seu celular. Isso é ressaltado com vídeos ostensivos dos muitos carros de luxo do usuário”, acrescentou Lala. 

Não há nada inerentemente errado em ter uma página de memes de qualidade duvidosa, é claro. O que é errado aqui não é que a conta esteja usando vídeos curtos na Meta para fazer com que as pessoas se inscrevam em um curso caro, diz Lala: “À medida que nos aproximamos da época das eleições, é importante notar que essa atenção pode ser facilmente direcionada para desinformação ou outros danos usando táticas semelhantes”. No ano passado, a MIT Technology Review americana revelou até que ponto as fazendas de conteúdo globais se tornaram adeptas de usar as próprias estruturas de incentivo do Meta para lucrar diretamente com conteúdo popular, sejam memes sobre uma separação de celebridades ou desinformação sobre um assunto polêmico. 

A Meta também fornece dados sobre os links e domínios externos mais visualizados. Neste relatório, cinco dos 20 principais links foram removidos por comportamento inautêntico (o link principal era, sem grandes surpresas, do TikTok). E a lista de domínios mais vistos, talvez a parte deste relatório que foi projetada para rebater mais enfaticamente os argumentos do CrowdTangle, mostrou uma mistura de concorrentes como YouTube e TikTok, sites de notícias populares e GoFundMe. 

“Estamos testando novas maneiras de reduzir o clickbait, isca de engajamento e spams”, disse a Meta em uma postagem no blog que acompanha o relatório. “Enquanto estamos estudando melhorias nesses testes, precisaremos avaliar e refinar continuamente nossa abordagem, considerando como os agentes de spam tentam adaptar suas táticas para evitar nossas novas formas de detectá-los”. 

As plataformas não precisam erradicar completamente o spam para fazer uma diferença significativa nisso, e esperar que a Meta transforme o Facebook em uma zona livre de spam é muito irreal “dado como os atores de spam são incentivados e competitivos”, disse Lala. 

“Não tenho problema com o fato de que o conteúdo de spam existe no Facebook, mas sim que ele consistentemente se torna o conteúdo mais visto na plataforma”, acrescenta. 

Este não é o primeiro relatório a apresentar um mar de postagens spam na lista dos conteúdos mais populares do Facebook. Mas ele novamente evidencia uma tendência nada boa quando aqueles que usam o CrowdTangle para rastrear o impacto do extremismo político, desinformação e polarização no Facebook estão descobrindo como fazer seu trabalho em um mundo sem a ferramenta. De acordo com a Bloomberg, a Meta planeja eventualmente aposentar o CrowdTangle, mas se comprometeu a mantê-lo até as eleições de meio de mandato de 2022 nos EUA. 

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