Microrrobôs médicos que podem viajar dentro do seu corpo (ainda) estão a caminho
HealthHealth Innovation por Einstein

Microrrobôs médicos que podem viajar dentro do seu corpo (ainda) estão a caminho

Microrrobôs liberados no corpo poderiam romper coágulos, administrar medicamentos contra o câncer e até mesmo guiar espermatozoides apáticos até seu objetivo.

O corpo humano é um labirinto de vasos e tubos, cheio de barreiras difíceis de serem atravessadas. Esse fato representa um sério obstáculo para os médicos. Muitas vezes as doenças são causadas por problemas difíceis de visualizar e de acesso ainda mais complicado. Mas imagine se pudéssemos implantar exércitos de pequenos robôs no corpo para fazer trabalhar a nosso favor. Eles poderiam romper coágulos antes inalcançáveis, administrar medicamentos até mesmo nos tumores mais inacessíveis, além de ajudar a orientar os embriões para fecundação. 

Tudo bem, eu sei o que você provavelmente está pensando. Há anos, talvez até décadas, ouvimos falar da utilização de pequenos robôs aplicados na medicina. E isso ainda não é a realidade.  

Onde estão meus microrrobôs médicos? 

Eles estão chegando, afirma Brad Nelson, que trabalha no setor de robótica na ETH Zürich. Em breve. E podem ser um divisor de águas para uma série de doenças graves. Numa perspectiva publicada na Science, Nelson e o seu coautor, Salvador Pané, argumentam que estas pequenas máquinas poderiam ajudar a fornecer medicamentos exatamente onde são necessários. Isso ajudaria a minimizar a toxicidade. “Assim, podemos usar doses mais fortes e talvez possamos repensar a forma como tratamos algumas dessas doenças”, comenta Nelson. 

O que faz com que Nelson seja otimista para o fato de que essas tecnologias estão prestes a chegar até nós? Alguns desses robôs saíram da bancada do laboratório e foram parar em animais de grande porte, incluindo porcos. Hoje existem pelo menos quatro startups trabalhando em microrrobôs médicos que poderiam viajar “sem amarras” dentro do corpo. Um deles, o Bionaut, arrecadou US$ 43 milhões no início deste ano para levar seu processo de tratamento à primeira fase de testes. O dinheiro será usado para desenvolver dispositivos do tamanho da ponta de um lápis, projetados para administrar medicamentos no local dos tumores cerebrais de glioma e perfurar cistos que bloqueiam o fluxo do líquido espinhal no cérebro, um sintoma de um distúrbio infantil raro chamado Síndrome de Dandy-Walker. 

“Microrrobô” é um termo abrangente que compreende desde robôs que variam em tamanho de um mícron (cerca de 100º da largura de um fio de cabelo humano) até alguns milímetros em escala. Se o robô for realmente minúsculo, menor que um mícron, é um nanorrobô. E embora possa ser atraente dizer “microrrobô” porque soa muito legal, esse é “um termo mais parecido com Hollywood”, segundo Nelson. 

Os microrrobôs podem ser compostos de materiais sintéticos, materiais biológicos (chamados de robôs biológicos ou biobots) ou ambos (robôs biohíbridos). Muitos deles, inclusive os que Nelson está desenvolvendo, se movem graças a ímãs. 

Mas outros podem se mover por conta própria. Na semana passada, uma equipe de pesquisadores de Tufts e Harvard relatou que havia transformado células traqueais em biorrobôs. A traqueia humana possui cílios ondulantes em seu interior para capturar micróbios e detritos. Mas esses pesquisadores encorajaram as células traqueais a formar um organoide com os cílios do lado de fora. Dependendo do formato e da cobertura dos cílios, os robôs podem viajar em linha reta, fazer círculos ou se mexer. E – uma reviravolta surpreendente – quando os pesquisadores rasparam uma haste de metal sobre uma camada de neurônios vivos crescendo em um prato, os biorrobôs invadiram a área e desencadearam o crescimento de novos neurônios. “É fascinante e completamente inesperado que células traqueais normais de pacientes, sem modificar seu DNA, possam se mover por conta própria e estimular o crescimento de neurônios em uma região danificada”, disse Michael Levin, engenheiro da Tufts que liderou o trabalho, em comunicado à imprensa. “Agora estamos analisando como funciona o mecanismo de cura e perguntando o que mais essas construções podem fazer.” 

A utilidade potencial destes microrrobôs é vasta. “Muitas pessoas estão pensando em doenças vasculares”, afirma Nelson. Microrrobôs poderiam ser injetados e dissolver coágulos sanguíneos no cérebro para tratar pacientes com AVC. Ou poderiam reforçar pontos fracos em vasos cerebrais para evitar que os mesmos rompam. Eles poderiam entregar drogas em locais específicos. E há casos de aplicações ainda mais estranhas. Pesquisadores da Universidade da Pensilvânia desenvolveram robôs que esperam que um dia possam substituir sua escova de dentes. 

Outras equipes estão trabalhando em robôs que imitam — ou são feitos de — esperma. Os pesquisadores desenvolveram esperma de touro coberto por nanopartículas de ferro, chamadas IRONSperm, que viajam com a ajuda de um campo magnético rotativo; a esperança é que eles possam ser usados para distribuição direcionada de medicamentos. Uma equipe da Alemanha está trabalhando em microrrobôs que ajudam na fertilização, entregando espermatozoides que nadam fracamente ao óvulo. Seu sistema até libera drogas para quebrar a camada dura do óvulo. Esse mesmo grupo também descreveu recentemente como os microrrobôs podem ser usados na fertilização in vitro. Num procedimento típico de fertilização in vitro, um óvulo é fertilizado fora do corpo e o embrião resultante é transferido para o útero. O procedimento geralmente falha. Porém, se os microrrobôs conseguissem transportar o embrião de volta à trompa de Falópio ou ao endométrio, o embrião poderia desenvolver-se em condições mais naturais, o que poderia melhorar as taxas de implantação. Eles imaginam microrrobôs guiados por campos magnéticos que poderiam agarrar ou carregar um embrião, liberá-lo e depois degradar-se naturalmente. 

Ainda assim, existem alguns obstáculos substanciais que as empresas terão de superar para utilizar esses robôs em humanos. Alguns são técnicos. “São sistemas muito pequenos”, afirma Victoria Webster-Wood, engenheira mecânica da Universidade Carnegie Mellon, que desenvolve robôs biohíbridos. E, por causa disso, um fluido corporal como o sangue é, na verdade, relativamente viscoso. “Portanto, se o fluxo estiver se movendo muito rápido, será difícil para o robô seguir na outra direção”, comenta. 

Outros obstáculos são regulatórios. Os microrrobôs são qualificados como dispositivos médicos, mas também podem distribuir medicamentos. “Você tem o que chamamos de combinação droga-dispositivo”, diz Nelson. “Embora a droga possa ser bem conhecida, esperamos que sua concentração seja significativamente diferente do normal.” Isso pode significar que os reguladores vão querer analisar estudos adicionais. 

Webster-Wood trabalha na área há anos e está entusiasmada com o fato dos microrrobôs finalmente estarem chamando a atenção. “Mesmo nos últimos 10 anos, essa questão cresceu muito”, comenta. “Acho que há muito mais potencial do que podemos traduzir nesse momento.” 

Mais sobre microrrobôs no arquivo da Tech Review 

Há anos que pensamos em microrrobôs e robôs médicos. Em 2011, Kristina Grifantini abordou o que era então um dos enigmas centrais: como controlá-los. 

No início deste ano, Antonio Regalado relatou os primeiros bebês concebidos com robôs e as startups que trabalham para automatizar a fertilização in vitro. Estes não eram microrrobôs e o objetivo era principalmente alcançar uma escala. “O principal objetivo de automatizar a fertilização in vitro, dizem os empresários, é simples: é fazer muito mais bebês.” 

Victoria Webster-Wood, que produz robôs biohíbridos, e Renee Zhao, que fabrica robôs médicos em escala milimétrica, entraram na lista dos 35 inovadores com menos de 35 anos da Tech Review deste ano. 

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