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Em meados de janeiro, um incêndio ocorreu na usina de energia Moss Landing, na Califórnia, o maior conjunto de baterias conectadas à rede elétrica do mundo. Embora as chamas tenham sido apagadas em poucos dias, a “fumaça” metafórica ainda está se dissipando.
Alguns moradores da região relataram problemas de saúde que, segundo eles, estão relacionados ao incêndio, e alguns testes ambientais detectaram poluentes na água e no solo perto do local afetado. Um grupo entrou com um processo contra a empresa proprietária da instalação.
Após incêndios de grande repercussão como o de Moss Landing, é compreensível que haja preocupações sobre a segurança das baterias. Ao mesmo tempo, à medida que mais fontes variadas de eletricidade variáveis, como eólica e solar, entram em operação, grandes instalações de armazenamento de energia se tornam ainda mais essenciais para a rede elétrica.
Vamos analisar o que aconteceu nesse incêndio, quais preocupações permanecem e o que vem a seguir para a indústria de armazenamento de energia.
O incêndio em Moss Landing foi detectado na tarde do dia 16 de janeiro, segundo relatos da imprensa local. Começou pequeno, mas rapidamente se espalhou por uma grande parte das baterias da usina. Mais de 1.000 moradores foram evacuados, estradas próximas foram fechadas e um alerta de emergência mais amplo orientou os residentes a permanecerem em casa.
O fogo atingiu o grupo mais antigo de baterias instaladas em Moss Landing, um conjunto de 300 megawatts que entrou em operação em 2020. Outras instalações adicionais elevam a capacidade total do local para cerca de 750 megawatts, o que significa que a usina pode fornecer à rede elétrica uma quantidade de energia semelhante à de uma usina a carvão convencional, por algumas horas.
De acordo com um comunicado da Vistra Energy, empresa proprietária da instalação, ao New York Times, a maior parte das baterias dentro do prédio afetado (onde fica o conjunto de 300 MW) foi consumida pelo fogo. No entanto, a empresa ainda não possui um balanço exato, pois as equipes ainda estão proibidas de entrar no local para uma inspeção visual.
Esse não foi o primeiro incêndio envolvendo baterias em Moss Landing—a usina já registrou vários incidentes desde sua inauguração. No entanto, este evento foi “muito mais significativo” do que os anteriores, afirma Dustin Mulvaney, professor de estudos ambientais da Universidade Estadual de San Jose, que pesquisou a usina.
Os moradores estão preocupados com as possíveis consequências. A Agência de Proteção Ambiental dos EUA (EPA) monitorou o ar próximo à usina em busca de fluoreto de hidrogênio, um gás tóxico que pode ser liberado em incêndios de baterias de íons de lítio, mas não encontrou níveis acima dos padrões da Califórnia. No entanto, alguns testes preliminares detectaram níveis elevados de metais como cobalto, níquel, cobre e manganês no solo ao redor da usina. Também foram encontrados metais na água potável da região, embora em concentrações consideradas seguras.
Com base nesses testes, um grupo de moradores entrou com um processo contra a Vistra na primeira semana de fevereiro, alegando que a empresa (junto com outros réus citados) falhou em implementar medidas de segurança adequadas, apesar dos incidentes anteriores na instalação. A equipe jurídica do processo inclui Erin Brockovich, ativista famosa por seu trabalho nos anos 1990 contra a Pacific Gas & Electric Company, envolvendo contaminação de lençóis freáticos por equipamentos de petróleo e gás na Califórnia.
O processo judicial, e especialmente o envolvimento de Brockovich, levanta um ponto que considero importante destacar: as tecnologias que nos ajudam a enfrentar as mudanças climáticas ainda podem causar danos, e levar isso a sério é essencial.
A indústria de petróleo e gás tem um longo histórico de degradação ambiental e de colocar pessoas em risco. Isso é evidente tanto em acidentes locais quanto na poluição de longo prazo, além do fato de que a queima de combustíveis fósseis impulsiona as mudanças climáticas, com impactos globais significativos.
Fontes de energia de baixa emissão de carbono, como eólica, solar e baterias, não contribuem para o problema global das mudanças climáticas. No entanto, muitos desses projetos são instalações industriais, e seus efeitos ainda podem ser sentidos pelas comunidades locais — especialmente quando algo dá errado, como no incêndio de Moss Landing.
A questão agora é se essas preocupações e processos judiciais afetarão a indústria de forma mais ampla. Em uma coletiva de imprensa, um representante local chamou o incêndio de “um evento Three Mile Island para essa indústria”, referindo-se ao infame acidente nuclear de 1979 na usina da Pensilvânia. Esse evento marcou um ponto de virada para a energia nuclear, levando a uma queda acentuada no apoio público.
Com o crescimento do número de veículos elétricos e baterias para armazenamento de energia na rede, incêndios de grande repercussão têm se tornado notícia com mais frequência. Entre os casos recentes estão o incêndio de um caminhão em Los Angeles, a onda de incêndios de baterias de e-bikes em Nova York e um incêndio ocorrido em uma planta de reciclagem na França no ano passado.
“Sistemas de armazenamento de energia em baterias são máquinas complexas”, diz Mulvaney. “Sistemas complexos têm muitas possibilidades de falha.”
Quando se trata de grandes instalações conectadas à rede elétrica, a segurança das baterias já melhorou desde que Moss Landing foi construída em 2020, conforme aponta Julian Spector, da Canary Media, em um artigo recente. Uma das razões é que muitas instalações mais novas utilizam uma química diferente, considerada mais segura. Além disso, novos sistemas de armazenamento de energia geralmente isolam melhor as baterias, evitando que incêndios pequenos se espalhem tão rapidamente como aconteceu nesse caso.
Ainda há muito que não sabemos sobre esse incêndio, principalmente sobre como ele começou. Aprender com os resultados das investigações em andamento será fundamental, pois é inevitável que mais baterias sejam adicionadas à rede elétrica nos próximos anos.
Em 2023, havia aproximadamente 54 gigawatts de baterias em escala de utilidade conectadas à rede globalmente. Se os países seguirem seus planos anunciados para fontes renováveis, esse número poderá crescer dez vezes até o final da década.
O armazenamento de energia é uma ferramenta essencial para transformar nossa rede elétrica e atingir nossas metas climáticas, e a indústria está avançando rapidamente. As medidas de segurança precisam acompanhar esse ritmo.