Com IA, é possível medir até o que não se vê
Inteligência artificial

Com IA, é possível medir até o que não se vê

Como o marketing tem utilizado a ciência de dados para priorizar investimentos entre canais além dos cliques.

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Os cliques são fáceis de medir, basta ter uma boa ferramenta. Porém, se antes do clique, um consumidor visualizou diversos anúncios (até mesmo off-line), mas não clicou neles, é importante atribuir a esses anúncios uma participação pela venda final. Só assim é possível avaliar e priorizar os canais adequadamente.

Quando, nos anos 2000, as empresas começaram a investir mais em comunicação digital e vendas on-line, um dos maiores benefícios percebidos foi a capacidade de medir praticamente tudo: cliques, tempo das pessoas nas páginas, sites, etc.

Mas, com o tempo, essa facilidade encontrou desafios pelo caminho. Graças às regras de proteção de privacidade, foram reduzidos os mecanismos de coleta, como os cookies (códigos que ficam guardados no navegador das pessoas, marcando seu comportamento).

Hoje, há lugares onde cookies ainda são utilizados, lugares onde eventos (como cliques) podem ser coletados (com consentimento dos usuários) e lugares onde nenhum destes é possível, tanto nos meios digitais como não digitais – TV, por exemplo.

Ou seja, são heterogêneas a coleta e a informação.

Soma-se a isso a dinâmica de marketing em que há campanhas, promoções, ofertas e datas comemorativas acontecendo o tempo todo, tanto nas marcas próprias como nos concorrentes.

E ainda há a natural velocidade da tecnologia: o TikTok não era grande poucos anos atrás, ninguém falava na rede social BlueSky, o Clubhouse chegou e saiu, entre tantos outros.

Como as marcas enfrentam este desafio

Em recente conversa, a diretora de marketing de uma grande marca de produto de consumo com plataforma de e-commerce (aplicativo de entrega próprio) explicou em quatro frases o desafio comum de muitos marqueteiros:

“Nós atuamos no topo (awareness), meio e fundo de funil (performance). Fazemos campanhas contínuas (always-on) e temáticas de marca, como fizemos no Dia das Mães, Namorados e sazonais. Para cada uma delas, temos promoções e ofertas diferentes.”

“Quando vou medir, consigo até falar que as campanhas foram eficientes diante do passado de custo por aquisição ou conversão. Porém, são tantas coisas que mudamos ao mesmo tempo, que é impossível dizer que uma foi melhor que a outra por causa do canal, da oferta, da cor do banner, da economia do país etc.”

“A gente procura eficiências isoladas – nos veículos de mídia, por exemplo –, mas não consegue otimizar pela combinação entre elas. É fato que campanhas brilhantes na TV vão levar mais pessoas para a busca na web, mas é impossível atribuir vendas à exibição na TV, já que as pessoas não clicam no anúncio na tela da TV. ”

O dilema da máquina de pegar bichos de pelúcia

As famosas “toy machines” são caixas com uma garra no alto, que a pessoa manobra pelo controle remoto até que ela desça para tentar agarrar um bicho de pelúcia.

O bicho muitas vezes não sai da caixa, porque sua perna estava presa em outro bicho, estava apertado demais ou caiu de um lado para o outro, entre outros motivos. Em resumo, nem tudo é culpa do bichinho. O lugar onde ele está também é resultado da ação dos bichos que estão ao lado. Um empurra-empurra.

A mesma lógica serve para qualquer campanha de marketing: uma mídia de awareness (exemplo vídeo no YouTube) influencia as pessoas que, em sua jornada de compra, terão mais chances de clicar no próximo formato de anúncio – que pode ser um link patrocinado após uma busca pelo produto.

Se a campanha de awareness for desligada, a força desse bichinho de pelúcia na ação de busca será reduzida. A pessoa responsável por gerenciar as campanhas de busca verá seus resultados piorarem, sem entender o motivo.

A mente humana não consegue lidar com tantas variáveis

Na Figura 1 (Zoom Out – Campanhas de Marketing), uma parte do desafio do marqueteiro aparece em diferentes canais – desde os digitais, em que é possível medir o clique, passando pelos digitais, em que o clique pode ser medido, mas não é objetivo, até os tradicionais.

Figura 1 (Zoom Out – Campanhas de Marketing)

Conforme este exemplo, é fácil perceber que fica impossível para uma pessoa comum medir o real impacto de cada canal nas vendas, uma vez que colaboraram em conjunto com objetivos e formas de medir suas “pegadas” de maneiras diferentes.

O desapego às migalhas de pão

Para os profissionais que querem saber “como medir se um usuário viu um anúncio da TV”, a resposta não está em tentar rastrear cada passo ou clique, mas em recorrer a técnicas estatísticas, especialmente regressão e modelos de atribuição.

Modelos de atribuição avaliam o impacto de cada canal e investimento nas vendas, analisando relações complexas entre entradas (canais de comunicação e investimentos) e saídas (resultados, como vendas). Isso é feito aplicando regressões múltiplas, uma técnica estatística que permite comparar variáveis e identificar quais fatores mais influenciam as vendas. Esses modelos conseguem mensurar a contribuição entre os canais digitais (mídia, mudanças no site, CRM etc.) e off-line, como TV e mídia impressa.

É assim que se constrói o algoritmo: fórmulas e regras que explicam as correlações entre entradas (canais e investimentos) e saídas (vendas), independentemente da medição do clique.

No mercado, podem ser encontrados modelos com nomes, como RBA (Regression-Based Attribution – ou atribuição baseada em regressão), que é voltado apenas para canais digitais, assim como o MMM (Marketing Mix Modeling), que inclui canais on-line e off-line.

Aplicação em Telecom

Segundo Fabio Mori – Diretor de Vendas e Operações de Martech B2B e B2C, “No setor de telecomunicações, em que a jornada é complexa e multicanal, os modelos de atribuição dão clareza para otimizar investimentos e melhorar a experiência do cliente de maneira estratégica e precisa”.

No exemplo da imagem a seguir (Figura 2 – Atribuição Exemplo), com números e nomes ajustados para divulgação, é possível ver que um determinado canal de vídeos corresponde a 24% do investimento de marketing, porém apenas a 21% das vendas atribuídas (após modelo de atribuição aplicado).

Do lado direito, a “mídia briefing” é a recomendação de ajustes. Neste exemplo, houve uma redução de 14,8% no investimento no canal de vídeos, acréscimo de 26,8% no canal de banners, entre outros.

Com este novo “mix”, espera-se um acréscimo de 16% nas vendas.

Figura 2 – Atribuição Exemplo

Começar pelo digital

Uma das primeiras decisões a se tomar no início de um projeto de atribuição é a estratégia de escolha do modelo. E o maior erro é começar pela tecnologia.

Em campanhas e negócios multicanais (on-line e off-line), recomenda-se priorizar a aplicação nos canais digitais, pois é mais fácil e rápido ajustar investimentos, canais e formatos digitais em comparação aos canais off-line, que dependem de negociações com antecedência e possuem formatos fixos sem possibilidade de mudanças.

Ao começar a respirar os benefícios da atribuição em canais digitais, a empresa terá oportunidades de retorno rápidas. Novos canais são posteriormente adicionados, como lojas, eventos, ajustes no site, TV, etc. No gráfico a seguir, isso é chamado de “abrangência de atributos”.

Heitor Miranda, diretor de Engenharia da Koro Martech, defende a adoção a partir de uma afirmação sobre a tríade: “A adoção de uma abordagem de atribuição em três etapas permite decisões de marketing mais estratégicas e eficazes: começando com o MTA (atribuição multi-touch), para decisões ágeis e insights táticos, evoluindo para modelos de inferência, que ampliam a compreensão sobre comportamento e valor do cliente, e, finalmente, chegando ao MMM, que integra variáveis macroeconômicas e otimiza o retorno total dos investimentos. Esse framework progressivo transforma dados em insights acionáveis, impulsionando o crescimento sustentável”.

Como confiar?

Heitor completa ainda com a visão sobre confiança e coragem para aplicar os modelos na prática. Segundo ele, a diversidade de modelos competindo entre si é essencial para fortalecer a segurança no modelo estatístico que orientará a distribuição dos investimentos. “Comparamos abordagens distintas para assegurar que as alocações sejam fundamentadas e precisas, maximizando o retorno a

Figura 3 – Abrangência de Atributos (ou canais)

o mesmo tempo em que respeitamos a complexidade do comportamento dos consumidores.”

Próximo passo: experimentos

Pietro Cittadino é gerente sênior de Growth e Monetização da VIVO. Na visão dele, os modelos de atribuição, principalmente os digitais, “dão agilidade na tomada de decisão, possibilitando que agências e mesas de performance possam experimentar novas distribuições de investimento com segurança”.

O comentário acima é muito importante: estudos como saturação de canais e desenhos de experimentos ajudam na tomada de decisões. Afinal, se um veículo recebe uma recomendação de investimento superior ao impacto que ele pode suportar (de acordo com inventário e atenção), não se pode extrapolar. Isso vale sobre fazer ajustes sem a previsão de como medir as mudanças com o tempo.

Respeito à privacidade

Dessa forma, sem a necessidade de medir freneticamente as interações individuais das pessoas com tudo o que veem — desde anúncios na TV até fachadas de lojas e outras coisas impraticáveis —, a estatística, integrada a algoritmos para oferecer rapidez, torna-se a mais nova aliada da eficiência no marketing.

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