Em agosto deste ano, celebramos um aniversário especial. Faz 100 anos que a EEG (eletroencefalografia) foi usada pela primeira vez para medir a atividade elétrica no cérebro humano. Essa descoberta foi revolucionária. Entre outras coisas, ajudou a entender que a epilepsia é um distúrbio neurológico, em vez de uma característica de personalidade (sim, realmente se acreditava nisso antes).
Os fundamentos da EEG pouco mudaram ao longo do último século—cientistas e médicos ainda colocam eletrodos na cabeça das pessoas para tentar descobrir o que está acontecendo dentro de seus cérebros. No entanto, agora conseguimos fazer muito mais com as informações coletadas.
Com a EEG, aprendemos mais sobre como pensamos, lembramos e resolvemos problemas. A EEG tem sido usada para diagnosticar distúrbios cerebrais e auditivos, explorar o nível de consciência de uma pessoa e até permitir que pessoas controlem dispositivos, como computadores, cadeiras de rodas e drones.
Mas um aniversário também é uma boa oportunidade para refletir sobre o futuro. Talvez você tenha notado que meus colegas e eu estamos atualmente comemorando os 125 anos da MIT Technology Review, ponderando sobre as tecnologias que os próximos 125 anos poderão trazer. O que será que a EEG nos permitirá fazer daqui a 100 anos?
Primeiro, uma visão geral rápida sobre o que é a EEG e como ela funciona. A EEG envolve a colocação de eletrodos na parte superior da cabeça, coletando sinais elétricos das ondas cerebrais e enviando-os para um computador para análise. Os dispositivos atuais frequentemente se assemelham a toucas de natação. Eles são muito mais baratos em comparação com outras tecnologias de imagem cerebral, como os scanners de fMRI, além de serem bastante compactos e portáteis.
A primeira pessoa a utilizar a EEG em seres humanos foi Hans Berger, um psiquiatra alemão fascinado pela ideia de telepatia. Berger desenvolveu a EEG como uma ferramenta para medir a “energia psíquica” e conduziu suas primeiras pesquisas—muitas delas em seu filho adolescente—em segredo, segundo Faisal Mushtaq, neurocientista cognitivo da Universidade de Leeds, no Reino Unido. Berger foi, e ainda é, uma figura controversa, devido a suas ligações ambíguas com o regime nazista, segundo Mushtaq.
Contudo, a EEG conquistou o mundo da neurociência. Tornou-se uma ferramenta essencial em laboratórios de neurociência, onde pode ser utilizada em pessoas de todas as idades, inclusive em recém-nascidos. Neurocientistas utilizam a EEG para investigar como os bebês aprendem e pensam, e até o que os faz rir. Em minhas próprias reportagens, já cobri o uso da EEG para entender o fenômeno do sonho lúcido, revelar como nossas memórias são organizadas durante o sono e permitir que pessoas liguem a TV apenas com o pensamento.
A EEG também pode servir como um portal para a mente de pessoas que, de outra forma, não conseguiriam se comunicar. Ela tem sido usada para identificar sinais de consciência em pessoas com síndrome de vigília não responsiva (anteriormente chamada de “estado vegetativo”). A tecnologia também permitiu que pessoas paralisadas pela esclerose lateral amiotrófica (ELA) se comunicassem por meio do pensamento e dissessem a seus familiares que estão felizes. Mushtaq, com Pedro Valdes-Sosa, da Universidade de Ciência e Tecnologia Eletrônica da China, em Chengdu, e seus colegas, levantaram essa questão para 500 profissionais que trabalham com EEG, incluindo neurocientistas, neurofisiologistas clínicos e neurocirurgiões. Especificamente, com a ajuda do ChatGPT, a equipe gerou uma lista de previsões, que variavam do muito provável ao ligeiramente fantasioso. Cada um dos 500 entrevistados foi convidado a estimar quando, e se, cada previsão poderia se tornar realidade.
Segundo os participantes, os avanços mais próximos serão na análise do sono. A EEG já é usada para diagnosticar e monitorar distúrbios do sono, mas isso deve se tornar prática rotineira na próxima década. A EEG para consumidores também deve se popularizar em breve, dando a muitos a oportunidade de entender melhor sua própria atividade cerebral e como ela se relaciona com seu bem-estar. “Talvez esteja integrada em algo como um boné de beisebol que você usa enquanto anda por aí, e que se conecta ao seu smartphone,” diz Mushtaq. Bonés de EEG como esses já foram testados em funcionários na China, por exemplo, para monitorar a fadiga de motoristas de caminhão e trabalhadores de minas.
Por ora, a comunicação via EEG é limitada ao ambiente de laboratório ou hospitalar, onde os estudos se concentram no potencial da tecnologia para ajudar pessoas paralisadas ou com distúrbios de consciência. Mas isso deve mudar nos próximos anos, à medida que mais ensaios clínicos forem concluídos. Os entrevistados acreditam que a EEG poderá se tornar uma ferramenta principal de comunicação para indivíduos como esses nos próximos 20 anos.
Na outra ponta do espectro está o que Mushtaq chama de aplicação “mais fantasiosa”—a ideia de usar a EEG para ler pensamentos, memórias e até sonhos das pessoas. Mushtaq considera essa uma previsão “relativamente louca”—algo ainda muito, muito distante, considerando que ainda não temos um entendimento claro de como e onde nossas memórias são formadas. Mas não é completamente ficção científica, e alguns entrevistados preveem que a tecnologia poderá estar entre nós em cerca de 60 anos.
A inteligência artificial provavelmente ajudará os neurocientistas a extrair mais informações das gravações de EEG, identificando padrões ocultos na atividade cerebral. Ela já está sendo usada, por exemplo, para transformar pensamentos de uma pessoa em palavras escritas, embora com precisão limitada. “Estamos à beira de uma revolução da IA,” afirma Mushtaq.
Esses tipos de avanços levantam questões sobre o direito à privacidade mental e como proteger nossos pensamentos. Conversei sobre isso no ano passado com Nita Farahany, futurista e especialista em ética jurídica da Universidade Duke, em Durham, na Carolina do Norte. Ela me disse que, embora os dados cerebrais em si não sejam pensamentos, podem ser usados para inferir o que uma pessoa está pensando ou sentindo. “A única pessoa que tem acesso aos seus dados cerebrais neste momento é você, e eles são analisados apenas pelo software interno da sua mente,” disse ela. “Mas assim que você coloca um dispositivo na cabeça… você está imediatamente compartilhando esses dados com quem fabricou o dispositivo e com quem oferece a plataforma.”
Valdes-Sosa está otimista em relação ao futuro da EEG. Seu baixo custo, portabilidade e facilidade de uso tornam a tecnologia uma candidata ideal para uso em países pobres, com recursos limitados, segundo ele; ele a utiliza em suas pesquisas desde 1969. (Você pode ver como era seu equipamento em 1970 na imagem abaixo!) A EEG deveria ser usada para monitorar e melhorar a saúde cerebral em todo o mundo, ele diz: “É difícil… mas acho que pode acontecer no futuro.”
—