Em um contexto de aceleradas mudanças, a flexibilidade cognitiva tem sido cada vez mais valorizada como uma competência essencial para enfrentar os desafios do trabalho e da vida em geral. Não é por acaso que está no ranking das 10 mais importantes competências segundo o Fórum Econômico Mundial. Este tema também tem sido objeto de estudo em várias áreas do conhecimento humano, pois é transversal a outras competências, como a neurociência, a tecnologia, a psicologia e a gestão, já que o novo mundo do trabalho exige profissionais cada vez mais flexíveis e adaptativos para criar modelos de gestão e imprimir maior agilidade na tomada de decisão.
Apesar de algumas variações dependendo da literatura pesquisada, a flexibilidade cognitiva aqui será tratada como “uma função executiva crítica que pode ser amplamente definida como a capacidade de adaptar comportamentos em resposta a mudanças no ambiente.” Refere-se à capacidade de alternar entre pensar em dois conceitos diferentes ou pensar em vários conceitos simultaneamente, o que, em outras palavras, significa estimular pensamentos mais inclusivos, pensar mais no “E” e menos no “OU” (ou isto ou aquilo, exclui uma das possibilidades), condição fundamental para a inclusão da diversidade em todas as suas dimensões.
Já que um tema presente em todas as pautas estratégicas das organizações é o desafio de criar e consolidar uma cultura mais inclusiva, o que depende essencialmente de trabalhar a flexibilidade cognitiva para a percepção, aceitação e inclusão do diverso, pois nossos vieses inconscientes precisam ser trabalhados.
Com os avanços da tecnologia aplicada à área da saúde, hoje já é possível saber, por meio de ressonância magnética funcional, que regiões específicas do cérebro humano, incluindo os córtices pré-frontal, cingulado anterior e parietal posterior, e os gânglios da base, são ativadas quando uma pessoa se envolve em procedimentos de troca de tarefas que requerem flexibilidade cognitiva. Também já se identificou que a flexibilidade cognitiva diminui com aumento da idade e muitas vezes resulta na incapacidade de se adaptar a novas situações e ambientes, como nota-se em alguns quadros de doenças mentais degenerativas, como o Alzheimer.
Não há dúvidas da forte correlação entre flexibilidade cognitiva e inteligência, porque se a inteligência humana se refere à capacidade da pessoa processar informações, aprender, raciocinar, resolver problemas e adaptar-se a novas situações, logo, a flexibilidade é uma das habilidades cognitivas envolvidas na inteligência natural, já que a memória, o pensamento lógico e até as habilidades sociais contribuem para o desempenho da inteligência humana.
Mas, qual a relação com a Inteligência Artificial?
Em meio a tantas polêmicas sobre as implicações do ChatGPT, seria interessante saber se a opinião do próprio sobre a relação da flexibilidade cognitiva com a Inteligência Artificial está alinhada com as ideias da autora. Segundo o ChatGPT, a “IA envolve sistemas computacionais que são capazes de realizar tarefas que exigem normalmente inteligência humana, como processamento de linguagem natural, reconhecimento de padrões e tomadas de decisões (…) Os sistemas de IA podem analisar grande número de dados de forma rápida e eficiente, em tempo real, identificando padrões e relações que os humanos não podem perceber”.
Isso pode ajudar a ampliar a perspectiva de uma pessoa, permitindo que ela veja diferentes abordagens e soluções para um problema, assim sendo, a IA pode contribuir com o desenvolvimento da flexibilidade cognitiva, ainda que alguns neurocientistas temam certos riscos. Ao mesmo tempo, a flexibilidade cognitiva é um atributo essencial para o desenvolvimento e a aplicação eficaz da IA permitindo que os profissionais da área encontrem soluções inovadoras para desafios complexos, diminuindo riscos de enviesamentos.
A importância da flexibilidade cognitiva para solução de problemas e tomada de decisão é explícita na própria definição, pois permite pensar “fora da caixa”, abertura para ideias diferentes, gestão compartilhada, entre outros. Mas sua importância vai muito além quando pensamos em termos de soft skills. Pois o oposto da flexibilidade cognitiva é a rigidez, o radicalismo, a teimosia. O que não pode ser confundido com firmeza, pois a esta tem mais relação com a clareza de posicionamento, com a convicção de suas crenças e valores, do que com a falta de abertura para ideias diferentes e com a crença em verdades absolutas
Outra competência muito valorizada nos dias de hoje é a empatia, que também depende de flexibilidade cognitiva, afinal, como compreender a perspectiva do outro, se não consegue pensar além da sua própria? E sem isto não há preocupação com experiencia do colaborador, do cliente ou do usuário. O exercício da ferramenta — mapa de empatia – demonstra claramente isso: pensar no que o outro pensa, ouve, vê, fala, nas suas dores etc., exige muita flexibilidade cognitiva.
Outra evidência sobre a aplicação da flexibilidade cognitiva é que ela aumenta a resiliência, fazendo com que o indivíduo enfrente adequada e positivamente as adversidades, gerando maior adaptabilidade, maior tolerância para erros e mudanças de percursos no meio de uma tarefa do dia a dia profissional ou pessoal, maior facilidade para criar soluções alternativas para um problema (como por exemplo, os próprios desafios com o uso da tecnologia) ou tarefa a ser realizada e melhoria da capacidade de encarar um problema ou situação a partir de diferentes perspectivas, o que resulta em relacionamento mais construtivos e melhoria da qualidade de vida.
Uma das formas de melhorar a flexibilidade cognitiva é o desenvolvimento do autoconhecimento, bem como a capacidade de reaprender, reconhecer emoções, pensamentos e intenções do outro, que pode ser desenvolvido por diferentes métodos. Um deles, a terapia cognitiva comportamental, consiste em reavaliar e substituir pensamentos disfuncionais por ideias novas, mais realistas ou úteis. Na medida em que isso é feito, ativa a flexibilidade cognitiva e a pessoa tende a identificar padrões de pensamentos alternativos e fazer ajustes onde for necessário.
Estudos sobre meditação ou intervenções baseadas na atenção plena, como mindfulness, demonstraram ter efeitos benéficos no treinamento integrativo corpo-mente, aumentando o autoconhecimento e impactando na saúde, no bem-estar e em vários distúrbios clínicos, incluindo ansiedade, depressão, vícios, sintomas relacionados ao estresse e dor crônica.
Os pesquisadores confirmaram que a flexibilidade cognitiva está relacionada ao desempenho acadêmico, à capacidade cognitiva e ao desenvolvimento da criatividade dos alunos. Estudos anteriores descobriram que indivíduos com alta flexibilidade têm melhor desempenho em tarefas baseadas em regras. Pesquisas futuras devem explorar o processo interno de diferenças de aprendizado entre alunos de alta e baixa flexibilidade usando outras tecnologias em vários modos. Ter literacia digital requer mais do que apenas a capacidade de usar software ou operar um dispositivo digital, inclui uma grande variedade de habilidades complexas, como cognitivas, motoras, sociológicas e habilidades emocionais que os usuários precisam dominar para operar em ambientes digitais de forma eficaz.
A IA também tem sido utilizada para criar sistemas de aprendizado adaptativo, nos quais os algoritmos de IA se ajustam automaticamente com base no desempenho e nas necessidades individuais do usuário. Esses sistemas podem personalizar a experiência de aprendizado, fornecer materiais e desafios qualificados ao nível de habilidade e às motivações de cada pessoa, estimulando assim a flexibilidade cognitiva. Isto, do ponto de vista do desenvolvimento humano, é um aspecto extremamente relevante nestes tempos de aprendizagem mediada por tecnologia.
O conceito de trilhas e soluções customizadas para proporcionar uma experiência cada vez mais personalizada de aprendizagem e desenvolvimento, tem sido demandada pelas organizações, que investem na capacitação de seus gestores e colaboradores, por terem a certeza do retorno sobre o investimento.
Pesquisas futuras sobre flexibilidade cognitiva podem estabelecer a alfabetização digital como uma condição essencial para aumentar a eficiência do aprendizado dos alunos na era digital e fornecerem ferramentas adicionais para os educadores avaliarem a relação entre a fluência do letramento digital e a flexibilidade cognitiva, à medida que o mundo corporativo e a educação continuam a evoluir na busca de integrar as tecnologias digitais aos seu dia a dia.