Não, este texto não foi escrito pelo ChatGPT. Embora o modelo de linguagem baseado em Deep Learning da OpenAI seja capaz de construir textos com lógica, concisão e clareza, ainda não consegue predizer o que penso. Mas é possível estar no controle do processo e ter a Inteligência Artificial Generativa como fiel escudeira. Entender em profundidade o contexto de solicitações e responder com bom/ótimo nível de precisão é justamente uma das muitas vantagens que os modelos de linguagem natural (Large Language Model, LLM) representam para os usuários. Como disse recentemente o CEO da Microsoft, Satya Nadella, estamos deixando para trás a era em que a IA operava apenas no piloto automático, nos bastidores dos algoritmos, e ingressando no momento em que ela se torna copiloto, fazendo a jornada do comandante (que é você) mais produtiva e eficiente.
Revoluções como essas, contudo, não acontecem subitamente. Estamos vivendo um daqueles momentos da história em que a tecnologia muda radicalmente a forma como vivemos, trabalhamos e nos relacionamos, mas nem sempre esse alcance é perceptível de imediato. Muitas inovações começam como brinquedos caros e nada práticos, e poucas se tornam cruciais para o progresso da sociedade. Só que a história ensina que não devemos subestimar o potencial de uma tecnologia emergente. Várias coisas importantes dos últimos 100 anos começaram como brinquedos inúteis e foram aprimoradas ao longo do tempo, tornando-se essenciais para o nosso dia a dia.
É o caso da evolução dos LLMs. No início, esses modelos eram considerados pouco práticos e ineficientes, mas com tempo e aperfeiçoamentos se tornaram uma ferramenta poderosa para a geração de textos e respostas automáticas. A tecnologia por trás do ChatGPT é um exemplo de como a evolução tecnológica pode ocorrer em etapas, com melhorias incrementais em cada fase. Quando essas mudanças acontecem em volume suficiente, abre-se um universo de possibilidades, com aplicações que, paradoxalmente, podem ser muito simples e corriqueiras.
São recursos que se apresentam para as pessoas no geral, mas também, e muito especialmente, para as empresas, que devem estimular seus colaboradores e fazer uso dessas aplicações. Desde sempre, temos clareza de que a automação de tarefas simples rotineiras libera tempo para que as pessoas se concentrem nas mais complexas e estratégicas, aumentando assim a produtividade geral da organização. E esse é só o começo da história. Chega a ser impressionante a quantidade, a variedade e a sofisticação de aplicações em que a IA pode auxiliar nas mais diversas profissões e nas mais diversas funções.
Mil e uma utilidades
As ferramentas LLM são, de fato, um copiloto virtual nunca antes visto. No iFood, todos os 5.100 colaboradores usam um wrapper (função destinada a chamar uma ou mais funções, às vezes diretamente por conveniência, e às vezes adaptá-las para fazer uma tarefa ligeiramente diferente no processo) de Inteligência Artificial Generativa chamado PlusOne, funcionando como um copiloto no dia a dia. Entre os programadores, por exemplo, corrige erros e bugs em códigos, sendo capaz também de criar variáveis novas, descobrir novas funções e fazer a tradução de uma linguagem para outra, entre outras utilidades. Nessa área de trabalho, vale lembrar que desde o fim de março está operando o GitHub Copilot, projetado com o ChatGPT para sugerir automaticamente trechos de código enquanto o desenvolvedor digita. Tudo com base no contexto e nos padrões de programação encontrados em milhões de repositórios hospedados na plataforma.
Assim como o ChatGPT, o PlusOne é bastante útil também para fazer trabalhos inteligentes em textos. No jurídico do iFood, o wrapper está sendo testado para simplificar a linguagem dos documentos sensíveis, como termos e condições de uso, facilitando a comunicação com os colaboradores e parceiros externos. Uso similar acontece nas avaliações de desempenho, ajudando lideranças a estruturar melhor, com mais qualidade e precisão, os feedbacks para a equipe, visando planos de desenvolvimento individuais mais sólidos.
Na internet, multiplicam-se tutoriais e dicas de como fazer da IA baseada em modelos LLM o melhor dos assistentes. Síntese de feedbacks, extração de insights, sugestões de nomes de produtos, simulação de perguntas feitas pelos clientes… é difícil achar o limite em gerenciamento de projetos. No marketing, programas como o ChatGPT podem gerar listas com clientes em potencial, criar descrições detalhadas de produtos, gerar conteúdo para mídias sociais… (só não podemos esquecer, é bom lembrar, que nenhuma automação dispensa o comandante de verificar as informações desses resultados.)
Nas ferramentas de produtividade em geral, destacam-se as formas de integrar os modelos de linguagem natural e similares a processadores de texto e programas de planilha e apresentação – já existem inclusive extensões para fazer a ponte entre os aplicativos do Google Workspace com a API do ChatGPT. A Microsoft, investidora multibilionária da OpenAI, obviamente apresentou suas armas e anunciou para breve o Office Copilot. O recurso para o Office 365 terá a capacidade, por exemplo, de criar automaticamente uma proposta comercial usando anotações no Word, formatando-as no Excel de acordo com os dados do usuário armazenados no Microsoft Graph e convertendo-as, por fim, numa apresentação do PowerPoint.
De forma geral, o uso de copilotos exige uma habilidade que parece simples, mas para a qual não fomos treinados: o uso de prompts, uma caixa de diálogo com uma mensagem solicitando ao usuário a entrada de algum texto. Bons prompts são a chave para criar respostas de alta qualidade e precisas. Como a maior parte do trabalho é feita por um modelo de LLM, o elemento humano entra por meio de prompts.
Fala, ChatGPT
É uma vastidão de usos que – agora sim – recorro ao ChatGPT, que lista: “pesquisa de mercado, assistente de pesquisas, revisão de textos, otimização de SEO, gerador de ideias, planejador de tarefas, suporte de atendimento ao cliente, consultoria em negócios, auxiliar em treinamento e desenvolvimento…” Tarefas mais complexas, claro, também estão contempladas, como a criação de um chatbot para um produto ou serviço, a análise de grandes quantidades de dados e testes de cibersegurança, entre outros. Na vida pessoal, não faltam outros territórios a explorar: “aprendizagem de idiomas, planejamento de viagens, acompanhamento de saúde, alimentação, prática de exercícios físicos, entretenimento, suporte a estudo” e tantas quantas a criatividade do usuário puder alcançar.
E, à medida que a ferramenta for aprimorada, outros usos para modelos de linguagem natural vão surgir. Quem pode, a esta altura, imaginar o que é possível? Talvez o próprio ChatGPT: “Espera-se que possa desenvolver habilidades de raciocínio abstrato, compreensão emocional, aprendizado contínuo e tomada de decisões complexas.” E, num enredo que atinge as raias da ficção científica, prevê a possibilidade de IA generativa ser integrada com tecnologias de interação física, como robôs e dispositivos nternet das Coisas (IoT), permitindo interações tangíveis e práticas. Será, enfim, um copiloto cada vez mais presente em nossas jornadas, pessoais ou profissionais. Pronto para mudar a maneira como vivemos, mais uma vez.
Este artigo foi produzido por Diego Barreto, VP de Finanças e Estratégia do iFood e colunista da MIT Technology Review Brasil.