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Turbinas eólicas são essenciais para enfrentar as mudanças climáticas, mas quando chegam ao final de sua vida útil, as pás das turbinas podem se tornar uma quantidade grande de lixo. Agora uma nova pesquisa, publicada na Nature, pode representar um primeiro passo em direção à construção de infraestruturas de energia renovável que não acabam em um aterro sanitário.
Pás de turbinas eólicas precisam ser resistentes para ser úteis. Esses burros de carga da energia renovável duram décadas, frequentemente girando até 30 vezes por minuto.
Mas quando chega a hora de desativá-las, a força das turbinas eólicas pode se tornar uma fraqueza. As pás são projetadas para ser tão duráveis, que os materiais utilizados para construí-las não podem, atualmente, ser reciclados. E cerca de 43 milhões de toneladas dessas pás serão desativadas até 2050.
Esse novo trabalho descreve um meio de recuperar os principais componentes das pás de turbina eólica, desmanchando o plástico que os mantém juntos sem destruir os elementos constitutivos primários do material.
“Precisamos de energia sustentável, mas também temos que considerar o lixo e temos que encontrar soluções para isso”, diz Alexander Ahrens, pesquisador de pós-doutorado na Universidade de Aarhus, na Dinamarca, e principal autor do novo estudo.
Pás de turbina eólica são feitas com um plástico resistente chamado resina epóxi. Em razão das ligações químicas que se formam quando a resina epóxi se solidifica, ela não pode ser derretida e moldada em um novo formato para ser reutilizada, como o plástico das garrafas de água ou de leite. Nesse caso, fibras também são misturadas à resina para maior resistência. Esse tipo de material reforçado – chamado fibra de vidro quando as fibras de suporte são feitas com vidro – é frequentemente utilizado para aplicações de alta intensidade, como barcos e asas de aviões.
“Porque esses materiais são tão duráveis, realmente não existe no momento uma tecnologia adequada para a sua reciclagem”, diz Ahrens.
Existem alguns métodos para desmanchar fibra de vidro, mas essas abordagens geralmente inutilizam a parte do epóxi e frequentemente danificam também as próprias fibras. Os pesquisadores na Aarhus se propuseram a desenvolver um método suficientemente delicado para permitir que os principais componentes sejam usados novamente.
A abordagem resultante se volta para as ligações químicas que seguram o plástico no lugar e “as mastiga como se fosse o Pac-Man – mastiga apenas o epóxi e libera as fibras de vidro”, diz Troels Skrydstrup, professor de química na Aarhus e outro dos autores do novo estudo.
Para desmanchar os materiais do epóxi, pesquisadores os mergulharam em uma mistura de solventes e adicionaram um catalisador, que ajudou a acelerar a reação química. Eles aqueceram tudo a 160°C por períodos que variaram entre 16 horas e vários dias, até que o material tivesse sido completamente desmanchado.
Após alguns testes iniciais, os pesquisadores utilizaram seu método para mastigar um pedaço de pá de turbina medindo uma polegada quadrada. Após seis dias, obtiveram como resultado fibras de vidro praticamente intactas (e a folha de metal interna que dá suporte a maioria das pás de turbina) e tubos com ingredientes que poderiam ser reutilizados em novos materiais.
Essa é a primeira vez que pesquisadores foram capazes de desmanchar o epóxi reforçado para recuperar tanto os elementos constitutivos do plástico como as fibras de vidro internas sem danificar nenhum deles, diz Skrydstrup.
Embora esse processo tenha sido capaz de mastigar os materiais em um laboratório, pode ser difícil replicá-lo em uma escala grande o suficiente para desmanchar os milhões de toneladas de turbinas eólicas que serão desativadas nas próximas décadas. “Acho que o importante é que isso traz a prova de conceito que pode inspirar outras pessoas a começar a olhar nessa direção”, diz Skrydstrup.
Pesquisas de prova de conceito são a chave para a reciclagem química e essa abordagem e “muito animadora”, especialmente porque os pesquisadores já demonstraram que funciona em lixo real, diz Julie Rorrer, professora da Universidade de Washington que estuda reciclagem química.
O próximo passo, diz Rorrer, seria descobrir como isso poderia funcionar em escala industrial, ou determinar quais ajustes precisam ser feitos para que o processo possa ser suficientemente rápido e eficiente para ser economicamente viável.
Um dos possíveis obstáculos à operação comercial é que o catalisador utilizado no método de reciclagem dos pesquisadores depende de um metal caro chamado rutênio. Os pesquisadores usaram muito desse metal e, embora ele não seja consumido pela reação, seria difícil recuperá-lo para usar novamente.
Pode haver outros métodos mais adequados à reciclagem de pás de turbina na indústria. O laboratório de Skrydstrup desenvolveu um outro processo que também desmancha as pás de turbina, mencionado em uma coletiva de imprensa realizada no início deste ano pela produtora de turbinas Vestas.
Skrydstrup diz que essa abordagem é um processo de duas partes que pode ser mais viável em escala comercial, embora os pesquisadores não tenham dado maiores detalhes, visto que estão trabalhando para apresentar os resultados a revistas científicas.
Esses são apenas dois dos muitos métodos sendo desenvolvidos em reciclagem avançada. Houve um boom de pesquisas sobre formas de limpar todos os tipos de materiais, desde plásticos de uso único a turbinas eólicas, diz Rorrer, e por um bom motivo: “Há coisas valiosas no lixo”.