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Há pelo menos duas décadas discute-se a importância do uso estratégico de dados para a personalização de campanhas e a expansão das atividades relacionadas ao marketing digital. No entanto, com o avanço das tecnologias de inteligência de dados, incluindo técnicas de automação avançada e análise preditiva, a necessidade de incorporar informações mais contextualizadas como elemento chave para a tomada de decisão em diferentes esferas ampliou.
Como explica Pablo Pilon, diretor de vendas na Adobe, do ponto de vista tecnológico, entender o perfil e comportamento dos consumidores em canais digitais é algo relativamente acessível. Afinal, existe uma vasta gama de canais nos quais as organizações podem operar e atender seus clientes, incluindo sites, aplicativos, quiosques de autosserviço, mídias pagas, entre outros. Porém, um dos principais desafios que as marcas enfrentam é conseguir consolidar esses diferentes perfis de maneira holística e integral.
A própria forma de oferecer o grau de personalização esperado pelos consumidores está em evolução. A publicidade digital, por exemplo, chega em uma nova era com a adesão da abordagem “cookieless”. Basicamente, a ideia por trás do movimento é investir na privacidade dos usuários, criando alternativas para reduzir a dependência de cookies e garantir que a análise de dados seja feita mesmo sem a utilização desses mecanismos tradicionais de rastreamento.
Em vez disso, as empresas têm mudado o foco para o chamado “first-party data”, que consiste na prática de buscar com os próprios clientes as informações necessárias. Em um contexto em que a preocupação com a privacidade e regulamentações de proteção de dados cresce, o first-party data é visto como uma opção mais segura e ética.
Ainda em relação aos desafios, a integração do mundo digital com o físico continua sendo uma barreira. “Não podemos esquecer que o cliente que está nos canais digitais invariavelmente é o mesmo que está nos canais físicos. Assim sendo, não podemos menosprezar a complexidade de ter uma visão integral dos perfis e comportamentos dos canais digitais (que é um desafio por si só) integralmente conectada aos perfis e comportamentos dos canais físicos”, destacou Pilon.
Dados e experiência
O executivo explicou que estamos vivendo um momento de “hiper conveniência” para os consumidores. Ou seja, o foco das marcas está orientado para garantir a melhor experiência do cliente, a fim de manter a fidelidade e o bom relacionamento com ele.
“Hoje em dia, é fácil notar que as empresas que lideram em seus campos de atuação estão muito preocupadas em oferecer essa experiência de maneira fluída, omnicanal, respeitando os interesses e momentos de cada consumidor. Como consequência, as empresas que conseguem atuar dessa maneira acabam abrindo uma vantagem competitiva em relação aos seus competidores.”
Na Adobe, essa estratégia foi batizada como “Experience-Led Growth” (crescimento levado pelas experiências, na tradução literal). O uso de dados é fundamental nesse processo para que as organizações possam ter um entendimento integral do contexto de cada cliente, entendendo seus diferentes momentos (compra, retenção, consideração de novos serviços, término/cancelamento de aquisição e outros).
“As empresas devem reagir da maneira mais conveniente possível — ainda que seja um momento de fuga/cancelamento. Considerando o jogo de longo prazo, essas experiências fluídas, sem fricção, ganham a confiança dos consumidores, fazendo com que as empresas sejam lembradas (ou reconsideradas) num momento futuro”, pontuou Pilon.
A Yduqs, holding de capital aberto com foco no ensino superior, acredita que a combinação entre dados e experiência é fundamental para provocar e incentivar diferentes pontos de vista. Eduardo Guedes, diretor de Marketing da companhia, explica que ao desconsiderar os dados, as organizações passam a ter como base conhecimentos históricos dos executivos sobre os comportamentos tradicionais dos consumidores e das dinâmicas de canais de mídia e de vendas. No entanto, isso não traduz com eficiência a realidade do mercado. Tampouco considera as transformações no comportamento do consumidor.
“As jornadas de compra e de interações com as marcas eram mais simples e diretas. Agora, tudo se mistura e, se o executivo não buscar entender as mudanças do comportamento do consumidor por intermédio dos dados, corre o risco de ele buscar “conforto” nas práticas antigas e questionar os números quando esses mostram como as coisas mudaram e que suas visões estão ultrapassadas. Isso leva diretamente a estratégias e decisões de alocação de verbas de marketing que não estão em sintonia com as novas jornadas do consumidor, gastando com ineficiência”, destacou.
O papel do martech na jornada de aquisição dos clientes
Um estudo da NTT Data aponta que até 2027 o percentual de investimentos em marketing digital nas empresas latino-americanas deve aumentar para 85%. E cada vez mais a inteligência de dados estará atrelada a essa comunicação.
Em muitos setores, mas especialmente o de educação, os canais digitais representam o principal ponto de contato com os consumidores, especialmente nas fases iniciais das jornadas de aquisição. Diante disso, é fundamental garantir um processo fluido e personalizado dentro desses canais. A junção entre o marketing e a tecnologia, o famoso martech, possibilita o cruzamento de uma série de dados relevantes para que as instituições possam melhorar sua comunicação sobre oferta ou até mesmo em relação ao produto que oferecem.
Na Yduqs, Marcelo Ferreira, Head of Martech and Growth Marketing, comenta que os principais desafios em relação a implementação do martech são mais relacionados às questões culturais que técnicas. Uma primeira barreira, por exemplo, é garantir a integração completa entre os profissionais de dados e os de marketing.
Saber onde a área de inteligência de dados deve estar no organograma das empresas é um tópico que gera muitas discussões. O caminho natural é atrelar o setor à área de negócios e tecnologia. Mas, na prática, quando a inteligência de dados não é incorporada ao marketing, corre-se o risco de perder insights valiosos sobre o mercado e os clientes.
“Tomando como exemplo o mercado de educação superior, é muito importante para o marketing entender mais profundamente como são as jornadas dos candidatos e futuros alunos. Como organizar campanhas de acordo com esses momentos da jornada é uma necessidade diária do marketing e que a área de inteligência de dados pode contribuir muito, por meio do entendimento das diferenças dessas jornadas entre segmentações geográficas, demográficas, baseadas em diferentes objetivos ou necessidades.”
Outro desafio é a adoção de políticas de governança e de segurança da informação para evitar silos de estruturas de dados, práticas desalinhadas de arquitetura e pipeline de dados, além de padronizações de integrações com outras origens. Por fim, a área de inteligência de dados precisa estar atualizada com as mais recentes tendências e boas práticas de mercado, além de ter acesso às novas tecnologias e aos cases que tragam novos conhecimentos.
“O perigo é justamente os profissionais mergulharem na operação do dia a dia do marketing e não alocarem agenda para olhar para fora e terem trocas com outros profissionais (internos e externos) e com empresas de tecnologia. Isso é fundamental e, caso caia nessa armadilha, a área de inteligência de dados passará, em pouco tempo, a se tornar uma mera fornecedora de reports e dashboards”, alertou Ferreira.
Inteligência de dados e ganho em eficiência
Em 2023, a Yduqs, que tem como foco o ensino superior, investiu fortemente em estratégias para otimizar os recursos de marketing e aumentar a conversão por meio do uso de dados analíticos, mais especificamente na jornada de captação.
A holding iniciou o trabalho de estruturar o que nomeou como base “Ponta a Ponta”, um hub de dados primários que integra toda a jornada de captação, desde as primeiras interações dos futuros estudantes com as ações de mídia, passando pelas visitas aos canais digitais da empresa até a realização das inscrições e conclusão das matrículas.
“Com esse hub, atingimos um marco que mudou a nossa forma de gerir as campanhas de mídia, que foi a conexão direta entre os dados online com os do nosso CRM. Passamos a saber quais eram as campanhas de mídia e canais mais eficientes em termos de captação de novos alunos, em um nível de detalhamento nunca alcançado antes.”
Os executivos, Guedes e Ferreira, ainda destacaram a implementação de um processo automatizado de retroalimentação, cujo objetivo é enriquecer os algoritmos de machine learning focados na otimização de campanhas. Isso proporcionou não só um melhor entendimento das campanhas de conversão, como ajudou a Yduqs a ser reconhecida como referência em eficiência no mercado de educação superior em 2023.
O CaC (custo financeiro de aquisição de cada aluno) caiu 17% e a empresa alcançou a menor taxa de investimento de publicidade & propaganda sobre a ROL (receita operacional líquida).
Outra estratégia que vem sendo utilizada é deixar em segundo plano o tradicional modelo de atribuição “last click”, que dá total peso de contribuição das conversões aos últimos canais de interação na jornada do candidato, para implantar o modelo de atribuição MMM (Marketing Mix Modeling). Assim, por meio de modelagens estatísticas, é possível entender melhor como cada ponto de marketing (mídias online e offline de branding e mídias online de performance, CRM, redes sociais, influenciadores digitais, elasticidade de preço, forças de vendas locais, afiliados, inbound content strategy) contribui, isoladamente e em combinações, para as jornadas de captação.
Dessa forma, a empresa tem condições de recalibrar o mix de investimentos dessas ações a partir de uma visão mais clara e direta, tornando as decisões mais inteligentes e viabilizando a execução das estratégias de rentabilidade e volume.
Para o futuro, a Yduqs prevê investimentos em três frentes: evolução no enriquecimento dos dados primários, novas aplicações práticas dos insights sobre as análises nas ações de marketing e adoção em massa de IA nas operações de captação. “Essas frentes já foram iniciadas durante o decorrer do ano e agora vamos expandi-las e solidificar a integração entre a inteligência de dados e o marketing.”
Um dos objetivos é garantir o fortalecimento dos dados primários, de modo que toda a empresa consiga consolidar uma visão única de cada aluno entre todos os departamentos, independentemente dos canais de interação e experiências vivenciadas.
Mas algumas barreiras ainda precisam ser superadas para o atingimento dessa meta. Por exemplo, a integração dos dados primários concentrados nos canais digitais com outros, como call center, unidades físicas, entre outros. Além disso, com o avanço do movimento cookieless, existe a necessidade de recorrer aos caminhos mais adequados às diretrizes da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e criar parcerias com os chamados Data Clean Rooms, como os da Amazon, Google, Meta e outros. “Uma possibilidade futura a ser mais discutida internamente é sobre a oportunidade de criar nossa própria DCR para oferecer ao mercado como troca de dados e monetização.”
Em uma segunda fase, a Yduqs tem a ambição de implantar sua própria CDP (Customer Data Platform) com o intuito de consolidar o hub de dados de alunos como fonte única para toda a empresa e incorporar na rotina dos times de mídia e canais a prática das segmentações e ativações de audiências preditivas nas ações de mídia e de CRM.
Por fim, a empresa prevê uma expansão de uso de AI em diversos casos práticos, seja nas análises preditivas, nas automações das operações de marketing: criações de peças de mídia, dos sites, e-mails e das redes sociais; otimizações das campanhas e na realização de testes multivariáveis para melhorias dos funis de conversão.
Tendências e desafios futuros
Segundo Pablo Pilon, o principal caminho para aprimorar a jornada de aquisição é entender essa atividade como parte de um ciclo de vida maior.
“Nenhuma marca deveria focar única e exclusivamente em conversão/aquisição. Temos que entender a jornada completa dos consumidores (aquisição, uso, retenção, renovação e cancelamento) e propiciar experiências incríveis em todos os pontos de contato. Com isso, naturalmente, as jornadas de aquisição serão impactadas e o clientes automaticamente se tornarão fiéis”, defendeu.
Uma tendência que deve se fortalecer é justamente a utilização de machine learning e Inteligência Artificial para ajudar a entender o perfil ideal de consumidor, de modo a identificar taxas melhores de conversão ou clientes que possam elevar o LTV (Life Time Value ou valor do tempo de vida, em tradução literal).
Já em relação aos desafios, Pilon ressalta a falta de visão estratégica sobre onde as empresas almejam estar nos próximos cinco ou dez anos. “Estabelecer e comunicar muito claramente qual é essa visão e quais são os passos que estão sendo dados rumo a esse ponto comum é fundamental para evitar pequenos atritos que são muito comuns no dia a dia das empresas.”