Ciclo OODA: como os pilotos de caça tomam decisões rápidas e precisas
Humanos e tecnologia

Ciclo OODA: como os pilotos de caça tomam decisões rápidas e precisas

Observar, orientar, decidir e agir, as lições de John Boyd para a guerra, os negócios e a vida pessoal.

Em meu artigo “O decisor e a memória externa: a nova equação da vantagem competitiva: Racionalidade Estendida” falo sobre “Racionalidade Limitada e Memória” e cito Herbert Simon (1979) quando explico que “circunstâncias complexas, tempo limitado e um poder computacional mental inadequado reduzem os tomadores de decisão a um estado de ‘racionalidade limitada’”.

A teoria de Simon sugere que a pessoa que tem o poder de decidir, quando exposta à uma situação complexa, por vezes para além da sua compreensão, utiliza as capacidades de processamento e análise de informação para procurar alternativas, calcular consequências, resolver incertezas e, de vez em quando, encontrar soluções que serão suficientes para a decisão de momento.

O autor alerta que é impossível que o indivíduo conheça todas as alternativas de que dispõe ou todas as consequências. Ele pode percorrer apenas um caminho e nunca saberá se aquele que escolheu é o melhor, embora sob certas condições possa ter um palpite razoável.

Quanto às limitações de conhecimento, propõe que não é possível o tomador de decisão ter acesso a todas as possibilidades de ação, medindo todas as opções, tendo em vista a impossibilidade material de obter todas as informações, considerando problemas de tempo e custo.

O responsável, então, contenta-se em adquirir um número limitado de informações, o chamado “nível satisfatório”, que possibilita a identificação dos problemas e algumas soluções alternativas. “O que o indivíduo faz, na realidade, é formar uma série de expectativas das consequências futuras, que se baseiam em relações empíricas já conhecidas e sobre informações acerca da situação existente”, argumenta Herbert Simon.

Ciclo de Decisão ou Ciclo OODA

Tendo em conta estas limitações, adota-se, como primeira contribuição para a sua resolução, o conceito de Ciclo de Decisão ou Ciclo OODA – Observação, Orientação, Decisão e Ação, desenvolvido pelo coronel John Boyd, piloto da Força Aérea dos Estados Unidos. Enquanto atuava na Guerra da Coreia, Boyd observou algo incomum no combate aéreo.

Os Estados Unidos utilizavam aviões F-86 Sabres, contra os MIG-15 fabricados na União Soviética, que eram superiores ao modelo do rival. Eram mais rápidos, maiores e mais potentes. Contudo, mesmo com todas essas vantagens, os pilotos dos F-86 alcançaram uma taxa de abate de 10:1 contra os MIG-15, algo que despertou a curiosidade de Boyd.

Com esta interrogação em mente, o coronel analisou as táticas utilizadas em combate por ambas as partes e concluiu que a grande vantagem dos F-86 estava na maior visibilidade que o piloto possuía, tendo assim uma maior “consciência situacional”, aliada à capacidade de manobra da aeronave que era menos cansativa. Essa análise inicial levou Boyd a uma série de estudos sobre táticas de combate, estratégia de guerra e até o desenvolvimento de novos modelos de caças, acabando por desenvolver aquilo que chamamos de OODA Loop.

O OODA Loop é um processo de quatro etapas para tomar decisões eficazes em situações de alto risco. Essa técnica consiste em recolher informações relevantes, reconhecer possíveis preconceitos, decidir e agir e, em seguida, repetir o processo com novas informações obtidas do mesmo processo – daí ser considerado um “loop”, ou seja, um ciclo.

Aqui é importante realçar a parte do “loop”. O processo deve ser repetido várias vezes até que o “conflito” termine. Cada repetição fornece mais informações para a próxima etapa, tornando-a um ciclo de feedback.

As 4 etapas do OODA Loop

1) Observar

O primeiro passo é observar a situação com o objetivo de construir o quadro mais preciso e abrangente possível. Essa etapa requer a conversão de informações numa imagem geral com um significado abrangente que as coloque no contexto. Uma capacidade particularmente vital é a de identificar quais informações são apenas ruído e irrelevantes para a decisão atual e em quais informações devemos prestar atenção.

Para se tomar boas decisões é preciso dominar a arte de observar o ambiente, e tal como acontecia com os F-86 em relação aos MIG-15, em que os primeiros tinham um campo de visão mais abrangente, quanto maior for o nosso campo de visão sobre o “ambiente” que nos rodeia melhor, pois iremos capturar mais informações.

Um exemplo muito concreto é o processo de triagem quando chegamos em um hospital. A prioridade dos médicos, ou enfermeiros, é descobrir quais as informações que precisa de recolher, depois recolhê-las.

Eles começam a fazer perguntas ao paciente, depois verificam os registros, os sinais vitais, como pressão arterial, e solicitam testes diagnósticos específicos.

Os médicos aprendem a captar pistas sutis que podem revelar condições específicas, como os padrões de fala do paciente, a linguagem corporal, o que o levou para o hospital e até mesmo o cheiro. Em alguns casos, a ausência (ao invés da presença) de certas pistas também é importante. Ao mesmo tempo, o médico precisa descartar informações irrelevantes e, em seguida, juntar todas as peças antes de poder tratar o paciente.

Depois de todas as informações possíveis recolhidas, passamos à etapa seguinte.

2) Orientar

A segunda etapa é orientar. Boyd referiu-se a esta etapa como schwerpunkt, que significa “a ênfase principal” em alemão. Orientar-se é reconhecer quaisquer barreiras que possam interferir nas outras partes do Ciclo OODA.

“Orientação” significa conectar-se com a realidade e ver o mundo como ele realmente é; o mais livre possível da influência de vieses cognitivos.

Boyd afirma que se orientar adequadamente pode ser suficiente para superar uma desvantagem inicial — como menos recursos ou menos informações — para ser mais esperto que um oponente. O piloto identificou as principais barreiras que impedem a nossa visão de obter informações objetivas:

As nossas tradições culturais — não percebemos quanto do que consideramos comportamento universal é realmente prescrito culturalmente.

A nossa herança genética — todos nós temos certas restrições.

A nossa capacidade de analisar e sintetizar — se não praticamos e desenvolvemos as nossas capacidades de pensamento, tendemos a voltar aos velhos hábitos.

O influxo de novas informações — é difícil dar sentido às observações quando a situação está sempre a mudar.

3) Decidir

As etapas anteriores nos dão uma base para tomarmos decisões informadas. É possível obter aquilo que chamamos de “informação acionável”, ou seja, informações na quais podemos tomar decisões.

É preciso ter consciência que não podemos tomar as mesmas decisões repetidamente.

Esta parte do loop deverá ser flexível e aberta à atualização bayesiana.

A implicação é que devemos testar as decisões que tomamos neste ponto do loop, identificando as falhas e incluindo quaisquer problemas em estágios futuros de observação.

4) Agir

Decidir não implica necessariamente o agir. Devemos ser intencionais em nossas decisões e colocá-las em prática. Em suma, agir. Só quando agimos é que colocamos em prática as nossas decisões.

Depois esperamos que os resultados nos indiquem se a decisão foi boa ou não, fornecendo assim informações vitais para voltarmos à primeira parte do Ciclo e começar novamente, agora mais bem informados que da primeira vez.

O OODA Loop no cotidiano

“Não podemos apenas olhar para as nossas próprias experiências pessoais ou usar as mesmas receitas mentais indefinidamente; temos que olhar para outras disciplinas e atividades e relacioná-las ou conectá-las ao que sabemos das nossas experiências e do mundo estratégico em que vivemos”, afirmou John Boyd.

Se começar a aplicar o OODA Loop nas suas decisões diárias, irá notar em certas coisas que até agora passavam despercebidas. E antes de aderir à sua primeira conclusão, fará uma pausa para considerar os seus preconceitos, obter informações adicionais e ser mais cuidadoso com as consequências.

E como tudo na vida, quanto mais praticar, melhor se tornará neste jogo da vida que é tomar decisões. Continuará fazendo isso, mas agora com todo o seu potencial.


Este artigo foi produzido por Rui Silva, Fundador da 2BePro e do clube executivo Central Brain Trust, e colunista da MIT Technology Review Portugal.

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