Chegou a era dos agentes nos canais digitais
Inteligência artificial

Chegou a era dos agentes nos canais digitais

Agentes de IA passam a executar jornadas digitais. Canais preparados para integrá‑los com governança de dados e arquitetura segura preservam a relação com o cliente e geram vantagem competitiva.

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O que mudou na interface

Durante anos, a jornada digital foi linear. O usuário abria um aplicativo, pesquisava, comparava, preenchia dados e concluía a compra. Essa sequência permanece relevante, mas já não é a única porta de entrada. Agentes de Inteligência Artificial começam a operar a navegação, interpretar telas, acionar serviços e concluir transações. O diálogo deixou de ser resposta e tornou‑se execução com contexto.

Três movimentos recentes aceleram essa mudança. Experiências de conteúdo gerado por modelos em aplicativos de vídeo ganham escala e constroem audiências fiéis. Recursos de personalização aprendem preferências e antecipam sugestões úteis. E transações acontecem dentro do ambiente conversacional, com especificações abertas para catálogo, autorização e pagamento. Quando conteúdo, personalização e compra se encontram no mesmo fluxo, o agente deixa de ser recurso adicional e passa a ser canal principal.

A ambição é formar um ecossistema de aplicativos que vivem no assistente e se conectam a dados e serviços por meio de padrões. Na prática, o assistente torna‑se uma camada de interface universal, com catálogo, diretrizes de integração e governança de experiência.

O que muda para os canais corporativos

Se o agente decide a ação e executa os passos, os canais deixam de dialogar apenas com pessoas. Passam a conversar com softwares que enxergam elementos de página, identificam campos, interpretam rótulos, acionam APIs e pedem consentimentos. O risco é perder o que mais vale, que é o contexto do cliente e a telemetria da jornada. O benefício, quando bem desenhado, é expandir alcance e conversão sem terceirizar o núcleo do relacionamento.

A questão estratégica não é estar ou não nesses ambientes, e sim como estar. Duas decisões balizam a resposta. Quais operações críticas merecem exposição a agentes externos de forma segura, auditável e com limites explícitos. E em quais condições essas operações acontecem, com controles de risco e evidências de conformidade para clientes e reguladores.

Conseguir essa presença qualificada depende de escolhas de arquitetura, produto e governança. O objetivo é simples de dizer, mas exigente para quem o execute. Levar o agente até os dados, e não os dados até o agente.

Princípios de arquitetura para serem operados por agentes, sem abrir mão dos dados

O ponto de entrada é um gateway para agentes. Ele identifica o cliente de software, limita escopos ao mínimo necessário, aplica consentimento granular e exige reforço de verificação quando o risco sobe. Em cenários de alto valor, é prudente adotar perfis de segurança consolidados no ecossistema OAuth e OpenID, com autenticação fora de banda e vínculos fortes entre quem pede e o token que executa a ação. Esse conjunto reduz brechas de sequestro de sessão e desencoraja práticas frágeis de automação visual que podem gerar fraudes e violações de segurança.

Em seguida vem a política de dados. O agente não recebe um conjunto de dados para trabalhar de forma isolada. Ele solicita uma finalidade específica. O ambiente de aplicação avalia base legal, aplica limites, registra o evento e computa no local. Ambientes de execução confiável criam enclaves de hardware para proteger dados em uso. Estamos falando de “data clean room”, que permite atuação integrada a parceiros sem exposição bruta de informações. A telemetria precisa registrar quem solicitou, quais parâmetros foram usados e qual resultado foi entregue. Com isso surge um novo desafio sobre a identificação/o tagueamento das jornadas. Novos padrões e especificações criam uma complexidade adicional.

Um terceiro pilar é o catálogo de ações. Em vez de expor toda a superfície do site para que o agente deduza fluxos, a organização publica operações claras com contratos estáveis e exemplos. Protocolos recentes para conectar modelos a sistemas ajudam a padronizar essa interação e reduzem acoplamento, o que acelera integração e simplifica governança.

O quarto pilar é a operação segura. Políticas como código (“Policy as Code”) definem quem pode fazer o quê, quando e com quais limites. Operações sensíveis pedem reforço de autenticação e validações contextuais. Detectores de anomalia pausam execuções quando o comportamento foge ao padrão esperado. Testes ofensivos contínuos precisam incluir cenários próprios de agentes, como instruções maliciosas em páginas e abuso de conectores.

Descoberta quando a resposta é gerada

Quando um motor generativo responde a consultas, no lugar de uma lista de links, ele muda sua forma de ser encontrado. O objetivo deixa de ser ocupar posição em páginas de resultados e passa a ser citado dentro da própria resposta. A literatura recente chama essa prática de “otimização para motores generativos” (GEO), e relata ganhos de visibilidade quando o conteúdo oferece respostas canônicas, citações claras e estatísticas verificáveis.

Há um lado técnico e um lado editorial. Pelo ponto de vista técnico, temos dados estruturados e contratos de API com semântica estável. No terreno editorial, espera-se clareza, parcimônia e números que sustentam as afirmações. Em vez de páginas feitas apenas para convencer leitores humanos, o material passa a ser útil para pessoas e para modelos, o que aumenta a chance de citação correta e execução de ações oficiais.

O comércio que acontece dentro do assistente

O ato de comprar está sendo incorporado à conversa. Um protocolo de comércio para agentes define como um assistente apresenta produtos, cria sessão de checkout, atualiza carrinho e finaliza pagamento. O desenho separa o que pertence ao assistente do que pertence ao vendedor. O pedido e o pagamento continuam a partir do vendedor. O assistente orquestra a experiência e transmite apenas os dados necessários com provas de autorização.

Para marcas e varejistas, a implicação é direta. O canal conversacional pode capturar descoberta, consideração e conversão. Investir em governança de dados e em um catálogo de ações bem definido aumenta a chance de o assistente escolher a integração oficial em vez de redirecionar o usuário para fora da conversa.

Agentes que usam o computador como gente

Há uma fronteira adicional no uso de agentes. Eles já operam navegadores, entendem a interface e completam tarefas em telas para as quais não haja API pública. Essa capacidade amplia casos de uso e exige controles finos contra instruções maliciosas, variações de interface e manipulação visual. Para organizações, é um argumento extra para expor operações por meio de contratos claros e auditáveis.

Em ambientes complexos, isolar sessões de automação, restringir permissões ao mínimo, registrar decisões e exigir confirmação reforçada quando há risco financeiro, legal ou reputacional reduz incidentes e simplifica auditoria. Lembrar que o fraudador sempre encontra brecha nos avanços tecnológicos é peremptório para implementação e adoção cautelosa e responsável.

Privacidade, transparência e confiança

A legislação brasileira de proteção de dados estabelece princípios de finalidade específica, minimização e registro de consentimento, além de direitos do titular como acesso, correção, portabilidade e revogação. Em soluções com agentes, esses princípios continuam a valer e ganham uma camada adicional. É preciso demonstrar que cada ação executada em nome do titular respeitou a finalidade declarada, que o consentimento foi registrado e que dados sensíveis não foram copiados além do necessário.

Esse rigor não é apenas obrigação legal. É o fundamento da confiança que sustenta a adoção. Haver transparência sobre o que é coletado, os porquês da coleta e como revogar o consentimento reduz incertezas e amplia a disposição do usuário em delegar tarefas ao assistente.

Caminhos práticos sem perder o essencial

Cada organização seguirá um roteiro próprio, mas alguns movimentos aceleram resultados. Mapear jornadas de alto volume com baixa tolerância a fricção ajuda a selecionar casos operáveis por agentes. Expor poucas ações bem definidas encurta integração e simplifica a medição. Tratar consentimento como parte do produto reduz dúvidas. Medir a jornada de ponta a ponta, do acionamento do agente ao desfecho, oferece clareza sobre o que funciona e onde haverá necessidade de ajuste.

O objetivo inicial não é automatizar tudo. É aprender com segurança, e sem abrir mão da relação com o cliente. A partir de casos comprovados, ampliam-se os escopos, documentam-se exceções e revisam-se os controles de risco.

Impactos sociais e setoriais

A adoção de agentes não se limita a eficiência operacional. Há implicações sobre inclusão, trabalho e acesso a serviços. Em mercados com baixa familiaridade digital, seu uso reduz barreiras ao simplificar etapas e orientar usuários em linguagem natural. Em ambientes com excesso de informações, agentes filtram, resumem e explicam, melhorando a tomada de decisão.

Setores com processos padronizados tendem a ter ganhos rápidos. Serviços, varejo, educação e saúde se beneficiam quando tarefas repetitivas ganham execução coordenada por agentes. Já em ambientes com decisões complexas e alto custo de erro, a delegação deve ser gradual e supervisionada, com registros completos e revisão humana em pontos críticos.

Agente é um atalho

Agentes representam uma nova camada de experiência e distribuição. Competirão por padrão, por integração e por confiança. No plano técnico, vence quem oferece ações claras, protege dados em uso e registra cada passo. No plano de negócio, vence quem transforma o agente em atalho para resolver a vida do cliente, mantendo governança sobre o que é essencial.

À medida que descoberta, recomendação e compra acontecem fora dos domínios tradicionais, estar pronto para ser operado por agentes com segurança deixa de ser opcional. Canais preparados preservam a relação com o cliente, reduzem atrito e criam vantagem competitiva.

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